domingo, 31 de janeiro de 2016

MAS AS CRIANÇAS SENHORES

Faltam as palavras para falar do horror e da barbaridade que no mar e em terra vai acontecendo cada vez mais perto de nós, que, provavelmente, acreditávamos estar a salvo de tamanhas tragédias.
A merda de lideranças actuais da generalidade dos países que põem e dispõem no xadrez do poder mundial e de tantos outros subservientes e submissos que, em muitos casos, de pessoas não sabe nem quer saber, permite, sem um sobressalto e com palavras que de inócuas são um insulto, que se assista à barbaridade que as imagens, os relatos mostram e o muito que se imagina mas não se vê.
Sem estranheza, sempre assim foi, sempre assim é, as crianças são sempre os mais vulneráveis dos mais vulneráveis mas, como sempre, apesar dos sobressaltos ao sabor da espuma dos dias e dos efeitos mediáticos que incluem as lágrimas de crocodilo, a hipocrisia e o despudor, nada acontece.
Apesar da complexidade é evidente para toda a gente com um pouco de senso que nada disto se resolve com muros ou vedações, manipulando emoções e interesses de circunstância ou combatendo alguns e depois apoiar esses alguns ao sabor dos movimentos da luta pelo poder
Crescem muros, a barbaridade estende-se, o horror é imenso e, por vezes, nem a retórica da condenação é convincente e muitos menos, evidentemente, eficaz.
A questão é séria, os ventos sempre semeiam tempestades e as tempestades num mundo global não ficam confinadas nos epicentros.
Não existe terror mau e terror bom. Não existe horror mau e horror bom. Não existe terrorismo bom e terrorismo mau.
Como é possível que tal horror aconteça e tanta gente com responsabilidades assobie para o ar e se fique pelas palavras de circunstância.
Estou a lembrar-me de Rafael Alberti e o seu "Nocturno".
(...)
Las palabras entonces no sirven, son palabras...
Siento esta noche heridas de muerte las palabras.

POLÍTICA? NÃO ME METO E NÃO QUERO SABER

No Público de hoje surge uma peça interessante sobre a falta de mobilização do eleitorado jovem para a participação nas eleições traduzindo-se em elevados níveis de abstenção superiores aos de outros escalões etários que também já são elevados. Algumas notas.
Do meu ponto de vista existe uma questão central. Como muitas vezes tenho referido, o modelo e cultura política instalados há décadas na nossa comunidade, a partidocracia, fomentam, explicita ou implicitamente, o afastamento de grande parte dos cidadãos da participação cívica activa pois, basicamente, ela corre por dentro ou sob tutela dos aparelhos partidários. Aliás, os níveis crescentes e muito altos da abstenção em sucessivas eleições espelham isso mesmo.
Tal cenário alimenta um significativo e comprovado desinteresse dos jovens, mas não só, pela coisa pública e pelo envolvimento activo. Creio também que o grau de qualificação que as gerações mais recentes atingem é relevante nesta atitude crítica ou desinteressada. A participação dos jovens na coisa política tem sido conformada, quase que exclusivamente, às juventudes partidárias, que servem, com excessiva frequência de trampolim para os lugares políticos. Entre as várias lideranças partidárias actuais e recentes temos inúmeros exemplos deste “alpinismo”.
Lembrar-se-ão que há algum tempo, o Dr. Fernando Negrão, figura de relevo no PSD defendia que os adolescentes do 3º ciclo "não deveriam ter contacto com a Constituição". Elucidativo.
Por outro lado, esse desinteresse pela participação cívica, alinhada nos aparelhos, alia-se a um outro entendimento de consequências extremamente importantes, a falta de esperança e confiança em que as coisas possam tornar-se diferentes, ou seja, isto não muda, não adianta.
Talvez a antecipação da idade para votar possa ser um caminho para alterar.
A questão não está na agenda. No entanto recordo que o BE tinha no seu programa eleitoral o direito ao voto a partir dos 16 anos. Creio, não tenho informação actualizada, que o voto sem restrições a partir dos 16 anos apenas se verifica na Áustria, registando-se menor abstenção que no escalão 18-20 anos, o que sugere o interesse dos mais jovens pela participação cívica.
Na verdade, em Portugal e aos 16 anos, as pessoas têm a possibilidade legal de casar, trabalhar ou serem responsabilizados criminalmente. Porque não a acessibilidade ao voto?
Dizem alguns que estes adolescentes não terão maturidade para o uso "responsável" do voto. Provavelmente, algumas das pessoas que entendem que as pessoas com 16 anos não têm maturidade, ficarão indiferentes ao espectáculo indecorosos de "manipulação" e "compra" dos votos a que assistimos em todos as campanhas eleitorais, que envolvem desde as ofertas, os passeios, as promessas que não se vão cumprir, até às recompensas com lugares aos mais empenhados e melhor colocados nos aparelhos. Parece-me fraco o argumento se considerarmos o que socialmente e pessoalmente as pessoas com 16 anos são capazes e como tal consideradas pela comunidade e pela lei, relembro, capazes de casar e trabalhar, por exemplo.
Deve, no entanto, registar-se que nos últimos tempos parece estar a emergir alguma motivação para a acção cívica mas, significativamente, fora da tutela partidária. São exemplos deste caminho várias manifestações envolvendo movimentos como "Que se lixe a Troika"; "Movimento dos Indignados" ou "Precários Inflexíveis" em que a participação de jovens parece importante.
Gente mais nova, pode trazer comportamentos e ideias mais novas.

NOTÍCIAS DA CATALUNHA


Gostei de ler a entrevista de Pepe Menéndez, director-adjunto da Fundació Jesuïtes Educació da Catalunha, ao DN.
Como é sabido os Jesuítas estão a realizar uma profunda mudança no seu sistema de ensino na Catalunha. Vale a pena ler e reflectir sobre a entrevista não necessariamente para replicar “receitas” mas ponderar caminhos e opções.

sábado, 30 de janeiro de 2016

DA "BATOTICE"

As escolas estão a tornar-se "desonestas" e "batoteiras", acusa psicólogo

Será que a "batotice" e a "desonestidade" são "só" das escolas? Tanta gente a falar do que não sabe.
Nada de estranho, estamos todos habituados a que se entenda a educação como matéria de opinião e não matéria de conhecimento e experiência.

A DIGNIDADE

A dignidade é o amparo de um Homem. A dignidade está em amar e ser amado. A dignidade está em fazer e ser reconhecido. A dignidade está em ser e poder ser. A dignidade está em viver, não em sobreviver. A dignidade está em ajudar e ser ajudado. A dignidade está no direito, não no privilégio.
Quando nos retiram a dignidade ficamos desamparados. É grande, é enorme, a quantidade de gente desamparada.

HÁ VIDA PARA ALÉM DA AVALIAÇÃO

A discussão sobre a avaliação no ensino básico e as alterações introduzidas pelo ME. continuam na agenda como foi o caso de ontem em Conferência organizada pelo IAVE.
Não vou repetir tudo o que já escrevi sobre isso sempre na defesa da importância da avaliação externa através de provas de aferição no 1º ciclo e, eventualmente, com exames a partir do segundo
O que ainda quero sublinhar a propósito desta questão é que sendo fundamental a preocupação com os resultados e a sua avaliação, em educação os resultados só se alteram com a intervenção nos processos sendo então importante avaliar o impacto dessa intervenção medindo/avaliando os resultados. Assim, insisto na necessidade de definir de forma adequada e com os recursos necessários apoios para as dificuldades experimentadas por alunos e professores ao longo de todo o ciclo, nos vários ciclos, e disponibilizados em tempo oportuno.
É assim que os melhores sistemas educativos que não têm exames tão cedo estão organizados. Este entendimento não tem rigorosamente a ver com facilitismo pois não consta que esses países tenham sistemas educativos “facilitistas” apesar de não terem exames tão precoces e nos anos de exame apresentarem taxas de retenção muito baixas.
Parece-me ainda de considerar outro conjunto de variáveis com forte impacto nos processos sobretudo se considerarmos as especificidades dos nossos territórios educativos. Refiro, por exemplo, o impacto que turmas sobredimensionadas, metas curriculares excessivas e burocratizadas que inibem a acomodação das diferenças entre os alunos, insuficiência de apoios às dificuldades de alunos e professores durante todos os anos do ciclo, falta de verdadeira autonomia das escolas, entre outros aspectos, podem assumir na qualidade dos processo e, naturalmente, nos resultados.
Parece também necessário que se lance uma reflexão sobre a questão, difícil mas necessária, das metas curriculares e na lógica do entendimento integrado do Ensino Básico, creio que é de repensar a organização do Ensino Básico no que respeita ao número de ciclos e organização das áreas disciplinares.
É claro que se trata de um universo complexo com repercussões em várias dimensões, incluindo na carreira e formação de professores e, por isso mesmo, a reflexão e eventuais mudanças, devem ser realizada com competência, serenidade, tempo e envolvimento participado de toda a comunidade.
Como há dias escrevi, depressa e bem não há quem, e o ME deve resistir à tentação habitual de “alterar” para deixar a sua marca e responder a agendas imediatas ou de outra natureza.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

