Na minha terra, mas creio que não
só, quando nos queriam estimular a assumir a responsabilidade de construirmos o
nosso futuro, os mais velhos diziam-nos que a vida era um livro em branco onde
poderíamos escrever o que quiséssemos ou conseguíssemos.
Era assim uma espécie de versão
sofisticada do mais popular entendimento de que nos deitaremos na cama que
fizermos. O meu pai traduzia isto tudo insistindo na ideia de que deveria
estudar para ser um homenzinho.
Estes discursos, bem ingénuos,
ainda informam de forma discreta teses actuais remodeladas na forma e contidas
nos discursos liberais que nos procuram convencer de que qualquer pessoa tem a
hipótese de construir o futuro que quiser, o mito do “self made man” democratizado em modo empreendedor.
Convém ser realista quando daqui
a pouco tempo alguns milhares de crianças vão começar a sua escolaridade
formal. As pessoas não têm, de todo, a mesma possibilidade e oportunidade de
construir o futuro. As assimetrias e exclusão são devastadoras, os direitos
individuais mais básicos estão por cumprir, mesmo em sociedades consideradas
desenvolvidas, existe muita gente que nasce condenada à luta pela sobrevivência
sem expectativas positivas.
Contrariamente ao que os mais
velhos ingenuamente nos queriam fazer acreditar, a vida, para demasiadas
pessoas e logo de pequenas, é um livro já escrito, sem páginas em branco e com um fim bem negro.
2 comentários:
Outro ditado que os mais velhos diziam, "quem nasce com berço, (ou em berço de ouro) tem a vida facilitada". Ora, quem não nasce em berço de ouro, e consegue chegar onde os que nasceram conseguem, esses são os heróis. Conseguiram alterar o fim do livro.
Pois é Anabela. E a melhor forma de contrariar o destino é a educação, a escola. Só as capacidades individuais, por vezes, não chegam.
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