Foram rejeitadas as propostas de PS e Bloco a condenar as penas aplicadas a Luaty Beirão e ao restante grupo de activistas. PSD, CDS e PCP votaram contra a "ingerência" nos assuntos internos de Angola.
O Parlamento deu mais um excelente exemplo de como os interesses mais pequenos se sobrepõem ao interesse maior.
Não só estabelece uma estranha mas gritantemente elucidativa maioria composta por PSD CDS-PP e PCP que hipocritamente não quer cometer qualquer "ingerência" externa, como estabelece, assume, a existência de ditaduras boas e das ditaduras más.
As "más" criticam-se, sobre as "boas" ditaduras não nos podemos pronunciar, são estados sobreranos e trata-se de questões internas nas quais não nos devemos "intrometer". O lado vergonhoso da "real politik" e de como os direitos humanos são para defender quando dá jeito.
Sinais dos tempos.
"E o mundo ..., sou eu que o contemplo, é ele que me contempla, ou trocamo-nos? ..." Herberto Helder
quinta-feira, 31 de março de 2016
EDUCAÇÃO INCLUSIVA - O estado da arte em Portugal
Ontem referi aqui o processo de
avaliação do Comité das Nações Unidas dos Direitos das Pessoas com Deficiência relativo
à da implementação e o cumprimento das normas estabelecidas pela Convenção
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência em Portugal.
No mesmo sentido deixo aqui uma
referência ao "Relatório sobre Portugal para o Estudo sobre as políticas dos Estados-Membros relativas a crianças com deficiência" elaborado no âmbito do
Parlamento Europeu e divulgado no final de 2014 sem grande conhecimento público
por cá, o que se percebe pela leitura do Relatório que, aliás, se recomenda.
Transcrevo um excerto do ponto 3.1.8
- Direito a uma educação inclusiva (artigo 28.º da CDC; artigo 24.º da CDPD) e sua
aplicação, na pg. 33.
“Apesar da retórica da lei, persistem lacunas importantes na aplicação
desses princípios e regras. As escolas regulares têm falta de recursos humanos
e técnicos para responder às necessidades de crianças com deficiência. Além
disso, a utilização da CIF como instrumento de avaliação tem sido problemática
para muitos alunos com deficiência: tem sido reportada uma falta de formação
para a aplicação do instrumento e um nível elevado de subjetividade nas
avaliações realizadas e, consequentemente, no apoio prestado. Outro estudo
demonstrou igualmente que o número de alunos com direito a apoio especial
diminuiu desde 2008 (o ano de aplicação do Decreto-Lei n.º 3/2008). O autor
alega que o novo sistema de educação inclusiva está, na verdade, a promover a exclusão
de muitas crianças, pois incide apenas naquelas com deficiência permanente, criando
simultaneamente novas formas de segregação ao concentrar o apoio em apenas algumas
escolas (as escolas de referência), enquanto todas as outras ficam sem os recursos
adequados. Uma conclusão semelhante é especificada no relatório do Conselho Nacional
de Educação que aponta para problemas criados pelos critérios de elegibilidade,
que excluem crianças com necessidades educativas de caráter temporário. Não
tendo respostas educativas adequadas em tempo útil, arriscam-se a que as suas dificuldades
se tornem permanentemente incapacitantes. Por fim, um estudo de monitorização
recente sobre os direitos das pessoas com deficiência verificou que a persistência
de rótulos e de estereótipos negativos associados a deficiência contribuem para
relações de desrespeito entre alunos com e sem deficiência. O mesmo estudo
refere que a falta de apoios especializados nas escolas regulares, incluindo a
ausência de material de apoio em formato acessível, a falta de formação dos
docentes e restante pessoal e a inexistência de transportes acessíveis,
constitui uma barreira significativa à educação de crianças com deficiência em
Portugal.
DA SÉRIE "METE-ME ESPÉCIE" - O problema do browser
Talvez fosse a altura de se
estudar o fenómeno. A administração pública parece ter, por assim dizer, uma
relação difícil com as plataformas informáticas.
Não sei se será má vontade ou
conspiração política por parte das plataformas mas a verdade é que boa parte
dos sistemas informáticos que servem a relação do cidadão com a administração experimentam problemas no seu funcionamento.
São demasiadas as situações em
que as ferramentas informáticas contribuem para o problema e não para a
solução.
Desta vez o alarido instalou-se
com a aparente impossibilidade de usar o “browser” mais utilizado entre nós no
processo de entrega das declarações de IRS.
Como diz o povo, é “galo”.
Eu que sou um bocadinho suspicaz
acho que a “informática” está sempre ao serviço da oposição.
UM JOVEM EMPREENDEDOR - outro diálogo improvável
Bem, Marco, estão a acabar as férias da Páscoa, tiveste quatro
negativas o que estás a pensar para o terceiro período?
Pai, não comeces já com secas, ainda estou de férias.
Eu sei, mas estou preocupado, tenho medo que chumbes o ano.
Não te preocupes, se melhorar a alguma disciplina os setores depois
dão-me notas para passar.
O problema não é só passares, é ficares a saber o que é preciso para
estudares mais à frente. Se calhar seria melhor arranjar umas horas de
explicação para te ajudar nas disciplinas mais difíceis.
Pai, já estou na escola bué de tempo, ainda queres que vá para a
explicação, ganda seca.
O meu colega, o Francisco, disse-me que a filha anda numa explicadora
muito boa, é um bocadinho cara, mas a filha já subiu as notas no fim do segundo
período.
Eu acho que sou capaz de me safar sozinho, podíamos fazer um negócio,
se eu passar dás-me um telemóvel novo.
Sabes que não gosto muito desse tipo de negócios, deves sempre tentar
fazer o melhor possível, porque é bom para ti, não porque vais ter um prémio.
Sim, mas ter um prémio também é bom para mim.
Todos nós temos obrigações e responsabilidades e não podemos cumpri-las
só quando nos prometem prémios.
Pai, tás mesmo armado em menino. Toda a gente faz alguma coisa sempre a
pensar o que vai ganhar com isso.
Certo, se te esforçares e passares de ano ganhas com isso.
Mas se ganhar também um telemóvel ainda é melhor. No teu trabalho se te
pagarem mais ficas mais contente, ou não?
Como sempre não desistes. Então vamos combinar o seguinte, se passares
o ano, sem negativas compro-te o telemóvel.
E se for só com uma negativa?
quarta-feira, 30 de março de 2016
INDEPENDÊNCIA E AUTODETERMINAÇÃO, UMA QUESTÃO DE DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
A Secretária de Estado da
Inclusão das Pessoas com Deficiência anunciou que que o Governo definirá em
breve a possibilidade a de acesso a fundos comunitários para os movimentos que
promovem a vida independente para pessoas com deficiência bem como a criação de
residências autónomas.
O anúncio foi feito no âmbito da
avaliação em curso por parte do Comité das Nações Unidas dos Direitos das
Pessoas com Deficiência da implementação e o cumprimento das normas
estabelecidas pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
A intenção agora anunciada, sobre a qual se aguarda mais informação, irá ao encontro de algo que movimentos e
organizações como os (d)Eficientes Indignados, têm vindo a exigir, o respeito
pela autonomia e direitos individuais e sociais das pessoas com deficiência,
designadamente, o direito à independência e autodeterminação.
O Comité terá feito alguma
pressão neste sentido pois segundo a Secretária de Estado o Comité tem
"uma ideia formada" de que Portugal é um país "muito
institucionalizador". Estranhamente, a Dra Ana Sofia Antunes afirma que “tentou
desconstruir esta ideia” no que diz respeito às pessoas com deficiência, ideia
que tentou desconstruir.
Digo estranhamente pois é exactamente
esse o cenário, uma visão institucionalizadora.
Na verdade, a política social dos
últimos anos pode, também, sintetizar-se da seguinte forma, cortes brutais nos
apoios às pessoas, às famílias, Rendimento Social de Inserção, subsídio de
desemprego, abono de família, etc., e aumento dos apoios às instituições que
operam no sector social.
Para quem nos tem governado os
pobres ou pessoas com deficiência não são capazes de tomar conta de si
próprias, precisam sempre da tutela cuidadora de uma instituição. Uma versão
enviesada de um estado social.
Com este entendimento, a título
de exemplo e como alguns trabalhos têm evidenciado, o Estado prefere entregar a
uma instituição uma verba para alimentar uma família numa cantina social
superior à verba que essa família recebe em Rendimento Social de Inserção.
Como é evidente as instituições
agradecem, as pessoas comem mas ... não se libertam da pobreza e da
dependência.
Situação semelhante se passa no
universo das pessoas com deficiência existe o mesmo problema que tem motivado
uma luta importante por parte das pessoas com deficiência.
De facto, o estado subsidia as instituições
para apoio a deficientes em 951€ mais uma parte dos rendimentos dos cidadãos
institucionalizados mas não apoia as próprias pessoas que poderiam encontrar
por sua iniciativa respostas e, provavelmente, com menores custos. Os cidadãos
com deficiência exigem também assumir a decisão sobre a escolha do seu
cuidador(a) dada a natureza da relação que se estabelece.
