Um dos efeitos mais
devastadores da crise que temos vindo a sofrer
foi o aumento exponencial de famílias endividadas. Assim sendo, parece
importante a iniciativa da Confederação
Nacional das Associações de Família e do Centro de Apoio ao Endividado de criar
uma rede de assistência, a nível nacional, de apoio a famílias endividadas para
que possam elaborar planos de reestruturação sustentados que minimizem o
risco de implosão que atingiu milhares de famílias.
Dados disponibilizados pela DECO
elucidam o aumento brutal do número de famílias endividades bem como o dos
casos de falência de singulares, as famílias. Estas situações devastadoras para
milhares de agregados familiares, decorrem também, fundamentalmente, de
desemprego, degradação das condições laborais e doença.
Ainda de acordo com a DECO, as
famílias em incumprimento ou risco dessa situação que recorrem à Associação
evidenciam, frequentemente, uma taxa de esforço cerca dos 90%, ou seja, ao
receber 1000 €, 900 estão destinados ao pagamento de créditos e em média têm
que gerir 8,6 créditos, um assombro. Como é óbvio, trata-se duma situação
insustentável e mesmo com taxas de esforço mais baixas basta uma pequena
perturbação ou algo de imprevisto, desemprego por exemplo, para que se rompa o
equilíbrio e as famílias entrem em incumprimento, com as previsíveis e
complicadas consequências.
A DECO recomenda 40% como a taxa
de esforço aceitável e prudente.
Apesar do peso brutal que a crise
económica, sobretudo o desemprego ou o abaixamento dos rendimentos do trabalho,
parece-me de considerar também o peso dos modelos económicos e sistema de
valores que nos envolvem e que merecem reflexão.
Como já tenho referido no Atenta
Inquietude, instalou-se a ideia de que "és o que tens". Bem podemos
afirmar que cada um de nós não olha assim para a vida, mas na verdade é difícil
resistir à pressão para o consumo e para a ostentação de alguns bens ou estilos
de vida que "atestem" que "somos" gente. É o crédito da
casa, do carro, da mobília, das férias, do casamento dos filhos, do plasma,
etc. etc. Tudo bens a que obrigatoriamente temos de aceder como prova de que
somos gente, embora também se conheçam situações de recurso ao crédito para
tratar questões de saúde.
Por outro lado, as instituições
financeiras que concedem crédito estiveram durante demasiado tempo bastante
mais atentas aos seus próprios interesses que aos riscos das pessoas que a elas
recorriam, fomentando e incentivando créditos manifestamente pouco sustentados
e com uma ligeireza inaceitável. Actualmente, revelam-se bastante mais
selectivas e cautelosas devido à subida enorme do valor do crédito malparado e
dos seus próprios custos de financiamento.
Este tipo de problemas é apenas
mais um indicador de como se torna necessário repensar valores e modelos de
organização e desenvolvimento. Eu sei que não é fácil e pode parecer ingénuo,
mas se não falarmos e não nos inquietarmos com isto, então é que nada mudará.
Nunca.
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