DA VIOLÊNCIA EM CONTEXTO ESCOLAR

A imprensa de hoje refere dois episódios de alegada violência em contexto escolar. De um terá resultado a morte de uma aluna e do outro um ferimento ligeiro produzido por uma faca.
A questão da violência em contexto escolar, envolvendo só alunos ou alunos, funcionários e professores é importante e deve estar sempre na agenda.
Não sou, longe disso, dos que entendem que as escolas são um inferno, não são e acho que podemos e devemos confiar na escola pública apesar dos maus-tratos que tem sofrido. No entanto, também sei que episódios desta natureza são mais frequentes do que desejaríamos.
Algumas notas repescadas sobre esta matéria, suficientemente complexa para que sejam tantas as dúvidas quantas as certezas, muitas.
Sabemos de há muito que a escola foi, é, será sempre, um reflexo do contexto económico, social e cultural, bem como do sistema de valores em que se integra. Neste quadro, em tempos de violência, a escola espelha essa violência, em tempos de sentimento de insegurança, a escola espelha essa insegurança, em tempos de sentimento de impunidade, a escola espelha esse sentimento de impunidade. Por tudo isto não é possível, como alguns discursos o fazem, responsabilizar exclusivamente a escola, por estas situações. A escola fará certamente parte da solução mas não é, não pode ser, A solução, esta passará por intervenções concertadas no âmbito das comunidades.
Políticas públicas que não defendam a qualidade e o investimento na escola pública promovendo cortes excessivos de docentes, técnicos e funcionários têm necessariamente implicações.
Um segundo aspecto prende-se com o trabalho com as famílias. Muitos casos de violência escolar estão associados, não estou a falar de uma relação de causa-efeito, à acção negligente ou menos competente por parte das famílias. Continuo fortemente convicto de que nas escolas devem ser criados dispositivos, com recursos, humanos e de tempo por exemplo, para trabalho sistemático e estruturado com as famílias. Com as metodologias mais frequentes, reuniões de pais e convocatória para famílias problemáticas irem à escola, que se revelam ineficazes, a maioria dos pais nem sequer aparece, creio que será muito difícil alterar ou, pelo menos, minimizar os efeitos das variáveis familiares nos comportamentos dos miúdos.
Uma outra questão ainda dentro da instituição escola, prende-se com o facto conhecido de que os problemas mais significativos sentidos nas escolas, indisciplina, violência, delinquência, bullying, etc. ocorrem, obviamente, nas salas de aula e, sobretudo nos espaços de recreio. Deixando de lado, de momento, a sala de aula parece-me fundamental que se dê atenção educativa aos tempos e espaços de recreio escolar.
Em muitas escolas a insuficiência de pessoal auxiliar não permite a ajustada supervisão desses espaços. Por outro lado, a sua formação em matérias como supervisão educativa e mediação de conflitos, por exemplo, e, ou, o entendimento que têm das suas competências, muitas não valorizadas pela própria comunidade, leva a alguma negligência ou receio de intervenção.
Talvez não seja muito popular mas digo de há muito que os recreios escolares são dos mais importantes espaços educativos, aliás, muitas das nossas memórias da escola, boas e más, passam pelos recreios. Neste sentido, defendo que a supervisão dos intervalos deveria ser da responsabilidade de docentes. A reestrutura da enorme carga burocrática do trabalho dos professores, dos modelos de organização e funcionamento das escolas, por exemplo, poderiam libertar horas de docentes para esta supervisão que me parece desejável.
Continua a ser verdade que a prevenção é aforma mais eficaz de lidar com estes fenómenos. A prevenção implica custos e recursos que a não existirem sairão bem mais caros pelas consequências.
É uma questão de opção política. Em educação não há despesa, há investimento.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

DAR VISIBILIDADE AO QUE PARECE TRANSPARENTE

Pela primeira vez, a Lego vai ter um boneco numa cadeira de rodas

Nada do que queremos ou achamos que é preciso mudar muda à velocidade que desejaríamos. Assim sendo, as mudanças mesmo pequenas e, às vezes, pouco mais que simbólicas … são mudanças.
Dar visibilidade ao que parece transparente e não devia ser é uma mudança.
Não se pode, não se deve, ignorar.

AS HISTÓRIAS PARA CRIANÇAS

Uma da características das histórias tradicionais para crianças é a sua, por assim dizer, eternidade. Ouvimo-las dos nossos pais e avós e contamo-las aos nossos filhos e netos. E assim continuará a ser.
No entanto, o tempo vai deixando marcas e promovendo alguma actualização nas histórias.
Um dia destes contava a história da Gata Borralheira, lembram-se, ao meu neto que a ouvia "encantado" com uma versão da história que eu imagino ao alcance de dois anos e meio de experiência, de vida a dele e de avozice a minha.
A história acabou com a Gata Borralheira a ir com o Príncipe para a casa dele. É assim que acabam as histórias com Princesas e Príncipes.
Mas o ponto final foi posto alguns segundos depois pelo Simão.
Avô, foram pela A5.
Está certo Simão, a Gata Borralheira e Princípe foram pela A5. Se os encontrarem por lá lembrem-se. Eles, pelos menos eles, foram felizes para sempre.
Agora ando na história da Carochinha. Ainda não sei o fim.


A LER "ERA UMA VEZ ... NOVE MENINOS REAIS"

Gostei de ler o texto muito bonito de Graça Barbosa Ribeiro, "Era uma vez ... nove meninos reais", sobre a produção da colecção de livros para crianças, e não só, “Meninos Especiais”, promovida pela Associação Pais em Rede. Aproveito para recomendar a sua leitura e divulgação.

Apesar da lentidão.
Apesar dos obstáculos.
Apesar da pressão para a "normalização".
Apesar da discriminação ainda presente.
Apesar da retórica de boa parte dos discursos, da legislação e das políticas.
Apesar de ...
A inclusão, através do seu verdadeiro critério, a participação, vai fazendo o seu difícil caminho.
Eppur si muove.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