Mas é esse o entendimento
subjacente a boa parte das políticas sociais, os pobres, tal como as pessoas
com deficiência, não sabem tomar conta de si, precisam sempre da presença de
uma instituição prestadora de cuidados, não são autodeterminadas,
independentes.
Como é evidente, este discurso
não pretende tornar dispensáveis as instituições, são necessárias
particularmente em situações de crise ou de problemáticas mais severas, mas,
simplesmente, de defender que as pessoas, muitas delas, são capazes de tomar
conta de si próprias, incluindo a gestão dos apoios que a sua situação possa
justificar.
No fundo, é, simplesmente, uma
questão de direitos individuais e sociais.
Esperemos que a porta agora aberta
não se feche nem se deturpe e se caminhe no sentido certo, o respeito pela
autonomia e direitos individuais e sociais das pessoas com deficiência,
designadamente, o direito à independência e autodeterminação.
O PREÇO ELEVADO DA ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA, GRATUITA E UNIVERSAL
O ME e o Ministério da Economia
acordaram com a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros que os manuais
escolares não aumentam de preço no próximo ano lectivo.
Esta decisão bem como a
gratuitidade dos manuais do 1º ano também para o próximo
ano lectivo são um passo positivo no sentido do cumprimento da Constituição,
Art.º 74º (Ensino), “Na realização da política de ensino incumbe ao Estado: a)
Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito;
No entanto, como já tenho
afirmado e retomo algumas notas, creio que o caminho a percorrer em matéria de
manuais escolares deveria incluir estratégias que tentassem contrariar o que
costumo designar por uma excessiva manualização do ensino que emerge de
práticas pedagógicas pouco diferenciadas muito decorrentes de conteúdos
curriculares demasiado extensos, prescritivos e normalizadores. Seria desejável
atenuar a fórmula predominante, o professor ensina com base no manual o que o
aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo
o que professor ensina.
O número de alunos por turma é
também um facto contributivo para este cenário. A anunciada redução do número
de alunos por turma ao abrigo de uma verdadeira autonomia das escolas e dos
professores, permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e
construção de conhecimentos com base noutras fontes incrementando, por exemplo,
a acessibilidade a conteúdos e informação diversificada que as novas
tecnologias oferecem. Sem surpresa este entendimento é um dos eixos da reforma
em curso na Finlândia.
A questão é que os manuais
escolares constituem um importantíssimo nicho de mercado potenciado pela enorme
quantidade de materiais que os acompanham os manuais. Como exemplo é de
registar que a gratuitidade dos manuais para o 1º ano envolve um montante de
três milhões de euros. É um nicho de mercado com muito e peso os donos deste mercado dele não querem abdicar, recebam das famílias ou recebam do Estado.
Esta será também a razão que
impede novos modelos de manuais que permitam a sua reutilização num dispositivo
que me parece o mais ajustado e em uso em muitos países.
Os manuais escolares são
disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano
lectivo ou da sua utilização. As famílias são responsabilizadas pelo seu
eventual dano ou extravio e ficando, assim, com "folga" para
aquisição de outros materiais, livros por exemplo, um bem com pouca presença em
muitos agregados familiares.
Vamos ver a continuidade das
políticas educativas em matéria de manuais escolares já que o ME também
informou que será constituído um grupo de trabalho com o objectivo de construir
um plano plurianual para operacionalização de um modelo que para além da
gratuitidade contemple formas de reutilização de manuais escolares e recursos
didácticos.
Deve ser da idade mas tenho
sempre o receio de experiência feito que a constituição de um “grupo de
trabalho” é a forma mais expedita de … não mexer em qualquer matéria.
PELA EDUCAÇÃO É QUE VAMOS
Uma das questões que está
associada à relação dos alunos com a escola é a percepção que estes têm da
ligação entre a escola, a vida da escola e os conteúdos das actividades
escolares com a vida “fora da escola”. Por outro lado, durante muito tempo e de
formas mais ou menos positivas, mais ou menos bem-sucedidas entendia-se que a educação
é mais que actividade escolar em sala de aula centrada no estrito cumprimento dos
conteúdos curriculares ainda que estes procurassem envolver o “fora da escola”
Neste sentido e de várias formas
a escola sempre tem procurado manter essa ligação quer no âmbito de actividades
inscritas nos conteúdos curriculares quer em projectos diversificados.
No entanto, os últimos anos de
política educativa foram caracterizados por recentração excessiva e preocupante
na “disciplinas estruturantes”, nos conteúdos “essenciais”, nos saberes “instrumentais”,
os que servem para algo e subvalorizou-se uma enorme gama de conteúdos que são,
também eles, essenciais para a formação global das pessoas. Refiro, por
exemplo, todas as áreas relativas à formação pessoal, à formação social e cívica,
às expressões, à actividade física e ao desporto, etc.
A ideia de educação parece ter
vindo a ser substituída pela ideia “única” de aprendizagem como se o fim último
do trajecto educativo fosse a qualificação e não a formação de pessoas de que a
qualificação é uma das dimensões.
Muitas vezes tenho referido esta
inquietação.
Serve esta introdução par referir
a iniciativa a que muitas escolas estão a aderir de envolver os alunos num
olhar e na percepção do que é ser um refugiado, do drama de fugir de um inferno
em que se transformou, transformaram a sua vida, e na tragédia que isso
representa. As actividades desenvolver-se-ão no dia 6 de Abril.
Julgo que se trata de uma boa
iniciativa e um bom serviço prestado à educação.
A experiência e os estudos
mostram que o olhar e as atitudes dos mais novos são inspiradores de mudança, incluindo
nos comportamentos e atitudes dos mais velhos o que se tem verificado em várias situações de que pa preocupação com as questões ambientais é um exmplo claro. Seria bom que tal também
acontecesse com este drama, basta atentar nos discursos e comportamentos de
tanta gente em tantos países e na vergonhosa resposta europeia decorrente da
mediocridade da maioria das suas lideranças.
Mandela dizia que a educação é a
arma mais forte que temos para mudar o mundo.
Adaptando o enunciado de
Sebastião da Gama também poderemos afirmar “pela educação é que vamos”.
terça-feira, 29 de março de 2016
DA CORRIDA DE OBSTÁCULOS
O Governo está a rever o regime de atribuição de estacionamento a pessoas com deficiência para que passe também a beneficiar quem tem deficiência visual grave, seguindo uma recomendação feita pelo provedor de Justiça.
A vida de muitas pessoas com
deficiência e das suas famílias é uma constante e infindável prova de
obstáculos, muitas vezes intransponíveis, em variadíssimas áreas como
mobilidade, educação, emprego e segurança social em que a vulnerabilidade e o
risco de exclusão são enormes. Assim sendo, exige-se a quem decide uma
ponderação criteriosa de prioridades que proteja os cidadãos desses riscos, em
particular os que se encontram em situações mais vulneráveis.
Não precisam de tolerância, não
precisam de privilégios, não precisam de caridade, precisam só de ver os seus
direitos considerados. Os direitos não são de geometria variável cumprindo-se
apenas quando é possível.
Como sempre afirmo, os níveis de
desenvolvimento das comunidades também se aferem pela forma como cuidam das
minorias.
EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR É BEM MAIS QUE A PREPARAÇÃO PARA A ESCOLA
Umas notas no Público sobre a Educação Pré-escolar e a forma como é percebida.
segunda-feira, 28 de março de 2016
PRECARIEDADE DOCENTE
Segundo dados da Fenprof, um em cada quatro docentes trabalha em situação de precariedade.
Não tenho acesso aos números mas é seguro que milhares de professores com
muitos anos de contratos anuais e de prática avaliada continuam, mesmo ao
arrepio de determinações da UE, sem aceder a um lugar de quadro, uma peça
fundamental na estabilidade profissional, pessoal e familiar para além de se
tratar de um evidente incumprimento das disposições legais. Verificam-se
situações inaceitáveis ao nível de vencimentos de vencimento, existem casos em
que mais do que vencimento se deveria chamar subsídio de sobrevivência, bem
como ao nível das condições de trabalho com excesso de competição e abusos.
Este cenário ocorre no sistema público e no sistema privado incluindo o ensino
superior.
É um tiro na qualidade da
educação. Quantas vezes é preciso recordar que uma das características dos
sistemas educativos melhor sucedidos é, justamente, a valorização dos
professores e das suas condições de desempenho e profissionais.
A HISTÓRIA DO HOMEM QUE PERDEU ALGO
Cada vez me lembro mais deste
Homem.
Era uma vez um Homem que estava
sentado num banco de jardim. Já não era novo e parecia com um ar triste e abatido.
Era o único banco à sombra e nele
se sentou uma Pessoa que se foi inquietando com a tristeza suspirada pelo
Homem. Já preocupado interpelou-o com um neutro “Que tal vai a vida?”.
O Homem, como se apenas esperasse
por um pretexto, falou, do fundo, “Perdi-a,
tantas vezes que esteve quase, agora perdi-a. Tanto que me ajudou, sempre
comigo, no bonito e no feio, no leve e no pesado, na tristeza e na alegria e
agora perdi-a. Veio comigo desde sempre, sempre ao meu lado, sempre um amparo
que não falhava. Quando as coisas pareciam mal, lá vinha ela e o mundo já me
parecia melhor. Uma vez, que ela quase se foi, foi um desespero. Mas ela
voltou. Tínhamos as nossas zangas, mas sabe como é, quando somos mesmo amigos
as zangas também passam. E agora, perdi-a definitivamente. Não sei como vou
viver sem ela”.
