A primeira página do JN contém um título extraordinariamente significativo, "Portugueses ficam 273 € mais pobres a cada mês".
Todos os dias somos confrontados com novas medidas que acentuam dificuldades para a maioria dos portugueses em várias áreas, designadamente nos aspectos ligados ao trabalho e emprego, saúde, apoios sociais, saúde, etc. Hoje também se refere na comunicação social o aumento exponencial de casais em que ambos estão desempregados. Todos este cenário devastador decorre da opção pela austeridade que tem conduzido ao empobrecimento. Curiosamente este empobrecimento é, de acordo com a visão do Primeiro-ministro, o projecto político que nos trará ... prosperidade.
O Presidente da República na austera gestão das suas intervenções, alerta para que "é impossível impor mais austeridade", enquanto o Primeiro-ministro defende que, "custe o que custar", tem que cumprir os objectivos do negócio com a troika e os objectivos da sua própria política "over troika", como tal, não pode assegurar que não seja necessária mais "austeridade", sendo ainda de esperar o aumento do desemprego, por exemplo.
Para além desta discussão, mais ou menos austeridade, o que nos preocupa seriamente são as condições de vida que muita gente está já a enfrentar, estamos a falar de pessoas, não de políticas, ou melhor estamos a falar do efeito das políticas na vida das pessoas.
Parece de relembrar que um estudo recente da Comissão Europeia que analisou a distribuição dos efeitos dos programas de austeridade os países que experimentam maiores dificuldades, Portugal, Grécia, Espanha, Irlanda, Estónia e Reino Unido conclui que Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", traduzindo, os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Pode ainda ler-se que nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível.
Portugal é ainda de acordo com o estudo o único país analisado em que "a percentagem do corte (devido às medidas de austeridade) é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.
Este dado parece-me extremamente relevante nesta discussão sobre a eventual necessidade de mais "austeridade" e mostra, de acordo com a percepção comum, que não existe equidade na repartição dos sacrifícios.
Para além de contrariar o discurso oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que a notícia tem de mas preocupante é a constatação de que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza.
Eu sei, sabemos todos, que a questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de dois milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra e que este relatório da Comissão Europeia sublinha.
A liderança que transforma é uma liderança com responsabilidade social e com sentido ético.
Neste quadro, não deixa de ter algum significado político a polémica em torno da não comparência de algumas figuras, MárioSoares ou Manuel Alegre, ou instituições, Associação 25 de Abril, na sessão da AR comemorativa do 25 de Abril. Na verdade, continuando sempre, sempre, a existir motivos que nos fazem comemorar a data, nunca, creio, o fizemos em situações tão difíceis e com tantas nuvens a ensombrar a nossa vida.
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