Um estudo em desenvolvimento pela
Universidade de Coimbra sugere uma forte predisposição de alunos do ensino
superior para a fraude académica. Alguns dados, 44% dos alunos inquiridos
admitiram que copiariam num exame, 52% admitiram que copiariam por um colega, 73%
apresentariam o mesmo trabalho em diferentes disciplinas e 65,3% "ajudaria"
um colega num exame.
É ainda de registar que esta
predisposição para o "esquema" é mais elevada em alunos que frequentaram instituições privadas e com famílias
mais qualificadas e de mais elevado estatuto social. Este fenómeno estará,
provavelmente, ligado a expectativas mais elevadas para o sucesso escolar e a maior pressão para os resultados, mais evidente em famílias mais escolarizadas.
A propósito desta matéria, que
recordo a Universidade Católica de Braga divulgou um estudo envolvendo sete
países sobre as questões do plágio, segundo o qual, entre 40 e 60% dos alunos
do ensino secundário admitiram ter recorrido a tal procedimento.
De facto, o plágio é um dos tipos de fraude académica mais em alta também no ensino superior, realidade que conheço melhor, mas não
só, a título de exemplo já tive textos do blogue plagiados. Considerando o
volume crescente de situações muitas instituições têm vindo a adoptar
dispositivos de despiste e regulamentos que minimizem o risco de tais práticas.
É verdade que de há uns tempos
para cá, felizmente, tem vindo a emergir e entrar na agenda a questão da
utilização da informação disponível, designadamente na net, na produção
fraudulenta ou nos limites da ética de trabalhos académicos e científicos da
mais variada natureza. Neste âmbito, conheceu-se o primeiro caso, creio, em
Portugal de uma Tese de Doutoramento apresentada na Universidade do Minho e
anulada por motivo de plágio. O Centro de Estudos Sociais da Faculdade Economia
da U. de Coimbra tem vindo a desenvolver um estudo nacional sobre a questão da
fraude académica cujos dados iniciais apontavam no sentido de que de que 37.6 %
dos inquiridos aceita a fraude desde que “não prejudique ninguém” sendo agora
conhecidos mais dados. Merece ainda registo um estudo da Universidade do Minho
há tempos divulgado referindo que as situações de algum tipo de “copianço”
envolvem três em cada quatro estudantes.
Este tipo de comportamentos e os
discursos produzidos sobre eles em todos os níveis de ensino, do básico à
formação pós-graduada, doutoramentos incluídos, bem como artigos científicos, remete,
creio, para a natureza da relação ética que estabelecemos com o conhecimento e
que os alunos replicam. Aliás, no estudo da U. do Minho, dos alunos que
admitiam copiar, 90 % afirmavam fazê-lo desde sempre.
O conhecimento será entendido
como algo que se deve mostrar para justificar nota ou estatuto, não para
efectivamente integrar, ou seja, importante mesmo é que a nota dê para passar,
que o curso se finalize, que a tese fique feita e se seja doutorado ou que se
possa acrescentar mais um artigo à produção científica num mundo altamente
competitivo. Que tudo isto possa acontecer à custa da manhosice, do desenrasca
mais ou menos sofisticado, são minudências com as quais não podemos perder
tempo. O caso recente que envolveu o "Dr." Miguel Relvas é apenas um
exemplo mais mediatizado.
Não sendo um exclusivo do sistema
educativo constitui uma preocupação séria e justifica que as escolas, do básico
ao superior, se envolvam na tentativa de que todos tenhamos uma relação sólida
do ponto de vista ético com o conhecimento, a sua produção e divulgação.
O caminho passa pelo
estabelecimento obrigatório de códigos de conduta com implicações
sancionatórias severas e com uma atitude formativa e preventiva e próxima dos
alunos durante as aulas, como aliás o estudo agora conhecido sugere.
O trabalho será sempre difícil
pois o actual contexto ao nível dos valores e da ética dos comportamentos e
funcionamento social é, só por si, um caldo de cultura onde o copianço e o
plágio, por vezes, não passam de "peanuts".
É a cultura do desenrascanço, não
importa como.
2 comentários:
Quando temos um professor universitário de Economia e Finanças (na Universidade Lusófona, o que não deixa de ser sintomático!)e um engenheiro florestal, com 32 e 33 anos respectivamente, a publicar um livro intitulado FAZ O CURSO NA MAIOR, em que advogam que tirar um curso superior é "uma espécie de jogo" e consideram "um desperdício de tempo a forma como alguns alunos se dedicam aos livros", está tudo dito.
Aliás, neste livro a realidade é retratada de uma forma absolutamente despudorada, em que nem os professores universitários, grupo ao qual um dos autores até pertence, escapam do desprestígio, descrevendo-se a melhor altura para puxar da cábula durante um exame, com o professor alheado ou ausente, assim como a importância dos enunciados de testes dos anos anteriores, salientando-se que os professores gostam de repetir perguntas (uns preguiçosos!).
Os exemplos sucedem-se, relatados ao pormenor. Senão veja-se: "Quando os professores não deixam levar o teste para fora da sala, podes sempre tirar uma fotografia discretamente. Se chumbares, vais ter o enunciado para estudar. Aproveita e partilha a foto com os teus amigos (não te esqueças de tirar o som, para que o teu professor não oiça a máquina a disparar). [...] É tão fácil ser mais esperto do que o professor.[...] Se os professores não gostam de fazer e corrigir exames, ainda odeiam mais a vigilância do mesmo. E fazem tudo para que aquelas duas horas passem depressa: lêem o jornal, trabalham nos seus artigos científicos, preparam aulas, jogam no telemóvel, alguns até vão fumar um cigarro!"
Lindo! Vamos longe.
E eu consegui ler o livro (FAZ O CURSO NA MAIOR, Nuno Ferreira e Bruno Caldeira, Editora Lua de Papel, €9,90) emprestado por um ex-aluno que o recebeu como presente de Natal, três meses depois de ter iniciado o 1.º ano de uma licenciatura, oferecido por um familiar bem crescidinho que devia estar convencido que estaria a proporcionar uma boa aprendizagem ao sobrinho caloiro. :-(
Mas alguém sabe o que aconteceu ao Orientador do doutoramento da Universidado Minho anulado ? Provavelmente nada ... Quiçá é mais uma linha no curriculo do Orientador...
Enfim, o país que temos.
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