A Pessoa já solidária, “E como se chamava a sua companheira perdida?”.
Paciência, disse o Homem. perdi-a de vez.
A ENTUSIASMANTE LISBON SOUTH BAY
Esqueçam o Allgarve.
Vai ter lugar o “take off” do “roadshow”
de promoção da Lisbon South Bay. Assim dito é logo meio caminho andado para o sucesso.
Começará no Brasil e,
evidentemente, não poderá deixar de passar ela China, digo eu.
Eu, um rapaz, nascido, criado e
habitante na mítica Margem Sul, vou passar a viver na Lisbon South Bay.
Não poderia estar mais
entusiasmado.
Assim sim, é progresso. É visão. É ... o futuro.
domingo, 27 de março de 2016
TPCS E FÉRIAS
O dossier aberto pelo Público sobre o que se passa nestas férias da Páscoa relativamente à existência, ou não, de TPCs mostram o quanto esta matéria merce ser discutida sem preconceitos e juízos
fechados.
Como tenho referido frequentemente
aqui e nos espaços de intervenção profissional, creio que o recurso aos TPCS clássicos
deve ser ponderado.
Em muitas famílias e com se
afirma em múltiplos trabalhos os TPCs clássicos têm ainda o problema de colocar
com frequência os pais em situações embaraçosas, querem ajudar os filhos mas
não possuem habilitações para tal.
A propósito, numa reunião de pais
em que participava e se discutia esta questão, dizia uma mãe, “o senhor, da
maneira que fala, se calhar é capaz de ajudar o seu filho, mas na minha casa,
chora a minha filha e choro eu, ela porque quer ajuda, eu porque não sou capaz
de lha dar.” Colocar os pais nesta posição parece-me inaceitável.
O recurso ao TPC deveria avaliar
se o aluno, cada aluno, tem capacidade e competência para o realizar
autonomamente, por exemplo, o treino de competências adquiridas. Na verdade,
porque milagre ou mistério, uma criança que tem dificuldade em realizar os seus
trabalhos na sala de aula, onde poderá ter apoio de professores e colegas, será
capaz de os realizar sozinha em casa? Naturalmente tal só acontecerá com a
ajuda dos pais ou, eventualmente, de "explicadores" a que muitas
famílias, sabemos quais, não conseguem aceder.
No entanto, do meu ponto de
vista, sobretudo nas idades mais baixas, o bom trabalho na escola deveria
dispensar o TPC. É uma questão de saúde e qualidade de vida.
Parece ainda de sublinhar que os
estudos sugerem que "é sobretudo a qualidade das aulas, mais do que o
tempo global de aprendizagem que está associado ao sucesso na aprendizagem.
Aliás, no citado relatório da OCDE também se conclui que não há uma relação
significativa entre o número médio de horas gastas nos TPCs e os resultados
escolares.
Retomando a questão em aberto
pelo Público dos TPC nas férias da Páscoa algo que já afirmei também numa
colaboração com a imprensa, as férias devem ser isso mesmo, férias sem as
mesmas rotinas e os mesmos trabalhos do tempo escolar.
Actividades como leitura, por
exemplo, não é um TPC, um dever a cumprir, é algo que se deve incentivar. A
leitura é só um exemplo.
DO TEATRO
Manda o calendário das consciências que se assinale hoje o Dia Mundial do Teatro.
Num tempo em que a cultura é considerada bem de luxo e supérfluo, aqui se regista uma muito bonita afirmação de Luís Miguel Cintra, um enorme Homem do Teatro, no discurso de aceitação do Prémio Pessoa de 2005.
Escolheu o teatro "para continuar a fazer em adulto aquilo que fazemos em crianças, para continuar a brincar contra toda a solidão".
Vivemos num mundo de gente só, que viva o teatro.
sábado, 26 de março de 2016
DOS JOBS FOR THE BOYS AND GIRLS
Como é reconhecido, a questão do
desemprego é de uma enorme gravidade e complexidade. São urgentes medidas
eficazes e diversas de promoção de emprego. Porque não começar pelos amigos?
Fazem parte da loja certa, da confraria
certa, têm o cartão certo, portanto ...
Há que começar por algum lado e
os amigos são para as ocasiões.
Aliás, o povo costuma dizer,
"quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não tem
arte".
Cambada de artistas, nem as
moscas, às vezes, variam.
São assim as contas da partidocracia.
Em alternância pois claro.
É curioso que ainda recordo do Professor
João Bilhim, Presidente da Comissão de Recrutamento da Administração Pública,
afirmar numa entrevista ao DN que se "acabaram os "jobs for the
boys" na Administração Pública", a atribuição de lugares de chefia
resulta da meritocracia.
A sério?! Meu caro João Bilhim talvez acordar e bater com a porta fosse uma boa ideia.
UMA NOVA OPORTUNIDADE AO NOVAS OPORTUNIDADES
Volto ao conjunto de medidas para
a educação que o último Conselho de Ministros aprovou para referir o anúncio de
um programa integrado de educação e formação de adultos. Citando o comunicado
oficial temos, “é necessário desenvolver, em parceria com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, um programa integrado de educação e formação de adultos que relance esta prioridade do País”.
Como ainda há dias escrevi no
Atenta Inquietude a formação e qualificação de muitas centenas de milhares de
portugueses é uma prioridade pois assume ma importância crucial para o nosso
desenvolvimento Regularmente são disponibilizados números por diferentes
agências nacionais e internacionais que sublinham esta questão.
Dito isto, parece obviamente
importante que sejam desenvolvidos os dispositivos adequados à qualificação das
pessoas.
Estamos todos recordados do aparecimento
há uns anos do Programa Novas Oportunidades, sobre o qual afirmei no início
"O lançamento de um Programa com o objectivo de estruturar e incrementar
os processos de qualificação de sujeitos que abandonaram o sistema é,
obviamente de saudar. Parece-me também de sublinhar o interesse e significado
que o Reconhecimento e Validação de Competências, a génese do Novas
Oportunidades, pode assumir para pessoas com largo trajecto profissional, sem
certificação escolar, mas que tiveram acesso a um processo de reconhecimento de
competências profissionais entretanto adquiridas e a aquisição de equivalências
aos processos de escolarização formal".
No entanto, o desenvolvimento
posterior do Programa e as sucessivas intervenções os responsáveis do Programa
rapidamente evidenciaram o enorme equívoco, ou melhor, embuste, de confundir
qualificação com certificação, ou seja, é possível passar milhares de
certificados de 9º e 12º anos em pouco tempo mas é, obviamente, impossível qualificar
milhares de pessoas em pouco tempo. Foi neste quadro que se desenvolveu o
Programa e que era bem conhecido por parte de quem acompanhava os Centros Novas
Oportunidades onde, pese o esforço e dedicação de muitos técnicos, se verificou
uma enorme pressão para que se "produzam" certificados.
Relembro que na altura da
realização do 4º Encontro Nacional dos Centros Novas Oportunidades, a então
Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, afirmou que tendo-se inscrito
no Programa 1 milhão e 489 000 portugueses, se certificaram 456 000 o que,
cito, "isto corresponde a uma média de 10 000 certificações por mês, o que
é muito". Eu também acho e daí mais uma vez a ideia de provavelmente a
certificação não corresponderia a qualificação.
Em Dezembro de 2008 também o Professor Luís Capucha,
responsável pelo Programa, afirmava que, “estando a certificar 4 000 pessoas por mês, é
curto, temos que aumentar a produção de certificados, temos que multiplicar por
sete o “produto”, temos que certificar 29 900 para cumprir as metas do
Governo”. Como disse na altura, parece-me possível certificar 30 000 pessoas
por mês, qualificá-las é algo bem mais difícil.
Entendia que até como medida de
protecção das pessoas envolvidas e do impacto social dos processos de
qualificação, que é importante caminhar no sentido de que a qualificação ou
reconhecimento de competências não seja um processo socialmente percebido como
de natureza “administrativa”, sem rigor e qualidade destinado a melhorar
“estatísticas”.
Entretanto e como é habitual
quando mudam os Governos, o Ministro seguinte, Nuno Crato, decidiu extinguir os
Centros Novas Oportunidades e substituiu-os pelos Centros para a Qualificação e
o Ensino Profissional. O período de desinvestimento em educação que se seguiu levou
a uma quase estagnação no universo da educação de adultos com custos sérios
para o nosso desenvolvimento.
Parece, assim, positivo, que esta
matéria seja definida como prioridade embora também espere para ver que Programa
surgirá e a forma como serão tratados em matéria de recursos e competências os Centros
para a Qualificação e o Ensino Profissional
Espero que o programa a construir
consiga resistir à tentação de trabalhar para a “estatística”, instalando um fingimento de formação e
certificação de competências que promovendo certificação e não promove qualificação.
Vamos aguardar por esta nova
oportunidade às Novas Oportunidades.
sexta-feira, 25 de março de 2016
MELHORAR O ENQUADRAMENTO LEGAL DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
O Conselho de Ministros de ontem
aprovou um pacote de medidas de política educativa. Umas notas sobre o ponto 4
referente à Educação Inclusiva sobre a qual se lê no comunicado oficial, “Assim, o Ministério da Educação, em parceria com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e com o Ministério da Saúde, cria um Grupo de Trabalho com a missão de melhorar o enquadramento legal da Educação Inclusiva, adequando-a às reais necessidades educativas especiais dos alunos”.
