Lamento mas não vou falar de novo
sobre a saída de Jorge Jesus do Benfica para o Sporting. É mais do que
suficiente a cobertura mediática ad
nauseam que este episódio tem tido. Venho retomar uma matéria que não
consegue competir com a importância e impacto da trocas do mundo do futebol,
sobre o qual, para evitar mal entendidos reafirmo a minha paixão, a vida de
muitos jovens que por razões de delinquência cumprem internamento nos Centros
Educativos pois, devido à idade, não podem, embora existam caso, cumprir pena
em prisões.
O I apresenta um trabalho interessante com histórias de jovens que estão nos Centros Educativos e as suas
perspectivas de vida. É inquietante perceber como os jovens abordados não
vislumbram com confiança um futuro diferente do passado que ali os trouxe,
exclusão e delinquência. Algumas notas.
Os Centros Educativos, as
instituições que recebem jovens envolvidos em situações de delinquência mais
grave sofrem de uma reconhecida sobrelotação e falta de recursos humanos com
qualificação pelo que dificilmente cumprem o seu papel fundamental de reabilitação através da construção
de programas de educação e formação profissional.
Segundo dados da Direcção-Geral
de Reinserção e Serviços Prisionais, 24% dos jovens de alto risco de
envolvimento em comportamentos de delinquência e a quem foram aplicadas medidas
tutelares incluindo o internamento em Centros Educativos reincidiram nos
primeiros 12 meses e ao fim de 26 meses a taxa de reincidência sobe para 48.6%.
É de recordar que segundo o Relatório de Segurança Interna de 2014, a
delinquência de jovens foi dos crimes cuja prevalência subiu nitidamente.
De acordo com um estudo divulgado
há meses, realizado no âmbito do Programa de Avaliação e Intervenção
Psicoterapêutica no Âmbito da Justiça Juvenil, promovido pela Direcção-Geral de
Reinserção e Serviços Prisionais e co-financiado pela Comissão Europeia,
revelou que a média etária dos rapazes dos centros é de 16,6 anos. Em geral,
acumulam mais de três anos de chumbos na escola, e, em 80% dos casos, são de
famílias cujo estatuto socioeconómico é baixo. É ainda relevante que mais de 90%
dos que foram entrevistados têm pelo menos uma perturbação psiquiátrica, “o que
é um dado astronómico”, como classificou Daniel Rijo, professor da Universidade
de Coimbra, um dos autores do trabalho para a DGRSP. Nem todos têm o
acompanhamento que seria necessário, admitiu.
Sempre que estas matérias são
discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da
integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério
das sociedades actuais pelo que a resposta recentemente criada, (mas ainda só
no papel) “casas de autonomização” pode constituir-se como um contributo se
dotada de recursos adequados.
As Comissões de Protecção de
Crianças e Jovens, em reestruturação, sentem-se incapazes de acompanhar o
volume de casos das respectivas comunidades, gerando situações, muitas
conhecidas, com fim grave de crianças que depois ficamos a saber que estavam
“sinalizadas” ou “referenciadas”, mas sem resposta.
Sabemos que prevenção e programas
comunitários e de integração têm custos, no entanto, importa ponderar entre o
que custa prevenir e cuidar e os custos posteriores do mal-estar e da
pré-delinquência ou da delinquência continuada e da insegurança.
Parece ser cada vez mais
consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição,
designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e,
sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos
mais novos em episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre
estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza
demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e
delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
Apesar de, repito, a punição e a
detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade
instalada, é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
É em todo este caldo de cultura
que nascem e se desenvolvem as sementes de mal-estar.
É urgente que nos questionemos e
questionemos as instituições, em nome dos nossos filhos e dos filhos dos nossos
filhos.
Recordo Brecht, "Do rio que tudo arrasta diz-se que é
violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem".
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