Um grupo de pessoas de diferentes
sectores de actividade dirigiu uma Carta Aberta a todas as instituições de
ensino superior sobre a questão das praxes, dos abusos que regularmente se
verificam e da necessidade de encontrar alternativas a estas práticas.
O alerta parece oportuno e
justifica-se. Daqui a dois meses inicia-se um novo lectivo e apesar de algum
abrandamento que creio notar-se nos últimos anos lá teremos os velhos problemas
das velhas praxes que, aliás, em muitas academias não são assim tão velhas, são
uma prática relativamente recente.
Julgo que autoridades académicas
e directivas das instituições têm um papel de evidente importância na questão
das praxes mas prefiro que a sua regulação e discussão se faça, sobretudo, através dos próprios estudantes. De facto, as mudanças
necessárias deveriam ocorrer não de uma lógica proibicionista das direcções ou
da tutela, de recomendações da Assembleia da República, ou da da chamada sociedade civil, mas das iniciativas dos estudantes. É isso que se deve esperar de
gente adulta e, espera-se, autodeterminada.
Como regularmente aqui afirmo
partindo de um conhecimento razoavelmente próximo deste universo, a regulação
dos comportamentos nas praxes tem-me parecido indispensável. Parece-me ainda
importante que os dispositivos de regulação das praxes integrem o respeito por
posições diferentes por parte dos estudantes sem que daí advenham consequências
implícitas ou explícitas para a sua participação na vida académica que,
frequentemente, não sendo "enunciadas", são, evidentemente,
praticadas.
Os repetidamente referidos
"Códigos de Praxe", nas suas diferentes designações, não parecem
suficientes para inibir abusos dos comportamentos e as consequências negativas
sobre os não aderentes às praxes.
Na verdade, de forma
aparentemente tranquila coexistem práticas muito positivas, genuínas intenções
de convivialidade, tradição e integração na vida académica com boçalidade,
humilhação e violência sobre o outro, no caso o caloiro, a “besta” como
elegantemente é designado. Tenho assistido e todos temos conhecimento de cenas
absolutamente deploráveis por mais que os envolvidos lhes encontrem virtudes.
Apesar dos discursos dos seus
defensores, continuo a não conseguir entender como é que, a título de exemplo,
humilhar rima com integrar, insultar rima com ajudar, boçalidade rima com
universidade, abusar rima com brincar, ofender rima com acolher, violência rima
com inteligência ou coacção rima com tradição. Devo, no entanto sublinhar que
não simpatizo com estratégias de natureza proibicionista, sobretudo em matérias
que claramente envolvem valores.
Quando me refiro a esta questão,
surgem naturalmente comentários de pessoas que passaram por experiências de
praxe que não entendem como negativas, antes pelo contrário, afirmam-nas como
algo de positivo na vida universitária. Acredito e obviamente não discuto as
experiências individuais, falo do que assisto e conheço.
A minha experiência
universitária, dada a época, as praxes tinham entrado em licença sabática, por
assim dizer, foi a de alguém desintegrado, isolado, descurriculado,
dessocializado e taciturno porque não acedeu ao privilégio e experiência sem
igual de ser praxado ou praxar. Provavelmente, advém daí a minha reserva.
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