Dada a natureza deste espaço umas
notas muito breves.
Inúmeras vezes tenho referido a
necessidade de mudanças no quadro legal que suporta a educação de alunos com
necessidades educativas especiais nas escolas regulares. Apesar da retórica
preambular assente na promoção da inclusão muitas das disposições acomodam
práticas de exclusão ampliadas por um sistema educativo sem regulação eficaz.
Quer no Atenta inquietude, quer
em intervenções e textos no contexto profissional, quer em audições no ME, no CNE ou na AR para as
quais tiveram a gentileza de me convidar tenho acentuado várias das mudanças que do meu ponto de vista são necessárias e diria urgentes.
Retomo aquilo que costumo
designar por “pecado original” do DL 3/2008, a base legal mais “pesada” nesta
matéria, a introdução do critério de elegibilidade para que os alunos possam
aceder a apoios educativos.
Esta decisão que contestei desde
o início e uma das mais emblemáticas incompetências da passagem de Maria de Lurdes
Rodrigues implicou que milhares de crianças com dificuldades deixassem de ter
apoio.
Em educação não existe “elegibilidade”.
A justificação dada na altura é que muitos alunos eram apoiados sem que se
justificasse. Como? Qualquer aluno que experimente algum tipo de dificuldade,
mais ligeira, mais pesada ou mesmo não identificada mas sentida pelos
professores deve ter algum tipo de apoio, deve ser avaliada, bem avaliada, e a
intervenção ou orientação será conforme essa avaliação. Não deve ser
considerada elegível ou não elegível.
Estabelecendo este errado
entendimento tornou-se necessário encontrar forma de dividir os alunos.
Recorreu-se a uma instrumento muito interessante para várias objectivos mas não
avaliação educativa a CIF - Classificação Internacional de Funcionalidade, um
instrumento produzido no âmbito da Organização Mundial de Saúde para fins que,
evidentemente, não se dirigiam à educação.
Como consequência, milhares de
alunos ficaram sem apoios. Mais recentemente tem-se assistido a um outro processo,
se não forem elegíveis os alunos não têm apoios e as escolas, os professores e
técnicos, sentem-se obrigados a recorrer a um rótulo que os torne elegíveis e,
portanto, a acederem a apoio de que precisam ao qual não acederiam se não
fossem “classificados” como elegíveis.
Esta é uma questão central do meu
ponto de vista. Importaria também simplificar e clarificar procedimentos e
terminologia.
A título de exemplo apenas a
referência a uma coisa bizarra chamada CEI – Currículo específico Individual,
uma originalidade, ainda não encontrei nada assim designado, dado que se um
currículo é individual, dificilmente não será específico. Esta coisa já está em
aplicação a alunos do 1º ciclo em circunstâncias inquietantes pelo impacto no futuro educativo dos alunos.
Neste sentido creio que se
deveria reflectir de forma alargada em tudo o que envolve questões de natureza
curricular ou organização das respostas, escolas de referência, unidades estruturadas,
etc. que apesar de algumas boas práticas em algumas circunstâncias são espaços
de exclusão em nome … da inclusão.
As questões relativas à avaliação
escolar merecem também ajustamento mas de forma integrada relativamente a todo
o sistema de avaliação da escolaridade obrigatória.
Finalmente apenas mais uma referência
à urgência de repensar os modelos de envolvimento de entidades e técnicos
exteriores à escola no período da escolaridade obrigatória. Em outsourcing não se promove educação de
qualidade e inclusiva.
Muitas outras questões merecem atenção pelo que, provavelmente, voltaremos a esta matéria
A ver vamos o que acontecerá. No entanto, seria crucial que desde logo se assumisse que sendo importante "melhorar o enquadramento legal" tudo o resto é fundamental, recursos, meios, qualificação, supervisão e regulação, envolvimento e participação dos pais, etc., etc.
UM DIA JÁ NÃO AGUENTO
Já aqui tenho abordado esta
matéria mas a sua gravidade justifica retomá-la. Foi apresentado em Lisboa o relatório
Portugal - Saúde Mental em Números 2015.
Dois dos indicadores abordados no
que respeita à saúde mental dos mais novos merecem uma reflexão que, aliás, já
por aqui tenho procurado realizar.
Um primeiro aspecto e que,
lamentavelmente, tem constado regularmente nestes relatórios anuais prende-se
com a ausência inaceitável de camas no SNS para episódios de urgência para
crianças e adolescentes no âmbito da saúde mental. Esta recorrente situação
leva a que quando necessário crianças e jovens sejam internados nos serviços de
pediatria geral ou nos serviços de psiquiatria para adultos. Qualquer das
situações é manifestamente inadequada.
Um segundo dado remete para o
volume significativo de casos de comportamentos auto-agressivos, automutilaçõese tentativas de suicídio. Dos 1500 episódios de urgência no Hospital de D.
Estefânia em 2015, 20% envolveram situações desta natureza.
Sobre esta questão com que muitos
adolescentes e famílias se debatem e causadoras de enorme sofrimento para todos
recordo que o estudo A Saúde dos adolescentes Portugueses, de 2014 e integrado no
estudo internacional Health Behaviour in School-aged Children, da
responsabilidade da OMS, coordenado em Portugal pela excelente equipa da
Professora Margarida Gaspar de Matos, sugeria que um em cada seis alunos entre
o 8º e o 10º ano já se magoou a si próprio, de propósito, nos últimos 12 meses,
sobretudo cortando-se nos braços, nas pernas, na barriga... Referiram que se
sentiam “tristes”, “fartos”, “desiludidos” quando o fizeram.
Este indicador subiu quase cinco
pontos percentuais face ao Relatório de quatro anos antes.
Na verdade, os comportamentos de
automutilação em adolescentes são mais frequentes e graves do que muitas vezes
pensamos. Alguns estudos internacionais apontam para cerca de 10% da população
em idade escolar com este tipo de comportamento pelo que os dados que se
encontram em Portugal são, de facto, preocupantes.
Este quadro é um indicador do
mal-estar que muitos adolescentes e jovens sentem. Em muitas situações não
conseguimos estar suficientemente atentos. Acontecem com alguma frequência
situações de sofrimento com as mais diversas origens, relações entre colegas,
bullying por exemplo nas suas diferentes formas, ou relações degradadas em
família que facilitam a instalação de sentimentos de rejeição, ausência de
suporte social, facilitadoras de comportamentos auto-destrutivos.
Começa também a emergir como
causa deste mal-estar a dificuldade que algumas crianças e adolescentes sentem
em lidar com situações de insucesso escolar. Estas dificuldades são
frequentemente potenciadas pela pressão das famílias e pelo nível de competição
que por vezes se instala.
O sofrimento e mal-estar induzem
uma espiral de comportamentos em que os adolescentes causam sofrimento a si
próprios o que promove mais sofrimento num ciclo insuportável e com níveis de
perplexidade, impotência e sofrimento para as famílias também
extraordinariamente significativos.
Depois das ocorrências torna-se
sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e
adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes,
não damos atenção, seja em casa, ou na escola espaço onde passam boa parte do
seu tempo.
De facto em muitos casos,
designadamente, em comportamentos de automutilação, pode ser possível perceber
sinais e comportamentos indiciadores de mal-estar. Estes sinais não podem, não
devem, ser ignorados ou desvalorizados. É também importante que pais e
professores atentos não hesitem nos pedidos de ajuda ou apoio para lidar com
este tipo de situações.
Muitos pais, diz-me a
experiência, sentem-se de tal forma assustados que inibem um pedido de ajuda
por se sentirem impotentes e perplexos.
O resultado pode ser trágico e
obriga-nos a nós a uma atenção redobrada aos discursos e comportamentos dos
adolescentes.
quinta-feira, 24 de março de 2016
DO FIM DO ENSINO VOCACIONAL
Elementos do grupo Pensar a
Educação assinam hoje no Público um texto de opinião sobre o anunciado fim do
actual modelo do designado “Ensino Vocacional”. As considerações expressas
levam-me a retomar umas notas sobre a mesma questão que também divulguei em texto
de opinião no mesmo jornal.
Ensino vocacional, algumas notas
DA EDUCAÇÃO DE ADULTOS
O Professor Filinto Lima aborda
hoje em artigo de opinião no Pública uma matéria que deveria constituir uma
prioridade em matéria de política educativa, a educação de adultos.
A educação de adultos é hoje uma área de forte investimento em diversos sistemas educativos mesmo em países taxas de alfabetização bastante acima das nossas.
Segundo a PORDATA também citada
por Filinto Lima e considerando os Censos de 2011 teríamos uma taxa de
analfabetismo de 5.15%. Sendo certo que este dado representa um salto relevante
face a 25.7% em 1970 ainda mantemos uma taxa demasiado elevada.
Nos últimos anos apesar das
mudanças verificadas o desinvestimento na educação também se reflectiu
naturalmente neste universo.
