No Público refere-se hoje que começam a verificar-se situações de alunos que em idade de escolaridade obrigatória abandonam a escola por dificuldades económicas familiares. Nos tempos que correm torna-se muito difícil fugir à reflexão sobre os efeitos devastadores que as dificuldades económicas estão a assumir na vida de milhões de portugueses.
Os mais atentos lembrar-se-ão de um estudo recente do ISEG apontando para que cerca de 40% das crianças e adolescentes vivem em situação de pobreza sendo que esse quadro de privação afecta sobretudo os padrões e a qualidade da alimentação. O estudo sublinhava também, entre outros indicadores a merecer séria reflexão, por exemplo na campanha eleitoral em curso, que o grupo etário 0-17 anos é o mais vulnerável ao risco de pobreza tendo ultrapassado o dos mais velhos.
As perspectivas para o futuro próximo não parecem particularmente animadoras e este indicador, o abandono por razões económicas é mais um efeito. Sabemos que estamos num período económico recessivo, sem criação de riqueza e que devido aos baixos salários, continuamos um dos países mais assimétricos da Europa pelo que ter trabalho não chega para fugir ao risco de pobreza. Por outro lado, relembro um estudo de há uns meses realizado pelo I junto das autarquias dos distritos de Lisboa, Porto, Setúbal, Coimbra e Faro que revelou que quase metade dos alunos da educação pré-escolar e do 1º ciclo recebe apoios sociais sendo que em alguns concelhos a percentagem de crianças carenciadas atinge os 65%, número verdadeiramente impressionante. Acresce que em muitos concelhos a maioria das crianças apoiadas integram o escalão A dos apoios, o que se destina aos agregados com rendimentos mas baixos.
Estes indicadores sobre as dificuldades que afectam a população mais nova são algo de assustador. Esta realidade não pode deixar de colocar um fortíssimo risco no que respeita ao desenvolvimento e sucesso educativo destes miúdos e adolescentes e portanto, à construção de projectos de vida bem sucedidos. Como é óbvio, em situações limite como a carência alimentar, estaremos certamente em presença de outras dimensões de vulnerabilidade que concorrerão para futuros preocupantes.
É por questões desta natureza que a contenção das despesas do estado, imprescindíveis, como sabemos, deveriam ser feitas com critérios de natureza sectorial e não de uma forma cega e apressada, mas naturalmente mais fácil e que, entre outras consequências poderão empurrar milhares de crianças para situações de fragilidade e risco com implicações muito sérias.
Relembro a história que já aqui contei e que me aconteceu há uns anos em Inhambane, Moçambique, quando ao passar por uma escola para gaiatos pequenos o Velho Bata me dizer que se mandasse traria um camião de batata-doce para aquela escola. Perante a minha estranheza explicou que aqueles miúdos teriam de comer até se rir, “só aprende quem se ri”, rematou o Velho Bata.
Pois é, putos com fome não aprendem e vão continuar pobres.
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