Durante o ano passado foram
comunicados à Polícia Judiciária 1611 desaparecimento de menores, cerca de
quatro por dia.
Felizmente a grande maioria
destes adolescentes são encontrados ou regressam nas 24 ou 48 horas seguintes.
Boa parte destes desaparecimentos está associada a incidentes pessoais ou a
resultados escolares. Merece ainda registo o número elevado de crianças
desaparecidas através do rapto parental em contexto de separações familiares
com algo grau de litígio e que, evidentemente, implicam enorme sofrimento para
todos os envolvidos, em particular para os mais vulneráveis, as crianças.
No entanto, lamentavelmente, nem
sempre os processos terminam com final feliz. Recordemos as tragédias mais
mediatizadas que envolveram o Rui Pedro desaparecido há 16 anos em Lousada no
norte de Portugal e a Maddie McCann em 2007 no Algarve, dos quais nada se sabe
sobre o que lhes terá acontecido.
De há uns anos para cá tem sido
feito um esforço nacional e internacional no sentido de aumentar a eficácia na
abordagem a situações desta natureza bem como dedicar maior atenção aos
factores de risco de que a título de exemplo se citam as redes sociais, que não
podendo, obviamente, ser diabolizadas, apresentam alguns riscos que não devem
ser negligenciados.
Situações como as do Rui Pedro ou
da Maddie McCann são absolutamente devastadoras numa família. Nós pais, não
estamos "programados" para sobreviver aos nossos filhos, é quase
"contra-natura". Se a este cenário acresce a ausência física de um
corpo que, por um lado, testemunhe a tragédia da morte mas, simultaneamente,
permita o desenvolvimento de um processo de luto, a elaboração da perda como
referem os especialistas, que, tanto quanto possível, sustente alguma reparação
e equilíbrio psicológico e afectivo na vida familiar, a situação é de uma
violência inimaginável.
No entanto, neste contexto creio que vale a pena não esquecer a existência de muitas crianças que estão
desaparecidas mas que, por estranho que possa parecer, estão à vista, situações
que por desatenção e menos carga dramática passam mais despercebidas.
Na verdade, existem muitíssimas
crianças e jovens que vivem à beira de pais e professores para os quais passam
completamente despercebidas, são as que eu designo por crianças transparentes,
olhamos para elas, através delas, como se não existissem. Não estando
desaparecidas, estão abandonadas. Algumas delas não possuem ferramentas
interiores para lidar com tal abandono e desaparecem, mantendo-se à nossa
vista, no primeiro buraco que a vida lhes proporcionar, um ecrã, outros
companheiros tão abandonados quanto eles, o consumo de algo que lhes faça
companhia ou a adrenalina de quem nada tem para perder.
Em boa parte das situações, por
estes ninguém procura.
E alguns, por vezes, também se
perdem de vez.
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