Se à taxa de analfabetismo
acrescentarmos o analfabetismo funcional, pessoas que foram escolarizadas mas
que não mantêm competências em literacia, a situação é verdadeiramente
prioritária, atingirá certamente pelo menos dois milhões de portugueses.
Também por estas razões continuo
a pensar que não temos professores a mais e muitos professores com anos de experiência avaliada e tratados como descartáveis teriam muito trabalho nesta área.
Os custos pessoais e sociais para as pessoas nesta situação, em várias dimensões, e o impacto económico da falta de competências em literacia justificaria um fortíssimo investimento em minimizar a situação até ao limite possível. Como sempre trata-se de matéria de opções políticas e visão de sociedade.
Os custos pessoais e sociais para as pessoas nesta situação, em várias dimensões, e o impacto económico da falta de competências em literacia justificaria um fortíssimo investimento em minimizar a situação até ao limite possível. Como sempre trata-se de matéria de opções políticas e visão de sociedade.
Tantas vezes é preciso afirmar, os
custos em educação não representam despesa, são investimento e com retorno
garantido.
SOBREVIVER DE PROJECTO EM PROJECTO
Bolsas de pós-doutoramento vão ser substituídas por contratos de trabalho
Será que se passará da luta pela bolsa de pós-doutoramento à possibilidade de uma carreira?
Será que se reduzirá seriamente o número de jovens doutorados que tem a sua vida transformada num projecto que se resume à luta cada vez mais dura por mais um projecto, por mais uma bolsa, por mais um financiamento?
Como se diz no Alentejo, deixem lá ver.
OBRIGADO CRUYFF
Para um eterno apaixonado pelo
futebol é impossível não falar da partida de Johan Cruyff. Na minha memória retenho
o gozo de ver jogar no pleno das faculdades, Pelé, Maradona, Eusébio e Cruyff, maiores entre os maiores.
Era uma coisa mágica.
Chegou a vez de Cruiff nos
deixar. Desde os tempos do Ajax, depois no Barcelona e, claro, na mítica
Laranja Mecânica, a selecção holandesa, Cruyiff marcou, criou, um estilo de jogo que
ainda perdura.
A vida é efémera, o futebol ainda
mais. No entanto, a recordação da técnica pura e da beleza leve, elegante, do
futebol de Johan Cruyff perdurarão entre os que gostam deste desporto,
sobretudo os que tiveram o privilégio de assistir com a regularidade possível à exibição da sua genialidade.
Obrigado.
A SÉRIO?!
É a grande surpresa da época da
Páscoa. Uma auditoria interna realizada no Banco de Portugal, já terminada e
bem guardada há quase um ano, revela falhas na supervisão e regulação
relativamente ao BES. O relatório levanta dúvidas sobre a actuação dos
Governadores, Carlos Costa e do sonolento e distraído Vítor Constâncio que,
recorde-se, foi premiado com a vice-presidência do BCE pela excelência do seu
desempenho.
Ninguém estava à espera de tal
resultado. Todos confiavam na perspicácia, competência e atenção do Banco de
Portugal na sua função reguladora e de supervisão da banca.
O próximo mistério a ser revelado
será … e o que vai acontecer?
Pronto, está bem, se insistem é melhor
revelar já.
Isso, adivinharam, nada.
quarta-feira, 23 de março de 2016
OUTRO DIÁLOGO IMPROVÁVEL. O MAL-EDUCADO
És um cabeça no ar.
Antes no ar que enterrada no chão como a avestruz.
Estás sempre na Lua.
Quero ser astronauta.
Não vais ser ninguém na vida.
Óptimo, quero ser alguém, não quero ser ninguém.
Não passas de um “cabeça de vento”.
Estou numa de energias alternativas.
Só fazes coisas sem jeito.
Para isso tenho jeito.
Como é que queres que alguém goste de ti?
Gostando.
Estás sempre distraído.
Não, estou concentrado noutra coisa.
Fazes tudo ao contrário dos outros.
Sou original.
Dessa maneira não vais a lugar nenhum.
Melhor, assim vou a algum lugar em vez de nenhum.
Afinal, que vida vai ser a tua? Esta, a minha.
Não sei mais o que te diga.
Será melhor pensar um pouco mais.
Definitivamente, és um mal-educado.
Finalmente, considerando que não me educo sozinho, de quem é a responsabilidade?
DA SÉRIE METE-ME ESPÉCIE. OS TUDÓLOGOS
De há uns tempos para cá tem-se
verificado uma espécie de inundação da comunicação social por uma nuvem de opinadores
e comentadores das mais variadas origens e sendo mais ou menos conhecidos. É
verdade que existem os “do costume”, os que sempre tiveram tempo de antena,
Marcelo Rebelo de Sousa é o expoente máximo da arte, mas surgiram muitíssimos
outros. Eu próprio acabei por ser convidado a emprestar um contributo regular
dentro da minha área.
Sobre todas as matérias que
constituem ou podem constituir a agenda temos assim opiniões e explicações para
todos os gostos e paladares. Temos até, frequentemente, opiniões e explicações
que dizem nada, não acrescentam nada, são ruído, desinformação ou cumprem
outras agendas que não a informação. Esta gente integra inúmeros “painéis de
comentadores” que de uma forma conclusiva, definitiva, sem qualquer espécie de dúvida, iluminam o que devemos todos pensar sobre o que quer que esteja em discussão.
Refiro-me aos tudólogos,
isso mesmo, os que sabem de tudo. É vê-los a emitir os seus "achismos"
ou numa variante semântica também frequente os seus "Para mim..." por
todo o lado onde apareça um microfone, uma câmara ou uma página de jornal ou
revista.
O espectáculo é, por vezes,
arrasador para a auto-estima de um cidadão que ao longo de uma laboriosa vida
de estudo e reflexão procura conhecer uma qualquer área do saber. Eles, sempre
os mesmos, falam, "acham", sobre não importa o quê, saúde, política
(externa ou interna), educação, economia, arte, etc. (uff!!). Estranhamente,
por vezes, aparecem também acompanhados por pessoas de facto conhecedoras das
áreas em discussão e de quem esperam, ou arrogantemente exigem, a caução da sua
óbvia ignorância mascarada de "opinião esclarecida".
Curiosamente, a comunicação
social ou, para ser justo, parte dela também mal preparada deleitando-se com a
exibição despudorada de um umbigo tão grande quanto a ignorância, subscreve e
amplia as maiores banalidades ou disparates que, diletantemente, os tudólogos
emitem.
Atentem nessas figuras e vejam se
conseguem identificá-las.
terça-feira, 22 de março de 2016
OS TRABALHOS DE CASA, DE NOVO
Existem algumas matérias na
educação que por várias razões entram regularmente na agenda. Uma dessas
matérias é a questão dos "trabalhos de casa" e uma outra bem recente e ainda em
aberto tem a ver com “os exames”.
Por outro lado, talvez fruto do
clima de fortíssima crispação que nos últimos anos envolve a educação, os
debates e as ideias também tendem a ser crispados, com opiniões
definitivas e sem margem de entendimento. Um exemplo muito claro que me deixa
perplexo tem sido encontrar regularmente afirmações, mesmo na chamada imprensa de referência,
de que a “esquerda” é contra os exames e a “direita” é a favor dos exames. É
difícil abordar estas questões de forma mais disparatada. Eu, por exemplo, que
sempre achei indispensável a avaliação externa em todos os ciclos de ensino mas
dispensáveis os exames finais do 4º ano pertenço à “esquerda” ou à “direita”?
Serve esta introdução para
retomar a questão dos “trabalhos de casa” que são objecto de dossier aberto no
Público e que merece ser acompanhado.
Certamente virá a questão, contra
ou favor dos TPCs? Retomo notas antigas algumas de um trabalho também o Público
procurando reflectir sobre a questão sem qualquer visão fundamentalista.
Segundo a OCDE num trabalho "Does homework perpetuate inequities in
education?" produzido com base em dados recolhidos no âmbito do PISA nos
anos de 2003 e 2012 os alunos portugueses de 15 anos, dado de 2012, gastam em
média 4h semanais na realização de trabalhos de casa, menos uma hora que em
2003 e menos uma hora que a média dos 38 casos estudados pela OCDE.
Do meu ponto de vista, os dados
mais relevantes deste relatório remetem para o facto de que os alunos com
famílias de meios sociais e económicos mais favorecidos gastarem mais 2 horas
em trabalhos de casa que os seus colegas com famílias de estatuto mais baixo o
que, sublinha a OCDE, poderá alimentar a falta de equidade.
Neste contexto, parece-me
pertinente recordar que o nível de escolaridade dos pais, em Portugal em
particular da escolaridade da mãe conforme dados recentemente divulgados, é um
fortíssimo preditor do sucesso escolar dos filhos. Um recente trabalho da
responsabilidade conjunta da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do CNE
mostrou que que nove em cada dez alunos com insucesso escolar são de famílias
pobres.
Estes dados sustentam o
entendimento de que os trabalhos de casa correm o sério risco de alimentar
desigualdade de oportunidades e obriga-nos a reflectir sobre a sua utilização.
Parece-me também importante o
facto de que no nosso sistema educativo os alunos do 1º, 2º e 3º ciclo podem
passar 8 ou 10 horas diárias na escola considerando o tempo lectivo, as
Actividades de Enriquecimento Curricular e a Componente de Apoio à família, (no
limite algumas crianças poderão estar 55 horas semanais na escola, uma
enormidade). Este tempo de permanência na escola é um dos mais longos dos
países da OCDE e vai também envolver os alunos até ao 9º por decisão do actual
ME. Acresce que em muitas circunstâncias, muitos alunos têm ainda Trabalhos
Para Casa que, nas mais das vezes, são a continuação ou a réplica de trabalhos
escolares, ou seja mais do mesmo.
Não tenho nenhuma posição
fundamentalista, insisto, mas creio que deve distinguir-se com clareza o
Trabalho Para Casa e o Trabalho Em Casa. O TPC é trabalho da escola feito em casa,
o trabalho em casa será o que as crianças podem fazer em casa que, não sendo
tarefas de natureza escolar, pode ser um bom contributo para as aprendizagens
dos miúdos. O que acontece mais frequentemente é termos Trabalhos Para Casa e
não Trabalho Em Casa.
Os TPCs clássicos têm ainda o
problema de colocar com frequência os pais em situações embaraçosas, querem
ajudar os filhos mas não possuem habilitações para tal.
A propósito, numa reunião de pais
em que participava e se discutia esta questão, dizia uma mãe, “o senhor, da
maneira que fala, se calhar é capaz de ajudar o seu filho, mas na minha casa,
chora a minha filha e choro eu, ela porque quer ajuda, eu porque não sou capaz
de lha dar.” Colocar os pais nesta posição parece-me inaceitável.
Torna-se, pois, necessário que
professores e escolas se entendam sobre esta matéria, diferenciando trabalho de
casa, igual ao da escola, de trabalho em casa, trabalho em que qualquer pai
pode, deve, envolver-se e é útil ao trabalho que se realiza na escola.
Tudo isto considerado. o recurso
ao TPC deveria avaliar se o aluno, cada aluno, tem capacidade e competência
para o realizar autonomamente, por exemplo, o treino de competências
adquiridas. Na verdade, porque milagre ou mistério, uma criança que tem
dificuldade em realizar os seus trabalhos na sala de aula, onde poderá ter
apoio de professores e colegas, será capaz de os realizar sozinha em casa? Naturalmente
tal só acontecerá com a ajuda dos pais ou, eventualmente, de
"explicadores" a que muitas famílias, sabemos quais, não conseguem
aceder.
No entanto, do meu ponto de
vista, sobretudo nas idades mais baixas, o bom trabalho na escola deveria
dispensar o TPC. É uma questão de saúde e qualidade de vida.
Parece ainda de sublinhar que os
estudos sugerem que "é sobretudo a qualidade das aulas, mais do que o
tempo global de aprendizagem que está associado ao sucesso na aprendizagem.
Aliás, no citado relatório da OCDE também se conclui que não há uma relação
significativa entre o número médio de horas gastas nos TPCs e os resultados
escolares.
Retomando a questão em aberto
pelo Público dos TPC nas férias da Páscoa algo que já afirmei também numa colaboração
com a imprensa, as férias devem ser isso mesmo, férias sem as mesmas rotinas e
os mesmos trabalhos do tempo escolar.
Actividades como leitura, por
exemplo, não é um TPC, um dever a cumprir, é algo que se deve incentivar. A leitura
é só um exemplo.
Andaríamos melhor se reflectíssemos sem preconceitos e juízos fechados sobre questões desta natureza.
PODERÍAMOS VIVER SEM O "ESQUEMA" MAS ... NÃO ERA A MESMA COISA
O mais inquietante é que casos
como o que hoje se divulga na Câmara de Oeiras já não nos conseguem surpreender.
Estes comportamentos fazem parte do habitual funcionamento da nossa comunidade.
De facto, nos mais variados
sectores o recurso à “borla”, ao “jeitinho”, ao “eh pá um gajo tem que se
safar”, um “favorzinho”, uma “palavrinha” que facilita o negócio ou o
procedimento, etc., etc., são uma constante.
É uma questão de escala.
Do BPN/SLN ao BPP e ao BES, dos
gestores e do mau uso de dinheiros públicos, das PPPs ruinosas para os
contribuintes e uma mina para o investimento privado, das negociatas e tráfico
de influências e amiguismo, do enriquecimento sem justificação, do ex-Primeiro-ministro
que não sabia que deveria fazer descontos para a Segurança Social e envolvido
em manhosas tecnoformices com a ajuda de “Dr.” da “mula ruça”, do
ex-Primeiro-ministro acusado de corrupção, do cartel presente em várias áreas,
dos jobs for “the boys and girls” com o cartão certo, da falsa baixa médica,
enfim, de tudo o que lamentavelmente conhecemos se conclui que é apenas umas
questão de escala, entre os cêntimos e os milhões, muitos milhões.
Trata-se, pois, de um comportamento
generalizado e com o qual, do meu ponto de vista, parecemos ter uma relação
ambivalente, uma retórica de condenação, uma pontinha de inveja dos dividendos
que se conseguem e a tentação quotidiana de receber ou providenciar uma
"atençãozinha" ou pedir ou dar um jeito, sempre
“desinteressadamente", é claro.
Por outro lado, também não
acreditamos que exista verdadeira vontade política de combater algumas das
dimensões mais pesadas, por assim dizer, deste universo. Veja-se, por exemplo,
o que tem sido na Assembleia da República a narrativa no sentido de legislar
sobre o enriquecimento ilícito.
A teia de interesses que ao longo
de décadas se construiu envolvendo o poder político, a administração pública,
central e autárquica, o poder económico, o poder cultural, a área da justiça e
segurança, parte substantiva da comunicação social e muito do nosso
funcionamento quotidiano, dificulta seriamente um combate eficaz e mudança
cultural nesta matéria.
Este combate passará,
naturalmente, por meios e legislação adequada, mas passa sobretudo pela
formação cívica que promova uma outra cidadania.
Acontece que, também por aqui não
vai ser fácil, a formação cívica desapareceu dos conteúdos curriculares
obrigatórios. Já não precisamos, entenderam na 5 de Outubro, temos formação
cívica que chegue.
Certamente que poderíamos viver
sem o “esquema”, mas não era a mesma coisa.
DO TERRORISMO
A barbaridade agora acontecida em
Bruxelas, tal como a que aconteceu em Paris, tal como a tragédia que envolveu o
Charlie Hebdo e tantos outros episódios boa parte dos quais menos mediatizados,
passam-se mais longe, são analisados quase sempre num pressuposto de motivação
fanática, bárbara, enquadrada por valores de natureza religiosa aliados ao
cortejo de horrores que o chamado Estado Islâmico vem mostrando na imprensa
mundial.
Neste aspecto queria ainda chamar
a atenção para a atracção que este tipo de iniciativas ou ideias têm produzido em
alguns milhares de jovens europeus, designadamente franceses e belgas, mas de
variadas nacionalidades incluindo portugueses, que aderem a este tipo de
actuação.
A minha questão é que, não
desvalorizando, antes pelo contrário, o papel da forma como as crenças
religiosas são vividas, estas barbaridades, de que os acontecimentos de Bruxelas
e Paris são mais um exemplo extremo, também importa reflectir no
contexto, nos contextos, que levam muitos jovens, muitos deles com educação
europeia a envolverem-se em acções de uma gravidade que ultrapassam a nossa
capacidade de compreensão racional.
O meu ponto, discutível evidentemente,
é que o se passa neste universo já não tem a ver com religião. Aliás, a
insistência nesta visão contribui para alimentar um enorme e perigosíssimo
barril de pólvora, reparemos em alguns discursos e acontecimentos que se têm
sucedido.
Deixem-me recordar-vos apenas
alguns episódios mais próximo e também trágicos. Temos tido recentes episódios
de tiroteios em escolas americanas com muitas crianças mortas ou a tragédia de
Oslo, um indivíduo, jovem, aparentemente discreto, matou friamente umas dezenas
de jovens participantes num encontro partidário. Na altura, para além do
sentimento de dor e perda, creio que perplexidade terá sido o que melhor
caracterizou a sociedade norueguesa, aliás, patente nos testemunhos ouvidos na
imprensa. Porquê? Porquê na Noruega, comunidade aberta, tolerante e segura?
Porquê um norueguês e não um terrorista associado a redes conhecidas? Porquê?
Porquê? As mesmas perguntas colocadas quase sempre que se verificam estas
tragédias, porquê tanto mal, tanta crueldade?
A dificuldade de responder a
estas questões é da mesma ordem da dificuldade de encontrar meios seguros de
evitar tragédias deste tipo. Episódios desta gravidade,frequentemente
executados por um pequeno grupo de indivíduos a viver numa sociedade aberta é,
de facto, muito difícil de prevenir.
Lembram-se também dos distúrbios
graves ocorridos 2011 em Inglaterra protagonizados fundamentalmente por jovens,
que também deixou a sociedade surpreendida e sem saber muito bem como reagir ou
intervir perante o envolvimento de crianças e adolescentes em comportamentos
surpreendentes pelo grau de destruição e pela ausência de controlo.
Também em França, antes destas
tragédias recentes têm ocorrido episódios de extrema violência num dos quais,
há algum tempo, um jovem de 24 anos executou várias pessoas, algumas das quais
crianças.
Em Portugal têm ocorrido vários
casos de violência extrema envolvendo jovens levando-nos questionar os nossos
valores, códigos e leis pela perplexidade que nos causam.
Todos estes episódios têm como
característica comum a juventude genérica dos autores. Os comportamentos
observados assemelham-se, grotesca e horrorosamente, a um videojogo violento
com personagens reais.
A questão que me leva a estas
notas é mais no sentido de tentarmos perceber um processo que designo como
"incubação do mal" que se instala nas pessoas, por vezes ainda antes
da adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar
relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente, começam
interiormente a ganhar contornos que identificam os alvos, por vezes difusos,
sentidos, percebidos ou induzidos com os causadores desse mal-estar. A religião
aqui pode aparecer como o "grupo" que acolhe e onde se partilha esse
mal-estar. Não é causa nem é efeito, é "apenas" circunstância.
A fase seguinte pode passar por
duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva,
possa drenar esse mal-estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra
via, aumenta exponencialmente o risco de um pico que pode ser um tiroteio numa
escola, a bomba ou o atentado mortífero meticulosamente e obsessivamente
preparado dirigido ao "representante do mal" ou a vinda para a rua
numa espiral de violência cheia de "adrenalina", em nome de coisa
nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.
Por mais policiada que seja uma
sociedade é extraordinariamente difícil prevenir processos desta natureza em
que o mal se vai incubando e em que as ferramentas de acção são acessíveis.
Provavelmente, a questão não é abdicar da abertura e da tolerância que
caracteriza a nossa sociedade elevando o policiamento das comunidades a níveis
asfixiantes. A questão, este tipo de questões, a iniciativa individual de
natureza terrorista, ou os movimentos grupais descontrolados e reactivos,
passará sobretudo por uma permanente atenção às pessoas, ao seu bem-estar,
tentando detectar, tanto quanto possível, sinais que indiciem o risco de
enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como
acaba.
Importa ainda estratégias mais
proactivas e eficientes de minimizar a guetização e "quase total"
desocupação de, em Portugal, centenas de milhares de elementos da geração
"nem, nem" nem estuda, nem trabalha. Para esta gente, o futuro passa
por onde, por quem e porquê?
Na Bélgica, França, Noruega, na
Inglaterra, nos Estados Unidos, ou em Portugal.
Dada disto branqueia ou contradiz
uma dimensão essencial, a mediocridade e falta de visão das lideranças
políticas, o peso dos negócios e a deriva dos interesses políticos regionais e
mundiais de que tudo isto se alimenta.
segunda-feira, 21 de março de 2016
OS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS
Estado chinês ganha quase €400 mil por dia na EDP
Muitos dos negócios que no âmbito
das privatizações vamos conhecendo sempre me recordam uma afirmação muito
interessante de Nuno Brederode dos Santos numa crónica antiga no Expresso, “Os
Negócios Estrangeiros em Portugal raramente são bons negócios mas, quando o
são, então são, de facto, estrangeiros”.
Será destino?
Não, não é destino, é o resultado
de políticas intencionais, assumidas, viradas para interesses que não o bem
comum.
Este discurso não é contra uma
visão global do mundo mas contra uma visão que vende ao desbarato, com meandros
pouco transparentes e em condições pouco favoráveis aos interesses nacionais.
Tudo com o maior despudor.
Tudo com o maior despudor.
O CAMINHO
A SAÚDE MENTAL DOS PORTUGUESES REVISTA EM BAIXA
A imprensa de hoje divulga um
conjunto destes estudos desenvolvidos pela Universidade Coimbra dos quais
releva um aumento da procura das consultas de psiquiatria e o aumento de alguns
quadros de problemas, designadamente, a referência à intenção de cometer
suicídio, entre outros aspectos. Os estudos estabelecem também alguma associação entre este aumento e
a degradação das condições de vida das famílias pois foram os grupos sociais
mais atingidos os que justamente mais procuraram apoio.
Nada de surpreendente, é
reconhecida alta prevalência de problemas de saúde mental e ainda mais evidente
o fortíssimo consumo de psicofármacos por parte dos portugueses.
Recordo que o Relatório Portugal
– Saúde Mental em Números 2014, na linha dos dados dos últimos anos, evidenciava
o peso fortíssimo que as patologias no âmbito da saúde mental têm no âmbito da
designada carga global de doença.
Estima-se que as perturbações do
foro psiquiátrico afectem mais de um quinto dos portugueses, 22.9%, umas das
taxas mais altas da Europa. O Relatório sublinha a inexistência de respostas
ajustadas, equipas comunitárias de saúde mental por exemplo, o que potencia o
recurso aos fármacos mesmo em situações não recomendáveis clinicamente. Este
recurso excessivo à medicação torna-nos num dos maiores consumidores de
psicofármacos com custo económicos brutais.
A propósito recordo que de acordo
com o relatório "Portugal Saúde Mental em Números 2013", só 16,2% das
pessoas com perturbações mentais ligeiras e 33,8% das que sofrem de
perturbações moderadas recebem tratamento em Portugal.
São também referidas no Relatório
ade 2014 as dificuldades de resposta em saúde mental para crianças e
adolescentes levando, por exemplo, a que em muitas situações os internamentos
neste grupo etário ocorram em serviços vocacionados para adultos algo que,
evidentemente, não deveria acontecer.
Num cenário de retracção dos
investimentos nas políticas de saúde que tantas vezes referi no Atenta
Inquietude, a experiência tem mostrado que a doença mental é, nas mais das
vezes, um parente pobre no universo das políticas de saúde.
Quando a pobreza das pessoas
aumenta e a pobreza dos meios e recursos também aumenta, o quadro é ainda mais
grave.
domingo, 20 de março de 2016
DA INDÚSTRIA DOS EXAMES
Nos últimos anos era habitual
verificar-se durante as férias da Páscoa o recurso significativo aos centros de
explicações visando a “recuperação” para o terceiro período e, sobretudo, a
preparação para os exames.
Um dos efeitos colaterais da
deriva do ME relativa à avaliação externa será certamente o abaixamento da
procura destes apoios, a indústria dos exames, um interessante nicho de mercado
nos últimos anos. Há algumas semanas, logo depois do anúncio do fim dos exames
de 4º e 6º ano o DN noticiava a diminuição da procura.
Seria desejável que, para além do
cenário desenhado relativamente à avaliação externa e à sua imprescindível
estabilização, a baixa da procura das explicações externas decorresse do facto
dos alunos encontrarem nas escolas e no tempo que lá passam os “apoios”, as “explicações”
de que necessitam, os que necessitam.
Recordo o recente estudo do CNE e
da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do CNE que evidenciava que nove em
cada dez alunos com insucesso escolar são de famílias pobres.
A ajuda externa ao estudo e como
ferramenta promotora do sucesso não está ao alcance de toda a gente pelo que é
fundamental que as escolas possam dispor dos dispositivos de apoio suficientes
e qualificados para que se possa garantir, tanto quanto possível, a equidade de
oportunidades e a protecção dos direitos dos miúdos, de todos os miúdos.
A substituição dos exames pelas
provas de aferição não altera esta necessidade imperiosa, antes pelo contrário,
torna-a ainda mais pertinente para que se possam corrigir e apoiar ao longo dos
vários ciclos as dificuldades de alunos e professores.
O abaixamento verificado na
procura talvez traduza a menor importância atribuída pelas famílias às provas
de aferição (que se realizarão este ano conforma decisão das escolas) e às suas
próprias dificuldades económicas.
As necessidades dos alunos
poderiam ser atenuadas com o recurso a professores que já estão no quadro ou
com contratos sucessivos, com prática avaliada e que continuam fora da
carreira.
De uma vez por todas, é necessário
contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa há
investimento.
NOTA BIOGRÁFICA
No Observador encontra-se um
trabalho elucidativo do mudo pouco conhecido do emprego nos “call centers”. As
condições de trabalho e a indignidade no tratamento das pessoas que vão
sendo conhecidas serão um exemplo bem claro do que alguns entendem como “flexibilização”
das relações de trabalho, “competitividade” e “produtividade”. Mostram o quanto para alguma gente as pessoas são activos descartáveis
Confesso que o que o que se vai
conhecendo do mundo do trabalho nos “call centers”o conhecimento deste mundo me
tem levado a ter uma atitude diferente, mais paciente e tranquila com quem me
aparece do outro lado da linha em múltiplas circunstâncias. Algumas vezes
invento uma paciência e tolerância que não me apetecem.
A este propósito um texto antigo.
Nome: Um Número
Idade: 32
Habilitações Académicas: Licenciatura em Gestão Integrada de
Contextos Profissionais; Pós-graduação em Promoção de Oportunidades
Morada: Casa dos pais
Profissão: Procurador de emprego
Experiência profissional: Funcionário de Call-center em variados
contextos de operação; Experiência de Empregado de Balcão em grandes
superfícies comerciais
Competências adquiridas: Elaboração diversificada de currículos;
Ocupação criativa dos tempos de espera
em filas do Centro de Emprego; Preparação de entrevistas de emprego; Técnicas
de sobrevivência e adaptação a contextos profissionais de exploração e sem
dignidade; técnicas de sobrevivência económica
Projecto a curto prazo: Encontrar alguma forma de subsistência que
não a generosidade familiar
Projecto a médio prazo: Um trabalho na área de qualificação
Projecto a longo prazo: A dignidade de uma vida decente
Projecto quase perdido: Esperança
CRIANÇAS DESAPARECIDAS. ALGUMAS ESTÃO À VISTA
Durante o ano passado foram
comunicados à Polícia Judiciária 1611 desaparecimento de menores, cerca de
quatro por dia.
