O DN divulga hoje uma notícia
curiosa com chamada a primeira página, A Fundação Lego, ligada à empresa produtora do mítico brinquedo, vai doar cerca de cinco milhões de euros à Universidade de Cambridge. Este montante destina-se a financiar a existência e funcionamento de uma unidade curricular “Brincar na Educação, Desenvolvimento e Aprendizagem” e de um Centro de Investigação também assim designado “Brincar na Educação, Desenvolvimento e Aprendizagem”.
O DN pediu-me um comentário à
notícia e aqui deixo umas notas no mesmo sentido do que referi ao jornal.
À iniciativa da Lego, através da
sua Fundação, não serão certamente alheios os potenciais dividendos em termos
de marketing e inscreve-se numa cultura de relação entre a universidade e as
empresas que se vai verificando em muitas partes o globo como forma de
financiamento da própria universidade. Sobre isto não faço qualquer apreciação.
A questão que me parece de
realçar é mensagem envolvida na criação num contexto universitário de um espaço
curricular e de um Centro de Investigação dedicado ao brincar, a actividade
mais séria que as crianças realizam e que actualmente foi revista em baixa,
lamentavelmente.
Na verdade, há muitos anos,
lembro-me bem, ainda brincávamos na rua, melhor dizendo, ainda brincávamos. É
certo que muitos de nós não tiveram muito tempo para brincar, logo de pequenos
ficaram grandes. Não tínhamos muitos brinquedos, mas tínhamos um tempo e um
espaço onde cabiam todas as brincadeiras.
Entretanto, chegaram outros
tempos, estes tempos. Tempos que não são de brincar, são de trabalhar, muito,
em nome da competitividade e da produtividade, condição para a felicidade,
entendem. Roubaram aos miúdos o tempo e o espaço que nós tínhamos e
empregam-nos horas sem fim nas fábricas de pessoas, escolas, chamam-lhes. Aí os
miúdos trabalham a sério, a tempo inteiro, dizem, pois só assim serão grandes a
sério, dizem também.
Às vezes, alguns miúdos ainda
brincam de forma escondida, é que brincar passou a uma actividade quase
clandestina que só pais ou professores “românticos”, “facilitistas”, “eduqueses”
ou “incompetentes” acham importante.
Muitos outros miúdos vão para
umas coisas a que chamam “tempos livres”, que de livres têm pouco, onde,
frequentemente, se confunde brincar com entreter e, outras vezes, acontece a
continuação do trabalho que se faz na fábrica de pessoas, a escola.
Também são encaixados em dezenas
de actividades fantásticas, com nomes fantásticos, que promovem competências
fantásticas e fazem um bem fantástico a tudo e mais alguma coisa.
Era bom escutar os miúdos. Se
perguntarem aos miúdos, vão ficar a saber que brincar é a actividade mais séria
que eles fazem, em que põem tudo o que são, sendo ainda a base de tudo o que
virão a ser.
É também por isto que me parece
interessante, para além dos aspectos económicos envolvidos, esta iniciativa da
Universidade de Cambridge e da Fundação Lego.
4 comentários:
Li um pouco na diagonal.
Mas Cambridge já é bastante conhecida por todos nós por implementar em POrtugal uma prova que se chama PET.
"Era bom escutar os miúdos."
Uma óptima sugestão.
O que se aprende é impressionante.
Eu não vou mais longe e fico-me nos GAD das escolas (Gabinete de Apoio Disciplinar)- o que se aprende com estes miúdos e menos miúdos daria, só por si, uma óptima tese de investigação.
A PET é mais uma PPP sem grande sentido. Valorizar o brincar é algo com muito sentido nos tempos que correm, em Cambridge ou em Lisboa.
Aliás, a propósito ainda de "escutar os miúdos" tenho para mim que quando muita gente se queixa de eles gritam muito será porque só assim são ouvidos (mas nem sempre escutados)
Enviar um comentário