“Honni soit qui mal y pense” mas de repente lembrei-me de que
estamos em ano de eleições. No entanto, como sabem o Primeiro-ministro defende “que
se lixem as eleições” pelo que a medida agora acordada com as Associações Académicas
apenas traduz a enorme preocupação sempre demonstrada pelo Governo com o ensino superior
e com as dificuldades dos estudantes. Registe-se, pois, medida positiva anunciada.
Ao que se lê na imprensa, “O número de estudantes do ensino superiorque recebem bolsa de estudo vai aumentar no próximo ano lectivo, fruto de umaalteração às regras deste apoio que foi acordada, esta quinta-feira, peloGoverno e associações académicas. A nova redacção do documento vai baixar olimite a partir do qual os alunos são elegíveis, o que fará com que cerca de5000 estudantes possam agora receber a bolsa mínima, que lhes permite pagar apropina anual das universidades e institutos politécnicos.”
Recordemos que segundo o
Relatório "Sistemas Nacionais de Propinas no Ensino Superior
Europeu", divulgado em 2014 pela Comissão Europeia Portugal é um dos cinco
países entre os 28 Estados membros da União Europeia que cobram propinas a
todos os alunos do ensino superior. Integra também o grupo de países em que
menos de metade acede a bolsas de estudo.
No início de 2014 um estudo
patrocinado pela Comissão Europeia em oito países da Europa revelava, sem
surpresa, que Portugal apresenta uma das mais altas percentagens, 38%, de
jovens que gostava de prosseguir estudos mas não tem meios para os pagar. É
também preocupante o abaixamento que se tem vindo a verificar de procura de
ensino superior apesar deste ano se ter registado uma pequena subida. As
dificuldades económicas são a principal razão para não continuar.
Por outro lado, talvez seja de
considerar o impacto da tão perversa quanto errada ideia do "país de
doutores" que se foi instalando com o precioso auxílio de uma imprensa
preguiçosa e negligente pois não corresponde à verdade e que alimentando a
ideia de que "estudar não vale a pena", representa um verdadeiro tiro
no pé. Promove ainda o risco dos cidadãos desinvestirem em projectos de vida
que passem pela qualificação, a verdadeira alavanca do desenvolvimento e,
portanto, do futuro.
É ainda de relembrar que de
acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, Portugal é um dos
países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do
financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e
politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia, 23,6%.
Esta informação não é nova. Na
verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o
ensino superior em Portugal, contrariamente ao que muita gente afirma de forma
leviana, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de
2011/2012 da rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na
Europa, mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, tem
efectivamente o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Ainda neste contexto, em 2012 foi
divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de
Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na
sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa,
Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar
no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem
maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a
formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino superior particular
o esforço é ainda maior. Percebe-se assim a taxa altíssima de jovens que
exprimem a dificuldade de prosseguir estudos.
As dificuldades pelas quais
passam muitos estudantes do ensino superior e respectivas famílias, quer no
sistema público, quer no sistema privado, são, do meu ponto de vista,
considerados frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal
entendimento parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um
luxo, um bem supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Para reforçar a ideia de qua não
somos, definitivamente, um "país de doutores" importa sublinhar que,
apesar dos progressos dos últimos anos, estamos muito longe de poder vir a
cumprir a meta a que nos comprometemos com a UE para 2020, 40% de pessoas
licenciadas entre os 30 e os 34 anos.
A qualificação é a melhor forma
de promover desenvolvimento e cidadania de qualidade pelo que apesar de ser um
bem caro é imprescindível.
No entanto e apesar da medida anunciada, os tempos que
atravessamos e o vento que sopra da 5 de Outubro continuam a não parecer muito amigáveis.
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