Felizmente a grande maioria
destes adolescentes são encontrados ou regressam nas 24 ou 48 horas seguintes.
Boa parte destes desaparecimentos está associada a incidentes pessoais ou a
resultados escolares. Merece ainda registo o número elevado de crianças
desaparecidas através do rapto parental em contexto de separações familiares
com algo grau de litígio e que, evidentemente, implicam enorme sofrimento para
todos os envolvidos, em particular para os mais vulneráveis, as crianças.
No entanto, lamentavelmente, nem
sempre os processos terminam com final feliz. Recordemos as tragédias mais
mediatizadas que envolveram o Rui Pedro desaparecido há 16 anos em Lousada no
norte de Portugal e a Maddie McCann em 2007 no Algarve, dos quais nada se sabe
sobre o que lhes terá acontecido.
De há uns anos para cá tem sido
feito um esforço nacional e internacional no sentido de aumentar a eficácia na
abordagem a situações desta natureza bem como dedicar maior atenção aos
factores de risco de que a título de exemplo se citam as redes sociais, que não
podendo, obviamente, ser diabolizadas, apresentam alguns riscos que não devem
ser negligenciados.
Situações como as do Rui Pedro ou
da Maddie McCann são absolutamente devastadoras numa família. Nós pais, não
estamos "programados" para sobreviver aos nossos filhos, é quase
"contra-natura". Se a este cenário acresce a ausência física de um
corpo que, por um lado, testemunhe a tragédia da morte mas, simultaneamente,
permita o desenvolvimento de um processo de luto, a elaboração da perda como
referem os especialistas, que, tanto quanto possível, sustente alguma reparação
e equilíbrio psicológico e afectivo na vida familiar, a situação é de uma
violência inimaginável.
No entanto, neste contexto creio que vale a pena não esquecer a existência de muitas crianças que estão
desaparecidas mas que, por estranho que possa parecer, estão à vista, situações
que por desatenção e menos carga dramática passam mais despercebidas.
Na verdade, existem muitíssimas
crianças e jovens que vivem à beira de pais e professores para os quais passam
completamente despercebidas, são as que eu designo por crianças transparentes,
olhamos para elas, através delas, como se não existissem. Não estando
desaparecidas, estão abandonadas. Algumas delas não possuem ferramentas
interiores para lidar com tal abandono e desaparecem, mantendo-se à nossa
vista, no primeiro buraco que a vida lhes proporcionar, um ecrã, outros
companheiros tão abandonados quanto eles, o consumo de algo que lhes faça
companhia ou a adrenalina de quem nada tem para perder.
Em boa parte das situações, por
estes ninguém procura.
E alguns, por vezes, também se
perdem de vez.
sábado, 19 de março de 2016
A ESCOLA FAZ, PODE FAZER, A DIFERENÇA
Contra todas as probabilidades, uma escola no lugar mais isolado da Madeira teve a melhor média entre os estabelecimentos públicos no exame nacional de 9.º ano. Tem 300 alunos, não tem campainha, nem trabalhos de casa e os horários das aulas batem certo com os do autocarro.
É bom ler uma notícia positiva no
universo da educação. Não é que não existam muitas matérias ou experiências que
as possam inspirar. Creio que nos falta um pouco a “cultura" de valorizar e
divulgar o que corre bem. Embora se compreenda estamos quase sempre mais
direccionados para os muitos problemas e dificuldades sempre presentes no
complexo universo da educação.
Vem esta introdução a propósito
do trabalho do Público sobre a Escola Básica 123 do Curral das Freiras. Serve a
freguesia mais pobre da Madeira e em 2015 os seus alunos conseguiram a terceira
melhor média nacional no exame de Português do 9.º ano, correspondente a melhor
escola pública. Em Matemática, os resultados também foram muito bons com a
colocação em 12.º lugar do ranking entre as escolas públicas e integrando 100
melhores no ranking global.
Algumas notas breves
A associação entre os resultados
escolares dos alunos e variáveis de natureza sociodemográfica como meio social,
económico e cultural, circunstâncias de vida, estilos parentais, etc. etc.,
está estabelecida de há muito.
No entanto, também sabemos que a
escola faz, pode fazer a diferença, ou seja, o trabalho na e da escola e dos
professores é um factor significativamente explicativo do sucesso dos alunos
mais vulneráveis e capaz de contrariar o peso das outras variáveis que estão
presentes nesses alunos. Neste contexto torna-se ainda mais relevante o
trabalho realizado por alunos, professores, pais, funcionários e técnicos na
Escola Básica 123 do Curral das Freiras.
O trabalho na escola envolvendo
organização, clima e liderança por exemplo e, finalmente o trabalho em sala de
aula em que surge a diferença produzida pelo professor, pelos professores.
Quando abordo estas questões cito
com frequência uma afirmação de 2000 do Council for Exceptional Children,
"O factor individual mais contributivo para a qualidade da educação é a
existência de um professor qualificado e empenhado".
No entanto a existência de
professores qualificados e empenhados não depende só de variáveis individuais de
cada docente, decorre também de um conjunto de políticas educativas que
promovam a qualificação, a motivação e a valorização a diferentes níveis do
trabalho dos professores.
De políticas educativas que em
termos genéricos e em termos mais particulares como currículos, sistema de
organização, recursos humanos docentes, técnico e funcionários, tipologia e
efectivo de escolas e turmas, autonomia das escolas são apenas alguns exemplos
de como a diferença tem que ser construída também antes de chegar à sala de
aula.
E nesta matéria também temos
muito trabalho para realizar.
UMAS NOTAS NA VISÃO SOBRE A QUALIDADE DO SONO EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Umas notas na Visão sobre a importância da qualidade do sono na vida de crianças e adolescentes. É claro que toda a gente reconhece essa importância.
No entanto, é também verdade que um número excessivo de crianças e adolescentes não dorme o tempo adequado à sua idade com evidentes reflexos no bem-estar geral, nos comportamentos e, sem surpresa, no rendimento escolar.
CONVERSAS POR FAZER
Hoje e sempre. Não é possível deixar
de recordar um Homem Bom que já partiu há muito. Não partiu sem me mostrar o
que nunca viu e me levar onde nunca tinha ido.
Um dia destas haveremos de acabar
todas as conversas que não acabámos.
Um dia destes haveremos de
começar todas as conversas que não iniciámos.
Vou contar-te tanta coisa que
aconteceu e acontece que vais gostar de saber. É verdade que de algumas não vais gostar mas são assim as coisas do mundo.
Até um dia destes, Pai.
sexta-feira, 18 de março de 2016
DA EDUCAÇÃO RELIGIOSA. E A FORMAÇÃO CÍVICA?
O JN coloca noticia com chamada a
primeira página o facto de em escolas públicas se realizarem em horário lectivo
cerimónias religiosas. Os alunos que não participam ficam numa sala a “passar tempo”.
Nada de surpreendente, sabemos
que assim é. Talvez seja de recordar que em matéria de religião e ensino, o Art.º
43ª da Constituição, no ponto 3 dispõe, "O ensino público não será
confessional".
No entanto, a Concordata em vigor
com o Vaticano estabelece que é dever do Estado Português garantir “as
condições necessários para assegurar, nos termos do direito português, o ensino
da moral e religião católicas nos estabelecimentos de ensino público não
superior, sem qualquer forma de discriminação”.
Assim, no cenário actual temos a
oferta obrigatória nas escolas portuguesas da disciplina de Educação Moral e
Religiosa Católica assegurada por professores pagos pelo Estado e com carreira
integrada. A oferta de disciplinas de outras confissões religiosas é possível
mas a expensas próprias e com professores fora do sistema.
Parece claro que esta situação
viola, por um lado o princípio constitucional do ensino "não
confessional" tal como a celebração das missas e, por outro lado, um
princípio de equidade face à também consignada constitucionalmente liberdade
religiosa.
Podemos discorrer longamente
sobre a justificação para que este quadro permaneça com estes contornos, no
entanto, não é esse o meu ponto.
Sou dos que continua a entender
que a educação deve integrar imprescindivelmente uma dimensão de formação
pessoal, ética e cívica.
Como muitas vezes afirmo, se tal
não acontecer temos "apenas" ensino de um conjunto de saberes
instrumentais que sendo importante não pode ser, não deve ser, o
"tudo" da educação.
Acontece que o mesmo Estado que
tem assumido os custos da permanência da oferta obrigatória da disciplina de
Educação Moral e Religiosa Católica, de frequência facultativa e aceita a
celebração de missas, é o mesmo Estado que erradicou a Formação Cívica para
todos os alunos dos conteúdos curriculares do ensino básico assumindo uma visão
redutora e perigosa do que é educação e entende por bem expurgar os currículos
de tudo o que não se considere “estruturante” ou “essencial”.
Esta é, do meu ponto de vista, a
questão central.
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