DOS JOVENS E DA DELINQUÊNCIA

Segundo os dados agora conhecidos da Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos, dos 186 jovens que em Fevereiro de 2015 cumpriam medidas tutelares nos Centros Educativos 144 estavam já sinalizados, referenciados, por processos de promoção e protecção. Dito de outra maneira, trata-se de jovens com um processo longo e conhecido de problemas e circunstâncias de vida bem adversas.
Recordo também que resultados do Projecto Reincidências – Avaliação da Reincidência dos Jovens Ofensores e Prevenção da Delinquência, da responsabilidade da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, e realizado entre Janeiro de 2013 e Janeiro de 2015 mostram que 33.2% dos jovens inquiridos e que já passaram por uma medida tutelar educativa que pode incluir internamento em Centro Educativo reincidem na prática de delitos.
Acresce que os Centros Educativos sentem ainda forte constrangimento em matéria de recursos humanos pelo que mais dificilmente cumprem o seu papel fundamental de reabilitação através da construção de programas de educação e formação profissional.
Ainda de acordo com um estudo divulgado há algum tempo realizado no âmbito do Programa de Avaliação e Intervenção Psicoterapêutica no Âmbito da Justiça Juvenil, promovido pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e co-financiado pela Comissão Europeia, a população que está nos Centros Educativos acumula, em geral, mais de três anos de chumbos na escola e em 80% dos casos é oriunda de famílias de baixo estatuto socioeconómico.
É ainda relevante que mais de 90% dos que foram entrevistados têm pelo menos uma perturbação psiquiátrica, “o que é um dado astronómico”, como classificou Daniel Rijo, professor da Universidade de Coimbra, um dos autores do trabalho para a DGRSP. Nem todos têm o acompanhamento que seria necessário, admitiu.
Sempre que estas matérias são discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério das sociedades actuais pelo que a resposta recentemente criada, (mas creio que ainda só no papel) “casas de autonomização” pode constituir-se como um contributo se dotada de recursos adequados.
As Comissões de Protecção de Crianças e Jovens sentem-se incapazes de acompanhar o volume de casos das respectivas comunidades, gerando situações, muitas conhecidas, com fim grave de crianças que depois ficamos a saber, os dados de hoje confirmam-no, que estavam “sinalizadas” ou “referenciadas”, mas sem resposta.
Sabemos que educação, prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, no entanto, importa ponderar entre o que custa prevenir e cuidar e os custos posteriores do mal-estar e da pré-delinquência ou da delinquência continuada e da insegurança.
Parece ser cada vez mais consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição, designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e, sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos mais novos em episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
Apesar de, repito, a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade instalada, é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
É em todo este caldo de cultura que nascem e se desenvolvem as sementes de mal-estar.
É urgente que nos questionemos e questionemos as instituições, em nome dos nossos filhos e dos filhos dos nossos filhos.
Recordo Brecht, "Do rio que tudo arrasta diz-se que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem".

DA ADOLESCÊNCIA

Uma peça no Público sobre os comportamentos dos adolescentes na qual colaborei.
(...)
“São mais os estilos de vida que podem estar ligados a determinado tipo de condição, determinados tipos de exercício profissional, pouca presença familiar… Estes estilos podem reflectir-se na educação, os miúdos ficam mais sós, com menos regras, com menos orientação, menos nível de comunicação” (...)

COMPORTAMENTO

Adolescentes não têm mimos a mais, têm mimos maus

DA INDÚSTRIA DOS EXAMES

No DN abordam-se os primeiros efeitos colaterais da substituição dos exames finais do 1º e 2º ciclos por provas de aferição.
Ao que parece os Centros de explicações que nos últimos anos se tornaram um atraente nicho de mercado com a preparação para exames, sobretudo a partir do segundo período, já sentem a diminuição da procura.
Também as editoras que nos últimos anos desenvolveram mais uma estimulante área de negócio, a oferta de materiais específicos de preparação para os exames, sentem ameaçados os seus interesses comerciais.
Nada de estranho, muitas vezes aqui falámos do funcionamento da indústria de exames.
Parece-me, no entanto, útil uma pequena reflexão. Na segunda feira foi divulgado um estudo da responsabilidade conjunta da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do CNE mostraram que nove em cada dez alunos com insucesso escolar são de famílias pobres.
A ajuda externa ao estudo e como ferramenta promotora do sucesso não está ao alcance de toda a gente pelo que é fundamental que as escolas possam dispor dos dispositivos de apoio suficientes e qualificados para que se possa garantir, tanto quanto possível, a equidade de oportunidades e a protecção dos direitos dos miúdos, de todos os miúdos.
A substituição dos exames pelas provas de ferição não altera esta necessidade imperiosa, antes pelo contrário, torna-a ainda mais pertinente para que se possam corrigir e apoiar ao longo dos vários ciclos as dificuldades de alunos e professores.
Talvez esta necessidade pudesse ser atenuada com o recurso a professores que já estão no quadro ou com contratos sucessivos e que estão ameaçados pela falta de horários.
De uma vez por todas, é necessário contenção e combate ao desperdício, mas em educação não há despesa há investimento.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

UM TROPEÇO NA CIDADANIA

Movimento enviou esta terça-feira uma carta a aberta a criticar o novo Presidente da República por ter estacionado o carro num lugar reservado a deficientes.

O Professor Marcelo Rebelo de Sousa tropeçou na cidadania, seguido pelas câmaras da SIC estacionou o carrinho num lugar reservado a cidadãos com mobilidade reduzida.
Nada de extraordinário. Como sabem, boa parte da legislação em Portugal não é imperativa, é indicativa, ou seja, a lei diz que é assim mas não tem que ser assim, é como um homem quiser.
Acontece que o homem é o novo Presidente da República e quer mesmo mostrar que é um homem próximo do povo.
Também é verdade que ele só vai jurar cumprir a constituição, não vai jurar cumprir toda a legislação.
Bom, finalmente, ninguém é perfeito ... nem o Professor.

QUEM PASSA MAL NÃO APRENDE

"Sabemos que há crianças que apenas têm direito à educação na nossa Constituição", disse Tiago Brandão Rodrigues, a propósito do estudo ontem divulgado segundo o qual nove em cada dez crianças retidas nas escolas portuguesas são oriundas de famílias com carências socio económicas.


O trabalho ontem divulgado realizado pelo CNE e pela Fundação Francisco Manuel dos Santos espelha uma realidade que todas as pessoas que se movem no universo da educação conhecem e reconhecem, a esmagadora maioria dos alunos com insucesso é oriunda de famílias com estatuto económico e social muito baixos e vivem em situação de pobreza e carência. Aliás, o Ministro da Educação assumiu isso mesmo hoje na Assembleia da República.
O impacto das circunstâncias de vida no bem-estar das crianças e em aspectos mais particulares no rendimento escolar e comportamento é por demais conhecido e essas circunstâncias constituem, aliás, um dos mais potentes preditores de insucesso e abandono quando são particularmente negativas, como é o caso de carências significativas ao nível das necessidades básicas.
Um Relatório de 2013, "Food for Thought", da organização Save the Children, afirmava que 25% das crianças terão o seu desempenho escolar em risco devido à malnutrição com as óbvias e pesadas consequências em termos de qualificação e qualidade de vida de que a educação é uma ferramenta essencial.
Em qualquer parte do mundo, miúdos com fome, com carências, não aprendem e vão continuar pobres. Manteremos as estatísticas internacionais referentes a assimetrias e incapacidade de proporcionar mobilidade social através da educação. Não estranhamos. Dói mas é “normal”, é o destino.
Quando penso nestas matérias sempre me lembro da história que conto com frequência e foi umas das maiores lições que já recebi, acontecida há uns anos em Inhambane, Moçambique. Ao passar por uma escola para gaiatos pequenos o Velho Bata, um homem velho e sem cursos, meu anjo da guarda durante a estadia por lá, disse-me que se mandasse traria um camião de batata-doce para aquela escola. Perante a minha estranheza, explicou que aqueles miúdos teriam de comer até se rir, “só aprende quem se ri”, rematou o Velho Bata.
Pois é Velho, miúdos com fome não aprendem e vão continuar pobres.

