Foi ontem divulgado pelo MEC o relatório sobre
Segurança na
Escolas no qual se constata a redução do número de episódios reportados. Alguns dados, em 2008/2009 registaram-se
3525 ocorrências, em 2011/2012 esse
número desceu para 2218 e para 1446 em 2012/2013. Os casos mais frequentes são os
actos contra a liberdade e a integridade física das pessoas, 1577 em 2008/2009
para 1074 em 2011/2012 e 726 em 2012/2013. 94% das escolas não participou
qualquer ocorrência em 2011/2012, percentagem que subiu para 95,5% em
2012/2013.
Apesar da redução dos casos de violência escolar registados, importa não esquecer que existem inúmeros casos não reportados, pelo que este tipo de fenómeno requer permanente
atenção até porque a concentração de alunos e o aumento do número de alunos por
turma potencia a emergência de situações desta natureza. Algumas notas repescadas
sobre esta matéria, suficientemente complexa para que sejam tantas as dúvidas
quantas as certezas, muitas.
Em primeiro lugar uma referência à função professor. A
imagem social dos professores tem estado sob pressão continuada e com riscos de
sofrer uma erosão significativa. As razões são variadas e dificilmente
compatíveis com este espaço mas creio que uma boa parte da política educativa
dirigida aos professores nos últimos anos, alguns dos discursos dos lideres
sindicais e as afirmações ignorantes e irresponsáveis de alguns "opinion
makers" têm dado um bom contributo. Este processo mina de forma muito
significativa a relação que pais e alunos têm com os professores, ou seja e
sendo deselegante, "uma classe de gente que não trabalha", "que
não se interessa pelos alunos", "que não quer ser avaliada",
etc., (basta ver muitos dos comentários on-line a notícias que envolvem
professores), não é, obviamente uma classe que mereça respeito pelo que se
instala de mansinho um clima de reacção, desconfiança e fraqueza que minam o
exercício da autoridade. Os pais e alunos que agridem e ofendem professores são
uma espécie de "braço armado" dessa imagem social induzida.
Por outro lado, a cultura profissional e institucional em
boa parte das nossas escolas e agrupamentos é ainda marcada por um excesso de
individualismo. Quero dizer com isto que, lamentavelmente, os professores
evidenciam níveis de cooperação e partilha profissional abaixo do que seria
desejável. As razões serão várias e não cabem aqui, mas creio que justificam,
muitas vezes, a não realização de queixas de incidentes, muitas vezes graves,
por receio de exposição e demonstração de fragilidades face a colegas e
responsáveis, o que uma cultura de maior cooperação atenuaria. Acresce ainda
que, por desatenção, incompetência ou negligência muitas direcções de escolas e
agrupamentos não vão muito longe na definição de dispositivos de apoio,
recorrendo a outros docentes mais experientes ou à presença de dois
professores, por exemplo, que dariam aos professores apoio e confiança para o
trabalho com os seus alunos.
Importa pois, muitas vezes o refiro caminhar no sentido do
reforço da imagem social dos professores como fonte imprescindível de
autoridade, saber e importância e, paralelamente, incentivar a construção nas
escolas de dispositivos leves e ágeis de apoio aos professores de forma a que
cada um não se sinta entregue a si próprio e com receio de
"enfrentar" os alunos e os pais, a pior das situações em que um
docente se pode sentir. Este caminho é da responsabilidade de todos,
ministério, sindicatos, direcções de escolas e agrupamentos, pais, professores
e alunos.
A segunda nota remete para a instituição escola. Em primeiro
lugar, a escola é, será sempre, um reflexo do contexto económico, social e
cultural, bem como do sistema de valores em que se integra. Neste quadro, em
tempos de violência, a escola espelha essa violência, em tempos de sentimento
de insegurança, a escola espelha essa insegurança, em tempos de sentimento de
impunidade, a escola espelha esse sentimento de impunidade. Por tudo isto não é
possível, como alguns discursos o fazem, responsabilizar exclusivamente a
escola, por estas situações. A escola fará certamente parte da solução mas não
é, não pode ser, A solução, esta passará por intervenções concertadas no âmbito
das comunidades.
Um segundo aspecto prende-se com o trabalho com as famílias.
Muitos casos de violência escolar estão associados, não estou a falar de uma
relação de causa-efeito, à acção negligente ou menos competente por parte das
famílias. Continuo fortemente convicto de que nas escolas devem ser criados
dispositivos, com recursos, humanos e de tempo por exemplo, para trabalho
sistemático e estruturado com as famílias. Com as metodologias mais frequentes,
reuniões de pais e convocatória para famílias problemáticas irem à escola, que
se revelam ineficazes, a maioria dos pais nem sequer aparece, creio que será
muito difícil alterar ou, pelo menos, minimizar os efeitos das variáveis
familiares nos comportamentos dos miúdos.
Uma outra questão ainda dentro da instituição escola,
prende-se com o facto conhecido de que os problemas mais significativos
sentidos nas
escolas, indisciplina, violência, delinquência, bullying, etc.
ocorrem, obviamente, nas salas de aula e, sobretudo nos espaços de recreio.
Deixando de lado, de momento, a sala de aula parece-me fundamental que se dê
atenção educativa aos tempos e espaços de recreio escolar.
Em muitas escolas a insuficiência de pessoal auxiliar não
permite a ajustada supervisão desses espaços. Por outro lado, a sua formação em
matérias como supervisão educativa e mediação de conflitos, por exemplo, e, ou,
o entendimento que têm das suas competências, muitas não valorizadas pela
própria comunidade, leva a alguma negligência ou receio de intervenção.
Talvez não seja muito popular mas digo de há muito que os
recreios escolares são dos mais importantes espaços educativos, aliás, muitas
das nossas memórias da escola, boas e más, passam pelos recreios. Neste
sentido, defendo que a supervisão dos intervalos deveria ser da
responsabilidade de docentes. A reestrutura da enorme carga burocrática do
trabalhos dos professores, dos modelos de organização e funcionamento das
escolas, por exemplo, poderiam libertar horas de docentes para esta supervisão que
me parece desejável.