quinta-feira, 2 de junho de 2011

O DIA DOS MIÚDOS

A agenda das consciências determinou até há poucos minutos que se pensasse nos miúdos, foi o Dia Mundial da Criança. Pode dizer-se que as iniciativas e os discursos, muitos, sucederam-se dirigindo-se, claro, à criança. Nestas alturas, lembro-me do Mestre Almada que na Cena do Ódio falava sobre, "a Pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões". De facto, muitos enchem os discursos e as intenções com a preocupação sobre os miúdos mas, todos sabemos, muitos passam mal, muito mal. Não cabem no Dia da Criança.
Não cabem os que diariamente são vítimas de crimes e maus-tratos.
Não cabem muitos os que vivem numa instituição esperando por uma família que nunca virá.
Não cabem os que são alvo de discriminação e a quem são negados direitos básicos.
Não cabem os que vivem em famílias que os não desejam e mal os suportam.
Não cabem os que apenas comem o que refeição única na escola lhes possibilita.
Não cabem os que vivem em famílias a quem roubaram a dignidade do trabalho e que, por isso, sobrevivem envergonhadamente.
Não cabem os que a escola não consegue ajudar a construir um futuro a que valha a pena aceder.
Não cabem os que sofrem de solidão e isolamento sem que se perceba como não estão bem.
Na verdade, estes miúdos quase não existem, os que existem são transparente, às vezes nem os vemos. Por isso, comemora-se o Dia Mundial da Criança com a convicção de que, como dizia Pessoa, "o melhor do mundo são as crianças" e elas são felizes, todas.
O que, obviamente, não é verdade.

2 comentários:

Anónimo disse...

Parece que não está só a falar das crianças.

abraço
António Caroço

Zé Morgado disse...

Pois, mas tenho que começar por alguém
Um abraço