O PREÇO DOS MANUAIS ESCOLARES REVISTO EM BAIXA. É POUCO MAS É POSITIVO

Ao que se lê na imprensa encontra-se em curso um processo de negociação entre o ME e a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros visando o abaixamento dos preços dos manuais escolares a acontecer já no próximo ano lectivo. Será um passo positivo mas deixa ainda muito por fazer nesta matéria.
De facto, a questão dos manuais escolares é uma matéria importante e não só pelos custos para as famílias. Apesar do esforço desenvolvido em diversas iniciativas promovendo a reutilização dos manuais vários factores como uma excessiva “manualização” do trabalho dos alunos potenciado com o aumento do número de alunos por turma e pelo modelo de currículos assente nas metas curriculares, não porque existem mas pela forma excessiva e inadequada como foram definidas. Acresce ainda a rápida mudança de currículos ou dos manuais aprovados nas escolas e agrupamentos que também obrigam à substituição de manuais. Importa ainda considerar o habitual conjunto de cadernos de actividades, fichas e CDs que acompanham os manuais e que se reflectem significativamente os custos globais.
Tal situação tem óbvias implicações didáctico-pedagógicas e, naturalmente, económicas pelo peso nos orçamentos familiares acrescido
Recordo que no quadro constitucional vigente, lê-se no Art.º 74º (Ensino), “Na realização da política de ensino incumbe ao Estado: a) Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito;
Na verdade, o ensino obrigatório nunca foi gratuito nem universal, vejam-se as taxas de abandono, e os custos incomportáveis para muitas famílias dos manuais e materiais escolares num cenário em que a acção social escolar é insuficiente e tem vindo a promover sucessivos ajustamentos nos valores e critérios de apoio disponibilizados. No universo particular das famílias com crianças com necessidades especiais os custos da escolaridade obrigatória e gratuita são ainda mais elevados, bem mais elevados.
Sem retomar considerações de natureza mãos didáctico-pedagógica que já tenho abordado creio que a redução da dependência dos manuais passaria, entre outros aspectos, por uma reorganização curricular, diminuindo a extensão de alguns conteúdos, a redução do número de alunos por turma ao abrigo de uma verdadeira autonomia das escolas, o que permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e construção de conhecimentos com base noutras fontes incrementando, por exemplo, a acessibilidade a conteúdos e informação diversificada que as novas tecnologias oferecem.
É importante caminharmos no sentido de atenuar a fórmula predominante, o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.
Julgo também que seria de considerar a possibilidade dos manuais escolares serem disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano lectivo ou da sua utilização, sendo as famílias penalizadas pelo seu eventual dano ou extravio e ficando, assim, com "folga" para aquisição de outros materiais, livros por exemplo, um bem com pouca presença em muitos agregados familiares. Este modelo não é novo, é usado em vários sistemas educativos.
Como é evidente, dentro desta perspectiva, a própria concepção dos manuais deveria ser repensada no sentido de permitir a sua reutilização.
Não esqueço, no entanto, o peso económico deste mercado e como são os mercados que mandam ...

UMAS NOTAS NA VISÃO. "COM A IDADE PASSA, SERÁ?"

Umas notas na Visão sobre o universo da Educação. Tantas vezes se ouve algo como "Com a idade passa". Será que passa mesmo?


segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O PRESIDENCIAL VETO A DUAS MÃES E DOIS PAIS

Cavaco Silva num dos últimos exercícios da sua passagem por Belém vetou a adopção de crianças por casais homossexuais pois, afirma, “Está por demonstrar” em que medida a adopção plena “promove o bem-estar da criança”. Também legitima a sua decisão através de habilidosas considerações jurídicas
Cavaco Silva pode afirmar o que entende, parece-me legítimo, não pode é transformar os seus valores e opiniões em ciência.
Algumas notas velhas.
Em primeiro lugar e desde logo está provado que uma família que goste e cuide da criança cumpre melhor o papel de cuidador e educador que uma instituição por mais competentes e empenhados que sejam os seus técnicos. Cavaco Silva deveria saber que Portugal é ainda um país com alta taxa de crianças em instituições. Talvez fosse boa ideia pensar no seu bem-estar”.
No que respeita à homoparentalidade e à falta referida por Cavaco Silva do “amplo debate” recordo uma revisão de algumas dezenas de estudos sobre este conjunto de razões realizada pela Associação Americana de Psicologia que motivou uma resolução da Associação, em 2004, que não confirma nenhuma destas preocupações do argumentário contra e que são, basicamente a eventual dificuldade da criança em lidar com a sua orientação sexual, a vulnerabilidade psicológica e o risco de problemas de comportamento e também o risco acrescido de serem alvo de discriminação, por exemplo, em contextos escolares.
Cavaco Silva também e não quer saber que em 2010, a Associação Americana de Psiquiatria afirmava "apoiar as iniciativas que permitam a casais do mesmo sexo adoptar e co-educar crianças".
Também em 2014 a Ordem dos Psicólogos de Portugal referiu em parecer que "os resultados das investigações psicológicas apoiam a possibilidade de co-adopção por parte de casais homossexuais, uma vez que não encontram diferenças relativamente ao impacto da orientação sexual no desenvolvimento da criança e nas competências parentais". Na mesma linha foi divulgada mais recentemente uma outra revisão de estudos sobre esta matéria mostrando que a homoparentalidade não afecta o desenvolvimento das crianças.
Podemos também lembrar a Cavaco Silva que a maioria das pessoas homossexuais terá sido educada em famílias heterossexuais, que existem muitas crianças com sérios problemas emocionais e vulnerabilidade psicológica, a experimentarem condições de mal-estar devastador integrando situações familiares heterossexuais ou, finalmente, que existem múltiplos casos de crianças discriminadas por variadas razões em contexto escolar o que não nos faz retirar, por princípio, as crianças da escola mas, pelo contrário, combater a discriminação, sejam quais forem as circunstâncias.
Do meu ponto de vista e de uma forma propositadamente simples, a questão central é que o que faz com toda a certeza mal às crianças, é serem maltratadas e os maus tratos não decorrem do tipo de famílias, mas da competência humana e educativa, por assim dizer, de quem delas cuida, pais, mães ou educadores.
Quando as crianças são bem tratadas e crescem com adultos que gostam delas, as protegem e as ajudam a crescer, elas encontram caminhos para lidar com dois pais ou com duas mães.
Insisto, o que as crianças terão dificuldade em resolver é ter por perto adultos, heterossexuais ou homossexuais, que não gostam delas, que as maltratam, negligenciam, abandonam, etc. Isso é que faz mal às crianças.
O resto é uma discussão não conclusiva, assente em valores de que não discuto a legitimidade, mas que não podem ser confundidos com ciência ou com um discurso de defesa das crianças de males que estão por provar. Cavaco Silva deveria saber que a decisão do Presidente da República não deve assentar na ignorância e no preconceito.
Quando se trata do bem-estar dos mais novos parece bem mais importante defendê-las dos males comprovados e que todos os dias desfilam aos nossos olhos.
Como disse, este texto não é novo, parte dele já o divulguei como artigo de opinião no Público. Enquanto for necessário e porque não julgo que mereça alteração, voltarei, insistindo.

A LER. A ENTREVISTA DE JOAQUIM DE AZEVEDO


Vale a pena ler e reflectir sobre a entrevista de Joaquim de Azevedo ao DN. Que caminhos para a educação e para a escola? Qual o sentido da mudança e como mudar? Quais os custos da mudança e quais os custos de não mudar?
As respostas não são fáceis e não serão provavelmente consensuais. Analisar o que se vai fazendo e pensando noutras paragens pode ser inpirador mas não pode ser replicado dadas as diferenças a todos os níveis.

domingo, 24 de janeiro de 2016

DAS PRESIDENCIAIS. TERMINOU O SONHO

E pronto, terminou o sonho.
Um agradecimento a Sampaio da Nóvoa pela janela de esperança que abriu.
É comum que nas noites eleitorais se afirmem vitórias mesmo perante derrotas pesadas. Por umas razões ou por outras todos ganharam mas não, existem derrotados e é bom não esquecer. É bom não esquecer que claramente se verificou uma derrota da estratégia seguida pelo PS, o criativo entendimento da primeira volta como eleições primárias. O grande risco foi sempre que esta decisão facilitasse uma vitória de Marcelo à primeira, ela aí está. 
A democracia implica que se aceitem resultados eleitorais e o sentido do voto dos eleitores. Tal como em 3 de Outubro a maioria dos que votaram rejeitaram a continuidade das políticas anteriores, hoje a maioria dos que votaram escolheram Marcelo Rebelo de Sousa. Curiosamente os que hoje apoiam a escolha de Marcelo Rebelo de Sousa por parte dos eleitores não aceitaram a escolha dos eleitores em 3 de Outubro, um entendimento enviesado da democracia. Até nisto Sampaio da Nóvoa é diferente, já declarou que a "a partir de agora Marcelo Rebelo de Sousa é o meu Presidente".
Mas há mais derrotados. Todos os que colocaram interesses partidários à frente de projectos mais alargados e estabeleceram agendas próprias que levaram a uma dispersão de candidaturas que não permitiram aumentar a possibilidade de levar a uma segunda volta contribuíram, do meu ponto de vista, para a vitória de Marcelo Rebelo de Sousa e foram derrotados. Talvez Marcelo Rebelo de Sousa deva agradecer a estratégia da esquerda no seu discurso de vitória.
A candidatura de Sampaio da Nóvoa abriu e mostrou um outro horizonte possível e amanhã, amanhã é o primeiro dia do resto da nossa vida. 

