domingo, 26 de junho de 2011

DE TANTO CHUMBAR, UM DIA APRENDES

O Expresso deste sábado que só hoje consegui ter tempo para ler, apresenta um trabalho muito interessante sobre uma questão que recorrentemente refiro, a reprovação escolar. Esta matéria está completamente na agenda pois, quer o novo ministro da Educação, o Professor Nuno Crato, quer o CDS-PP que integra a coligação no poder, defendem a introdução de mais exames, com hoje também se refere no Público.
Antes de algumas notas reincidentes, alguns dados citados pelo Expresso relativos ao ano passado.
No ensino básico chumbaram 77 000 alunos e no secundário 41 500. Neste número não estão incluídos alunos que frequentam currículos alternativos. No 1º ciclo chumbam cerca de 16 000 crianças, 3,5%, metade logo no 2º ano, o que é notável. Segundo uma investigação do ISCTE também citada, 35 % dos alunos tem Plano de Recuperação sendo que destes, 30 % acabam por chumbar. Os 7º e 9º anos do 3º ciclo têm retenções de 16% e 13% respectivamente. Portugal é um dos cinco países da UE com mais chumbos. Segundo relatório recente da Comissão Europeia, aos 15 anos 34.5% dos alunos portugueses já tinham chumbado, sendo que a média da UE a 27 é 16% e na Finlândia é menor que 3%.
Este quadro parece indiciar que reprovar mais não produz mais sucesso. Escapa-me a insistência no chumbo como forma de promover qualidade.
Muitos estudos internacionais também mostram que os alunos que começam a chumbar, tendem a continuar a chumbar, ou seja, a simples repetição do ano, não é para muitos alunos, suficiente para os devolver ao sucesso. Os franceses utilizam a fórmula “qui redouble, redoublera” quando referem esta questão.
Nesta conformidade, a questão central não é o chumba, não chumba e quais os critérios (quantas disciplinas, por exemplo) é que tipo de apoio, que medidas e recursos devem estar disponíveis para alunos, professores e famílias de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É necessário diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional. Como é evidente este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação uma tentação a que nem sempre se resiste.
Neste cenário a insistência na introdução de mais exames como panaceia da qualidade corre, do meu ponto de vista, o risco do trabalho escolar se organizar centrado na preparação dos alunos para a multiplicidade de exames que realizam, ou seja, como me dizia há tempos um professor do ensino secundário, "o trabalho com os alunos é muito interessante mas a partir de certa altura sou eu e eles contra os exames".
Esta perspectiva, mais exames como fonte de qualidade, parece decorrer da estranha convicção de que se medir muitas vezes a febre, esta irá baixar o que é, no mínimo, ingénuo.
A qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc. O problema é que de há muitos anos a educação anda à deriva das agendas políticas.
A defesa de mais exames, como muitas vezes é feita corre o risco de sustentar um discurso demagógico, as referências a exigência e a rigor vendem bem, que deixa de lado os aspectos mais essenciais.

Sem comentários: