A propósito da decisão do MEC no sentido de que os alunos possam ser matriculados em escolas fora da sua área de residência, disposição que formalmente é positiva mas que na prática não tem qualquer repercussão como já tinha referido em texto anterior e o trabalho de hoje do Público confirma, entra de novo na agenda, parece ser intenção do MEC, a liberdade de escolha, ou seja, a possibilidade de escolha entre escolas públicas e privadas que é também abordada na peça. Retomo algumas notas sobre esta questão.
É com frequência que neste debate, e o Público tem uma tradição de o acompanhar, se citam as experiências de outros países em que se verifica a possibilidade de os pais escolherem entre escolas, públicas ou privadas, sendo que neste caso o Estado suporta financeiramente a escolha. Em primeiro lugar, importa sublinhar uma questão absolutamente fulcral, as escolas na generalidade dos casos em que se verifica a “liberdade de escolha” são OBRIGADAS a aceitar o aluno. Por outro lados, também é de referir que os estudos não estabelecem nenhuma relação conclusiva de causa-efeito entre a liberdade de escolha e a qualidade do sistema educativo, existem muitíssimas outras variáveis envolvidas.
No sentido de tornar mais claro o meu entendimento sobre esta questão, devo sublinhar que entendo a existência de um subsistema educativo de ensino privado como absolutamente necessária para, por um lado permitir alguma liberdade de escolha, ainda que condicionada, por parte das famílias e, por outro lado, como forma de pressão sobre a qualidade do ensino público.
No entanto, mais uma vez, refiro algo que é bem conhecido de todos os que de alguma forma lidam com o universo da educação. Muitas instituições de ensino privado não receberão nunca alguns alunos independentemente de os pais terem no fim de cada mês um voucher para pagarem a mensalidade ou desta ser suportada pelo estado. Não é uma questão económica, é uma questão de defender a instituição de situações de risco que lhe comprometam a imagem de excelência ou a posição nos rankings, sejam os dos resultados escolares sejam os do "capital social" que detêm.
A cultura mais generalizada entende os estabelecimentos de ensino privado como exclusivos e muitos deles são profundamente selectivos na população que acolhem. São conhecidos, o recurso ao “pedigree”, às notas, aos testes de conhecimento e até, a discutível utilização de testes de desenvolvimento pelos respectivos serviços de psicologia. Por outro lado, conhecem-se também estabelecimentos de ensino privado de onde, com baixíssima tolerância, alunos com algum insucesso e ou problemas do comportamento são "convidados" a sair para que se não comprometa a imagem e o estatuto da escola. Como já tenho afirmado, seria aliás interessante e um bom serviço prestado a este debate, uma investigação por parte da imprensa aos mecanismos de acesso aos colégios mais "cotados" e aos dispositivos de "convite" à saída sempre que alguma coisa corre menos bem.
Por outro lado, é também conhecido que mesmo entre escolas públicas se verificam práticas de selecção dos alunos de forma mais ou menos discreta e que já foram referidas por alguma imprensa mais atenta.
Reafirmando a necessidade de existência de um subsistema privado, insisto de há muito, que a melhor forma de proteger a liberdade de educação, é uma fortíssima cultura de qualidade, rigor e exigência na escola pública e uma acção social escolar eficaz e oportuna. Esta cultura assenta num trajecto imprescindível de autonomia e responsabilização que parece estar, tem sido anunciado, na intenção do MEC.
Assim teremos mais facilmente boas escolas, públicas ou privadas.
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