DA CORRIDA DE OBSTÁCULOS

Votar não é para quem quer, é para quem consegue

As dificuldades, por vezes inultrapassáveis, que enfrentam pessoas com mobilidade reduzida para aceder a um direito, o voto.
Apenas mais um exemplo da corrida de obstáculos sem fim em que se transforma a vida de muitas pessoas com deficiência e das suas famílias. 
Não precisam de tolerância, não precisam de privilégios, não precisam de caridade, precisam só de ver os seus direitos considerados. Os direitos não são de geometria variável cumprindo-se apenas quando é possível.

DE TANTO CHUMBAR, UM DIA APRENDES. SERÁ?


De novo e sempre.
O peso insustentável da retenção no nosso sistema escolar parece assentar na errada convicção de que a repetição só por si conduz ao sucesso e alimenta o que a OCDE já classificou de "cultura da retenção". Importa ainda considerar o impacto económico desta cultura como evidenciou um estudo realizado pela associação Empresários pela Inclusão Social e pelo Centro de Estudos de Sociologia da Universidade Nova de Lisboa.
Confesso a surpresa quando ao discutir-se os efeitos pouco positivos da retenção, cerca de 150 000 alunos por ano, algumas vozes, mesmo dentro do universo da educação, clamam que se está a promover o "facilitismo" ou a defender que "então passam sem saber".
Como me parece evidente não é dada disto. Como exemplo, a Noruega tem uma taxa de retenção próxima do 0% e não consta que os alunos noruegueses passem sem saber, são, aliás, dos alunos com melhores resultados nos estudos comparativos internacionais.
A questão é saber se o chumbo transforma o insucesso em sucesso. Não transforma, repetir só por repetir não produz sucesso, aliás gera mais insucesso conforme os estudos mostram. Muitos estudos internacionais também mostram que os alunos que começam a chumbar, tendem a continuar a chumbar, ou seja, a simples repetição do ano, não é para muitos alunos, suficiente para os devolver ao sucesso. Os franceses utilizam a fórmula “qui redouble, redoublera” quando referem esta questão.
Nesta conformidade e do meu ponto de vista, a questão central não é o chumba, não chumba, e quais os critérios ou o número de exames, mas sim que tipo de apoios, que medidas e recursos devem estar disponíveis para alunos, professores e famílias desde o início da percepção de dificuldades com o objectivo de evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É necessário diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional. Importa ainda que as políticas educativas sejam promotoras de condições de sucesso para alunos e professores. O aumento do número de alunos por turma no Ensino Básico e no Secundário, a forma como foram definidas as metas curriculares, a cultura de competição e centrada exclusivamente em resultados, os cortes no número de docentes que poderiam desenvolver dispositivos de apoio, são apenas alguns exemplos do que não deve ser feito se, efectivamente, se quiser promover qualidade e sucesso.
Como é evidente este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação, uma tentação a que nem sempre se resiste.
Assim sendo, o essencial é promover e tornar acessíveis a alunos, professores e famílias apoios e recursos adequados e competentes de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É fundamental não esquecer que o insucesso continua a atingir fundamentalmente os alunos oriundos de famílias com pior condição económica e social pelo que inibe o objectivo da mobilidade social, replicando o velho "tal pai, tal filho". A associação entre o insucesso e a pobreza em Portugal é, aliás, a mais forte entre os países europeus.
É necessário também diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional mas não em idades precoces criando percursos irreversíveis de "segunda" para os "sem jeito para a escola" e "preguiçosos".
Não tenho nenhum princípio fundamentalista contra os exames, embora no 1º ciclo os entenda como dispensáveis, as provas de aferição podem cumprir e cumpriram o papel regulador. Entender que os exames, quanto mais melhor, só por existirem são fonte de qualidade é que me pareceu e parece uma medida facilitista.
A qualidade promove-se, é certo e deve sublinhar-se, com a avaliação rigorosa e regular das aprendizagens, sim, naturalmente, mas também com a avaliação do trabalho dos professores, com a definição de currículos adequados, com a estruturação de dispositivos de apoio a alunos e professores eficazes e suficientes, com a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo simples e coerente e modelos adequados de autonomia, organização e funcionamento das escolas, com a definição de objectivos de curto e médio prazo, etc.
É o que acontece, genericamente, nos países com mais baixas taxas de retenção escolar.
É o que não tem acontecido em Portugal.
Ponto.

sábado, 23 de janeiro de 2016

A CONFLITUALIDADE EM EDUCAÇÃO

Em entrevista ao Expresso o professor Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas, sublinha o impacto negativo das sucessivas alterações em matéria de política educativa produzidas pelas diferentes equipas do ME, incluindo a actual. Umas notas telegráficas.
Na verdade, o sistema educativo português parece condenado a uma dimensão de conflitualidade e instabilidade que lhe retiram serenidade e eficácia.
Não sou apologista de falsos consensos, a chamada paz podre, conseguida a todo o preço. A conflitualidade em educação, como noutras áreas, é, pode ser, um factor de desenvolvimento e crescimento.
Existem diferentes posicionamentos sobre educação e escolas designadamente no entendimento do que deve ser um sistema público de educação e ensino. É legítimo que assim seja em sociedades abertas e democráticas independentemente das nossas posições. Recordo como tantas vezes aqui discordei de dimensões da política educativa de Nuno Crato ou Maria de Lurdes Rodrigues só para citar dois exemplos fortes entre antigos ocupantes da 5 de Outubro.
A questão não é a existência destas diferentes visões sobre os caminhos da educação. Os problemas, a instabilidade, emergem quando essas diferentes visões e posicionamento perdem de vista os interesses e o bem-estar educativo de todos os alunos e passam a acomodar, sobretudo, outros interesses sejam partidários, corporativos, profissionais ou económicos.
É neste quadro que a conflitualidade corre o risco de ser parte do problema e não uma busca por soluções. Não está também em causa a legitimidade de alguns destes interesse mas o enorme risco de que a gestão desses interesses pode ameaçar a serenidade e qualidade do trabalho de alunos e escolas. 

