O presidente da CIP, António
Saraiva, afirma em entrevista ao Diário Económico que “Mais vale ter trabalho
precário que desemprego”.
Creio que a boa parte das
pessoas, sobretudo as que melhor sabem ou sentem as dificuldades económicas e
indignidade do desemprego tenderão a concordar com esta afirmação.
Acontece no entanto que como tem sido
recorrentemente divulgado existe um conjunto de situações no universo do trabalho e emprego que deve ser
considerado e não pode ser mascarado.
É frequente, por exemplo, a
utilização abusiva e escandalosa de estágios profissionais não remunerados,
sobretudo de jovens qualificados, situação que permite aos empregadores aceder
a mão-de-obra gratuita por alguns períodos de tempo, expediente que podendo ter
impacto nas estatísticas não muda a vida das pessoas, antes pelo contrário, é
um atentado à sua dignidade e direitos.
Por outro lado, a precariedade
nas relações laborais quase duplicou na última década. Portugal é o segundo
país da Europa, a seguir à Polónia, com maior nível de contratos a prazo. Por
outro lado, as políticas de emprego em curso continuam a insistir na maior
flexibilização das relações laborais o que apoia a afirmação de António Saraiva,
evidentemente.
Neste cenário, os desequilíbrios
fortíssimos entre oferta e procura em diferentes sectores, a natureza da
legislação laboral favorável à precariedade e insensibilidade social e ética de
quem decide ou emprega, promovem a proletarização do mercado de trabalho mesmo
em áreas especializadas ou mesmo o recurso a uma forma de exploração selvagem
com uma maquilhagem de "estágio" sem qualquer remuneração a não ser a
esperança de vir a merecer um emprego pelo qual se luta abdicando até da
dignidade.
Acontece ainda que alguns dos
vencimentos que se conhecem, atingindo também camadas altamente qualificadas,
não são um vencimento, são um subsídio de sobrevivência.
É justamente a luta pela
sobrevivência que deixa muita gente, sobretudo jovens sem subsídio de
desemprego e à entrada no mundo do trabalho, sem margem negocial, altamente
fragilizadas e vulneráveis, que entre o nada e a migalha "escolhem” a
"migalha", ou mesmo uma remota hipótese de um emprego no fim de
período de um indigno trabalho gratuito. Como é evidente esta dramática
situação vai de mansinho alargando e numa espécie de tsunami vai esmagando
novos grupos sociais e famílias.
É um desastre. Grave e dramático
é que as pessoas são "obrigadas" a aceitar. Os mercados sabem disso,
as pessoas são activos descartáveis.
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