Que notícia! No JN lê-se que a Faculdade de Educação da Universidade de Cambridge está a contratar um docente no âmbito de um acordo com a Fundação Lego. O candidato deverá ser “Brincalhão,
provocador, curioso, de mente aberta e criativo".
Na verdade, em 2015 a Fundação
Lego, ligada à empresa produtora do mítico brinquedo, vai decidiu doar cerca de
cinco milhões de euros à Universidade de Cambridge. Este montante destinava-se
a financiar a existência e funcionamento de uma unidade curricular “Brincar na
Educação, Desenvolvimento e Aprendizagem” e de um Centro de Investigação também
assim designado “Brincar na Educação, Desenvolvimento e Aprendizagem”.
Na altura o DN solicitou-me um
comentário cujo sentido recupero a propósito da notícia de hoje contendo
algumas ideias que aqui já tenho defendido.
À iniciativa da Lego, através da
sua Fundação, não serão certamente alheios os potenciais dividendos em termos
de marketing e inscreve-se numa cultura de relação entre a universidade e as
empresas que se vai verificando em muitas partes o globo como forma de
financiamento da própria universidade. Sobre isto não faço qualquer apreciação.
A questão que me parece de
realçar é a mensagem envolvida na criação num contexto universitário de um espaço
curricular e de um Centro de Investigação dedicado ao brincar, a actividade
mais séria que as crianças realizam e que lamentavelmente tem vindo a ser revisto
em baixa.
Na verdade, há muitos anos,
lembro-me bem, ainda brincávamos na rua, melhor dizendo, ainda brincávamos. É
certo que muitos de nós não tiveram muito tempo para brincar, logo de pequenos
ficaram grandes. Não tínhamos muitos brinquedos, mas tínhamos um tempo e um
espaço onde cabiam todas as brincadeiras.
Entretanto, chegaram outros
tempos, estes tempos. Tempos que não são de brincar, são de trabalhar, muito,
em nome da competitividade e da produtividade, condição para a felicidade,
entendem. Roubaram aos miúdos o tempo e o espaço que nós tínhamos e
empregam-nos horas sem fim nas fábricas de pessoas, escolas, chamam-lhes. Aí os
miúdos trabalham a sério, a tempo inteiro, dizem, pois só assim serão grandes a
sério, dizem também.
Às vezes, alguns miúdos ainda
brincam de forma escondida, é que brincar passou a uma actividade quase
clandestina que só pais ou professores “românticos”, “facilitistas”,
“eduqueses” ou “incompetentes” acham importante.
Muitos outros miúdos vão para
umas coisas a que chamam “tempos livres”, que de livres têm pouco, onde,
frequentemente, se confunde brincar com entreter e, outras vezes, acontece a
continuação do trabalho que se faz na fábrica de pessoas, a escola.
Também são encaixados em dezenas
de actividades fantásticas, com nomes fantásticos, que promovem competências
fantásticas e fazem um bem fantástico a tudo e mais alguma coisa.
Era bom escutar os miúdos. Se
perguntarem aos miúdos, vão ficar a saber que brincar é a actividade mais séria
que eles fazem, em que põem tudo o que são, sendo ainda a base de tudo o que
virão a ser.
É também por isto que me parece
interessante, para além dos aspectos económicos envolvidos, esta iniciativa da
Universidade de Cambridge e da Fundação Lego.
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