O DIA DA REFLEXÃO

Manda a liturgia dos processos eleitorais que o dia anterior se dedique à reflexão. Como em outras ocasiões tenho afirmado não estou muito de acordo com este cenário, do meu ponto de vista, ainda que pareça estranho, deveríamos ter o dia de reflexão no dia seguinte às eleições.
Em primeiro lugar não julgo necessário o dia de reflexão antes do acto eleitoral porque não entendo que essa reflexão influencie significativamente os resultados eleitorais pois, se por um lado, a abstenção continua a crescer, deixando cada vez mais o voto no eleitorado fidelizado, por outro lado, o eleitorado flutuante não decide na véspera, decide, creio, face a contextos e circunstâncias, por exemplo a qualidade e capacidade mobilização das candidaturas em presença.
Em segundo lugar, porque na verdade, em termos de futuro parece ser mais significativo reflectir nos resultados eleitorais que se verificarem. Será totalmente diferente um cenário de vitória à primeira volta de um candidato que se limitou a colocar a sua presença mediática a render e a “vender” um discurso de sedução a tudo e todos ou, como espero e desejo, uma segunda volta com a presença de Sampaio da Nóvoa. Aí, começa tudo de novo mas, felizmente, já não do “zero”.
Aproveito, no entanto e desde já, o dia de reflexão para deixar um apelo muito sentido.
Apelo vivamente aos senhores integrantes da classe política que a propósito das eleições de amanhã se inibam de elaborar comentários como “queria felicitar o povo português pela forma tranquila como está a decorrer, ou decorreu, o acto eleitoral”, “quero registar a normalidade que o povo português evidencia no cumprimento do seu dever cívico”, “os cidadãos mais uma vez mostram a sua maturidade democrática” ou ainda “o acto eleitoral está a decorrer, ou decorreu, com toda a normalidade em todo o território”. Considero afirmações desta natureza um insulto à esmagadora maioria dos cidadãos eleitores em Portugal. Que diabo pensam de nós, para se surpreenderem com a “normalidade” do nosso comportamento?
Então não é de esperar que participar num acto eleitoral, das diferentes formas possíveis, seja algo de normal e tranquilo?
Lembro-me daqueles pais e professores que ao falarem de miúdos acrescentam de imediato “e até se portam bem”, como se o comportamento adequado seja uma surpresa e a excepção. Como se dizia no PREC, “repudio veementemente tais afirmações”.
Já agora, nós, os cidadãos que votamos, ou não, com normalidade democrática, gostávamos de poder comentar as campanhas dizendo que tudo decorreu com a elevação, sentido ético e de esclarecimento normais. Mas não, existiram como sempre os insultos, a demagogia, a trafulhice nas ideias e nos comportamentos, a falta de esclarecimento e debate sério, etc.
A actividade das lideranças ou de candidatos a líderes é que nem sempre decorre com normalidade e tranquilidade democráticas. Não tratem os cidadãos como gente incapaz e de quem sempre se espera o pior. 
A campanha que ontem terminou constituiu um autêntico manual. 
Como sabem, sou suspeito, apoio desde o início Sampaio da Nóvoa mas, de facto, foi o único que apresentou e esteve disponível para discutir uma visão para Portugal e para os portugueses dentro do quadro de competências do Presidente da República.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

GOSTEI DE LER, "SUBVENÇÕES VITALÍCIAS, O JACKPOT DOS POLÍTICOS"

Gostei de ler o texto de Pedro Sousa Carvalho no Público. Como diz o povo, "quem parte e reparte não fica com a melhor parte, ou é tolo não não tem arte".
Esta gente de tolo tem nada, cambada de artistas. Nem as moscas, às vezes, variam.
São assim as contas da partidocracia. Em alternância pois claro.

Subvenções vitalícias, o jackpot dos políticos

A linguagem repolhuda e farfalhuda, como diria Camilo Castelo Branco, não esconde a fragilidade dos argumentos do TC

DO AMIGUISMO

Escutas mostram que Marques Mendes pediu favores a arguido dos vistos gold

Como sempre nestas ocasiões e de acordo com o “script” clássico, os envolvidos dirão que estão de “consciência tranquila”. Acredito que tal possa acontecer pois para este pessoal “consciência” não significa certamente o mesmo que para a maioria das pessoas.
É por demais evidente que para boa parte desta gente, legalidade, transparência, ética ou minudências como pagar contribuições, impostos, cumprir as exigências legais, etc., são “contos para crianças”, coisas, por assim dizer, para “tótós”, nós.
Tecnoformices, relvices, varices, loureirices, salgadices, marquesmendices, amigos mecenas, negócios manhosos e corrupção, tráfico de influências e amiguismo, utilização criteriosa dos alçapões de uma justiça criteriosamente desenhados para efeitos de protecção dos seus interesses e outras habilidades da mesma natureza são ferramentas diariamente usadas por esta família alargada e diversa que há décadas ocupou um largo espectro do nosso contexto político, social e económico.  

DAS PRESIDENCIAIS. O ENGRAÇADISMO POUCO SÉRIO DE VASCO PULIDO VALENTE

Na sua prosa de hoje no Público Vasco Pulido Valente deixa-se contaminar pelo vírus do "engraçadismo" e perora sobre os candidatos presidenciais.
Para cada um escreve um parágrafo arrasador e arrogante no espírito que lhe é habitual. Perdão, para cada um não, para todos menos para um.
Dado que os três candidatos melhor colocados são Marcelo Rebelo de Sousa, Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém vejamos a escrita de VPV sobre estes.

Sampaio da Nóvoa – É e não é o candidato da esquerda do PS. Repete, sem se rir, os mesmos lugares-comuns desde o princípio da campanha. Dado a voos líricos, lembra um baladeiro sem capa e sem guitarra.

Maria de Belém – É e não é a candidata da direita do PS. Obcecada por se fazer valer, chega constantemente ao patético, sem passar pelo grave.


E falta alguém? Falta o Prof. Marcelo, que Portugal inteiro conhece e não é preciso descrever, hélas.

O que significa, exactamente o que escreve sobre Marcelo Rebelo de Sousa? É muito claro o que dedica a Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém mas a habilidade manhosa da promoção de Marcelo Rebelo de Sousa é "poucochinha", é intelectualmente desonesta no contexto e na forma.
Nada que me surpreenda. De há muito que assim é.

OS PROFESSORES SÃO BONS VENDEDORES

Docentes são altamente qualificados e as suas características começam a ser muito valorizadas no setor das vendas

Não sei bem explicar porquê mas senti assim um embaraço quando li que muitos professores sem emprego no sistema educativo ou no desempenho das funções para as quais estão preparados estão a encontrar emprego no sector das vendas, em particular no imobiliário.
É claro que qualquer pessoa tem direito à dignidade de um trabalho e de meios de sobrevivência pelo que não tem nada de estranho que se agarrem oprtunidades de trabalho negadas na sua área de formação.
No entanto, é curioso ver como na peça do DN é referido o apreço dos empregadores pelas qualidades e competências dos professores para o desempenho neste sector que lhes permitirá, dizem, rendimentos bem acima dos que aufeririam a trabalhar em educação.
Apesar disso, talvez por ingenuidade, ainda acredito que para quem pensa construir um projecto de vida com base numa carreira de professor reconverter-se a um outro sector de actividade é negar um sonho. 
Muitas destas pessoas e várias outras sem emprego vão abdicar desse sonho numa opção não reversível. Não é assim que devia ser. Numa casa de professores, um em fim de carreira, outra com ela terminada, custa mais a entender.
De qualquer forma ... boa sorte.

DAS PRESIDENCIAIS. AS MENSAGENS DA IMPRENSA AMIGA

A imprensa, boa parte dela, tem revelado um especial carinho, por assim dizer, pela candidatura de Marcel Rebelo de Sousa.
Tal comportamento contribui em muito para a “não campanha” que Marcelo Rebelo de Sousa realiza, sem ondas, namorando tudo e todos, sempre no estilo simpático que o caracteriza e sacudindo com a agilidade os salpicos do cataventismo de sempre, diz, desdiz-se, sempre com o mesmo ar e sem um sobressalto.
A divulgação dos dados das sondagens são um bom exemplo.
A intenção de voto em Marcelo continua superior a 50% mas todas reconhecem que a probabilidade da segunda volta a que chegará, se na verdade existir, Sampaio da Nóvoa, também tem vindo a aumentar e está dentro do intervalo de confiança das sondagens conhecidas.
No entanto se verificarmos os títulos o que é enfatizado é a proximidade da vitória de Marcelo à primeira volta e não a proximidade de existência de uma segunda volta a disputar com Sampaio da Nóvoa e com resultados menos previsíveis.
Não é preciso ser especialista em comunicação social para perceber a habilidade da manipulação e passagem de uma mensagem de vitória.
Eu como cidadão não tenho que ser isento, já afirmei muitas vezes desde a sua candidatura a minha convicção de que Sampaio da Nóvoa é o Presidente certo para para este tempo por um conjunto de razões que agora não repito.
A comunicação social também pode assumir critérios editoriais que traduzam simpatia política ou partidária, do meu ponto de vista é legítimo que o faça.
No entanto, exijo que seja transparente nessas opções, que não manipule dados e mensagens de forma tendenciosa, sobretudo, quando quer vender uma imagem de isenção, rigor ou neutralidade. 

