Segundo se lê no DN, os serviços
de inspecção do MTSSS consideraram que um em cinco trabalhadores em situação de baixa médica avaliados reunia condições para trabalhar.
Com alguma regularidade surgem na
imprensa referências a esta prática, tão nossa, tão familiar, o recurso ao
"atestadozinho" que certifique incapacidade temporária para
trabalhar.
Creio que todos temos uma
percepção clara de que a utilização da baixa é apenas mais um dos muitos
"esquemas" em que vivemos mergulhados. A baixa permite o biscate que
compõe orçamentos familiares, liberta uns diazinhos de descanso, etc., e, é bom
que se diga, trata-se de um fenómeno que atravessa vários estratos sociais.
Trata-se da cultura instalada e
da relação ética com o trabalho, trata-se do "porreirismo" e,
finalmente, da impunidade e bonomia laxista com que tudo isto é encarado.
Por outro lado, apesar da
dificuldade dos clínicos na avaliação de sintomas eventualmente impeditivos de
trabalho, também todos conhecemos casos, muitos casos, de baixa consciência
deontológica, para ser simpático, de médicos que de forma leviana assinam
baixas médicas com a maior das facilidades. Em muitos locais se conhecem uns
"doutores" a quem recorrer para arranjar um
"atestadozinho".
Recordo que final de 2011 a Ordem
dos Médicos anunciou a intenção de apresentar uma proposta ao Ministério da
Saúde no sentido de dispensar a exigência de atestado médico impeditivo de
trabalho em algumas circunstâncias clínicas, como casos de gripe ou enxaquecas.
A proposta radicava, de forma sintética em duas ordens de razões, a sobrecarga
dos serviços com estes pedidos e a dificuldade que em alguns quadros clínicos o
próprio médico terá em atestar a impossibilidade de trabalho. Assim, a proposta
da Ordem remetia para responsabilidade do cidadão ou seja, para sua consciência
ética e deontológica, bem como dos próprios clínicos. É aqui que, do meu ponto
de vista reside a questão.
Eu ainda gostava de viver num tempo em que a
proposta da Ordem dos Médicos no sentido do cidadão avaliar as suas próprias
condições para trabalhar, fosse a regra e aceite sem desconfiança. No entanto,
como sempre afirmo, a realidade não é a projecção dos nossos desejos.
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