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A CERTIFICAÇÃO DO FINAL DO SECUNDÁRIO E O ACESSO AO SUPERIOR

Ao que se lê no Público o ME está a analisar a questão do acesso ao ensino superior por parte dos alunos provenientes do ensino artístico especializado, do ensino profissional e do ensino recorrente. Como é sabido todo este processo tem criado enorme ruído face a alterações verificadas e pelas situações de alegada discriminação que se verifica.
Ao que parece esta análise não envolve o processo relativo aos alunos dos cursos científico-humanísticos, o chamado ensino regular. No entanto também esta matéria deveria ser objecto de análise, são frequentes as referências à inflação das notas internas, sobretudo em estabelecimentos de ensino privado que vão influenciar de forma significativa as médias finais e, portanto, o acesso ao ensino superior.
Talvez fosse altura de ponderar alterações a estabelecer com prudência e calendário adequado mas necessárias.
Como já tenho afirmado, este tipo de situações e problemas radica numa questão central, a conclusão e certificação de conclusão do ensino secundário e a candidatura ao ensino superior deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário e que, obviamente, está sediado no ensino secundário. Neste cenário caberiam as outras modalidades que permitem a equivalência ao ensino secundário, como é o caso do ensino artístico especializado, profissional ou recorrente.
O acesso ao ensino superior é um outro processo que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e estar sob a sua tutela.
A situação existente, não permite qualquer intervenção consistente do ensino superior na admissão dos seus alunos, a não ser a pouco frequente definição de requisitos em alguns cursos, o que até torna estranha a passividade aparente por parte das universidades e politécnicos, instituições sempre tão ciosas da sua autonomia. Parece-me claro que o ensino superior fazendo o discurso da necessidade de intervir na selecção de quem o frequenta não está interessado na dimensão logística e processual envolvida.
Os resultados escolares do ensino secundário deveriam constituir apenas um factor de ponderação a contemplar nos processos de admissão organizados pelas universidades como, aliás, acontece em muitos países.
Sediar no ensino superior o processo de admissão minimizaria muitos dos problemas conhecidos decorrentes do facto da média do ensino secundário ser o único critério utilizado para ordenar os alunos no acesso e eliminaria o “peso” das notas altíssimas concedidas com frequência, quer no ensino recorrente quer em vários estabelecimentos de ensino privado. Em diferentes zonas são conhecidos os estabelecimentos “simpáticos”, por assim dizer.
Por outro lado, todos conhecemos os clássicos exemplos de alunos que se dirigem a medicina porque as suas altíssimas notas assim o sugerem, acabando por reconhecer não ser esse o seu caminho e, por outro, um potencial excelente médico que deixará de o ser porque por três vezes ficou a décimas da média de entrada.
Enquanto não se verificar a separação da conclusão do secundário da entrada no superior corremos o risco de lidar com situações desta natureza.
Poderíamos pensar na mudança

O PAPEL DA ALDEIA, DA COMUNIDADE

Na aldeia de Karangpatihan, algures na Indonésia, vivem 120 pessoas. Destas, 30 têm alguma deficiência. A situação é dramática mas está a mudar graças a Eko Mulyadi, o homem que a população escolheu como líder

Já algumas vez aqui citei algo que aprendi em Moçambique durante as estadias que a lida da educação me proporcionou, "Para fazer uma casa bastam quatro homens, para educar uma criança é preciso uma aldeia.
Na verdade, a peça do Expresso mostra com clareza o papel da "aldeia", da comunidade, na promoção do bem estar, da inclusão, para todos. Aqui no sentido mais literal e mais despojado.
É certo que precisamos de recursos, de legislação, de técnicos, de ... e devemos ser exigentes.. No entanto, as pessoas e o seu sentido de comunidade, dignidade, respeito pela diferença, solidariedade e direitos de todos, incluindo os mais vulneráveis, farão sempre a diferença.


quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

"FAZER AS COISAS CERTAS E FAZER CERTAS AS COISAS"

Ao que se lê na imprensa o Governo enviou para o Conselho Económico e Social as Grandes Opções do Plano, instrumento que guiará a sua acção até 2019.
O documento envolve todas áreas da Governação e na educação define-se a intenção de promover "uma maior articulação entre os três ciclos do ensino básico, atenuando os efeitos das transições entre ciclos, através da gestão integrada e revisão dos currículos do ensino básico e da redução da carga disciplinar excessiva dos alunos".
Esta afirmação não é nova consta, aliás, do Programa do PS para as Legislativas de Outubro na página 45:

• Promover uma maior articulação entre os três ciclos do ensino básico, redefinindo progressivamente a sua estrutura de modo a atenuar os efeitos negativos das transições entre ciclos, assumindo uma gestão mais integrada do currículo e reduzindo a excessiva carga disciplinar dos alunos;

De há muito que entendo a necessidade de ajustar, quer a organização do ensino básico quer as áreas disciplinares e respectivos conteúdos tendo também aqui referido algumas ideias sobre esta questão que vão, aliás, na linha do que se encontra em outros países com sistemas educativos com bons resultados.
Sei também da enorme complexidade de mudanças nestas áreas até pelo impacto que poderá ter na organização da carreira e formação dos docentes para além da multiplicidade de variáveis a considerar.
Assim sendo, o quer que venha a ser realizado deve acontecer com uma enorme prudência, reflexão aprofundada e com a participação o mais abrangente possível dos diversos actores e entidades envolvidos.
Como afirmei a propósito da mudança no sistema de avaliação, depressa e bem não há quem. Objectivos globalmente positivos podem ser comprometidos por más metodologias ou calendários de mudança inadequados.
Não sendo conhecido o entendimento sobre o que significa, por exemplo, “redução da carga disciplinar excessiva”, parece-me claro que as mudanças em matéria de conteúdos e organização curricular são bem mais complexas que as mudanças no sistema de avaliação. Importa que não se realizem de forma apressada e sem um consenso tão sólido quanto possível sobre conteúdos e calendário das mudanças que, reafirmo, me parecem necessárias.
Como muitas vezes afirmo, é tão importante "fazer as coisas certas como fazer certas coisas". Se bem repararmos nem sempre isto se verifica, mesmo na nossa acção individual. Em políticas públicas é ainda mais necessário.

DA INDIGNIDADE

Sem-abrigo vive debaixo da ponte e vai ser despejado

São coisas do mundo, do nosso mundo. Como alguém costuma dizer o grande problema da pobreza ... é a riqueza e a sua distribuição e da dimensão ética das lideranças.
A pobreza é uma indignidade que se aceita sem um sobressalto.
Às vezes, até à obscenidade.
Na verdade, no quadro actual exigir-se-ia às lideranças políticas uma dimensão ética que seja reguladora da inaceitável assimetria na distribuição da riqueza que sustenta e alarga situações de exclusão extrema e que minimizasse o os episódios de indigno favorecimento e amiguismo e quando não corrupção e delinqueência.
No entanto, a mediocridade genérica das lideranças que genericamente nos governam e governam o mundo não permite grande optimismo.
Eu sei que escrever sobre estas questões em espaços desta natureza tem alcance zero e presta-se a alguma demagogia, mas continuo convencido que é fundamental não deixar cair a preocupação com a a dignidade, a ética, a pobreza e a exclusão. Por isso, a insistência.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

O TEMPO ROUBADO. OUTRO DIÁLOGO IMPROVÁVEL

O estudo hoje divulgado no Público evidenciando o aumento do número de trabalhadores, do sector público e do sector privado, em risco de esgotamento e exposição a stresse profissional. A degradação das condições de trabalho verificada nos últimos anos com baixa de salários, aumento do risco de despedimento, competição e precariedade, ausência de perspectiva de carreira e segurança, entre outros factores, não será alheia a este aumento do mal-estar em quem trabalha.
A este propósito recupero um diálogo improvável.

Bom dia, venho apresentar uma queixa.
Com certeza, contra quem?
Contra muita gente.
Será, portanto, contra incertos. E apresenta queixa porquê?
Por roubo, roubaram-me tempo.
Muito bem, então roubaram-lhe tempo. Por favor, pode explicar um pouco melhor para eu poder registar a situação.
Eu já não tinha muito tempo porque nunca fui uma pessoa muito rica de tempo, mas o pouco que tinha roubaram-me. Fiquei sem tempo para estar com os meus filhos e brincar com eles. Este tempo faz-me muita falta, os miúdos andam tristes porque desde que me roubaram o tempo não consigo mesmo. Já não tenho tempo para descansar ou ler qualquer coisa como gostava de fazer. Não tenho tempo descansado para a minha mulher que também precisava do tempo que eu tinha e que partilhava com ela. No meu trabalho não tenho tempo para parar um minuto sem que alguém venha logo chamar a atenção. Fiquei sem o tempo que tinha para beber um copo com os meus amigos e trocar umas lérias que serviam para aliviar das coisas da vida.
Eu percebo o seu problema, mas como deve calcular não tenho tempo para queixas como as que apresenta.
Não tem tempo? Não me diga que também lhe roubaram o tempo. Até às autoridades, é demais.

DA SÉRIE A ARROGÂNCIA DA IGNORÂNCIA. Hoje em modo Paulo Rangel

E pronto, hoje está de serviço Paulo Rangel para anunciar e analisar o “desastre educativo” que já está a acontecer e vai abater-se sobre Portugal em virtude das alterações introduzidas pelo ME.
Paulo Rangel, tal como Guilherme Valente, José Manuel Fernandes ou Vasco Pulido Valente integram um restrito grupo de pessoas com um enorme volume de investigação e pensamento sobre o mundo da educação, em particular no ensino básico. É, aliás, conhecida a sua fortíssima e longa ligação a este universo, o seu conhecimento profundo da realidade pelo que a sua opinião é sempre um farol que nos ilumina.
Como já afirmei, as alterações verificadas têm virtualidades mas não são perfeitas e alguns aspectos merecem, aliás, sérias reservas sendo que matérias importantes como apoios a alunos e professores, conteúdos e organização curricular, autonomia das escolas, dimensão de turma e das escolas para evitar os mega-problemas criados pelos mega-agrupamentos, são apenas algumas das dimensões que exigem reflexão e ajustamentos.
No entanto a prosa desta gente, mascarada por referências pouco relevantes que procuram dar um carácter de “saber”, não passa de um conjunto de achismos ignorantes, preconceituoso e, evidentemente, dentro da agenda ideológica que é nítida apesar das máscaras.
Tal como os outros iluminados, Paulo Rangel de um total desconhecimento do que é a educação no ensino básico e secundário e num exercício de arrogância consentido pela ignorância perora o “desastre educativo”.
Como há dias escrevi, renovo a afirmação de que, sem particular contentamento, não tenho de há muito qualquer fidelização partidária e que tudo o que afirmo se inscreve no que, com base no que sei e penso, me parece ser um caminho de qualidade na educação para todos, sublinho, para todos. Também sei que tudo pode ser discutível e é assim que deve ser.
Não argumento relativamente ao texto de Paulo Rangel, primeiro porque já o fiz recorrentemente neste espaço e, segundo, porque quem pensa como ele recusa considerar qualquer outro entendimento ou argumentação. É assim porque decidem que é assim, a arrogância da ignorância.


segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

TRABALHO DE MÃE

Um dia destes estava à bica num café pequenino, daqueles de bairro, e ouvi, não pude deixar de o fazer, uma conversa entre duas mães que me pareceram Mães, isto é, mulheres que adoptaram verdadeiramente os filhos, porque há mulheres, poucas felizmente, que são mais prestadoras de serviços à infância do que propriamente mães.
Uma delas, mais faladora, mostrava alguma preocupação e inquietações relativamente à educação de um gaiato, pelo que percebi, de uns oito anos. Achei curioso o discurso e vou tentar recuperá-lo.
Pois é, muitas vezes, nem sei o que fazer, ele faz asneiras, vou para me zangar com ele e lembro-me que estou tão pouco tempo com ele que se me zangar, nem esse tempo me sabe bem. Eu acho que ele vem cansado da escola, está lá desde as 8, vai com o pai porque eu saio às 7 de casa, vou buscá-lo eu já perto das sete e meia, eu também venho cansada. Depois é a lida do jantar e do banho, estás a ver que tempo é que eu tenho para ele. Dizem que a gente devia brincar com os filhos, falar com eles, mas quando? Quase sempre é preciso ainda um tempo para os trabalhos de casa e também tenho que dar uma ajuda que ele já não se aguenta. Ao jantar, aproveitamos para ir vendo as notícias que é quando temos alguma hipótese. Por vezes ainda começo a falar com ele ao deitar mas ele adormece logo e eu também vontade não me falta. Este ano ainda não consegui ir às reuniões da escola, foram sempre a horas que eu não podia. Lá no trabalho se falto começam logo a fazer má cara, como as coisas estão, sabes como é. Não sei se aconteceu contigo, mas este ano pediram para comprar muitas coisas para a escola. Não foi nada fácil, está tudo muito caro, a gente tem que fazer alguns sacrifícios mas fica difícil, lá comprámos o computador, ele ficou contente e não quer outra coisa. Às vezes já me explica algumas coisas, eu percebo pouco daquilo mas ele fica contente de me explicar, mas é um bocadinho ao fim-de-semana, sempre com falta de tempo. Mas é a vida assim, a gente é mãe, é para isto não é, a gente é que quisemos que eles nascessem e ainda bem. E quando vejo o ar dele a dormir, bem quieto, até parece que está rir-se para dentro, fico contente e acho que vale a pena a luta dos dias.
Sabes o que ele me disse no outro dia já nem me lembro a que propósito, “mãe, se os miúdos pudessem escolher as mães, eu escolhia-te à mesma”.
Eu também, pensei para comigo.

DA SÉRIE, EU É QUE TENHO CARTÃO

Mais dois bons exemplos dos efeitos da partidocracia. É evidente que os partidos são um eixo central nos regimes democráticos. 
No entanto, a vida cívica não se pode esgotar na militância partidária.
Em Portugal, boa parte da praxis partidária, transformou a nossa vida política num teatro onde quase só cabem os iluminados, os homens e as mulheres que têm o cartão e um currículo construído a partir desse cartão.
A participação cívica ficou fortemente inibida e dificultada fora da acção da vida partidária e alguns entendem mesmo que nem não "pertence" não pode aceder a patamares elevados de participação cívica. É verdade que se toleram os "independentes", em qualquer Governo fica sempre bem algumas figuras "independentes" mas que se tornam rapidamente "dependentes" pois se a independência se mantiver o aparelho não gosta e reage. Os exemplos são fartos e elucidativos
As reacções de Maria de Belém, de Francisco Assis e outros figuras do PS face à candidatura de Sampaio da Nóvoa mostram com clareza que entendem a independência como uma espécie de pin que fica bem na lapela mas que não se aceita quando realmente existe.
Sampaio da Nóvoa não hostiliza os partidos, não pode nem deve, e também não lhe reconheço qualquer superioridade moral só porque não tem militância partidária mas não aceito que seja atacado justamente pelo facto de não a ter.
Não meus caros Maria de Belém e Francisco Assis, a candidatura que defendem não serve o país por ser de uma militante partidária, tal como Marcelo Rebelo de Sousa, não serve o país porque o projecto em que assenta é mais do mesmo com algum restyling, não tem potencial de mudança.
A candidatura de Sampaio da Nóvoa serve o País não porque não tem origem partidária mas, isso sim, porque apresenta um rumo novo para um tempo novo, o tempo novo que tão criticado é por Francisco Assis.
Percebe-se bem porquê, interessa-lhe bem mais o tempo velho.
Acontece que, lembro Camões, todo mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades.

DAS PRESIDENCIAIS. CONTINUA A CAMPANHA TÓXICA

Uma das ideias mais propaladas durante esta atípica campanha para as presidenciais tem sido a "ausência" de campanha por parte de Marcelo Rebelo de Sousa. Na verdade, tem sido evidente embora em mudança que Marcelo Rebelo de Sousa começou por se limitar a gerir a campanha que já tinha feito durante décadas na comunicação social.
Na sua perspectiva, quanto menos falasse melhor e a passadeira vermelha estaria estendida. Acontece que, sobretudo a partir do debate com Sampaio da Nóvoa que lhe correu mal, o cenário parece ter-se alterado e Marcelo sente que tem de "pedalar" mais do que pensava.
No entanto, a tal "ausência de campanha" é manifestamente exagerada.
Marcelo Rebelo de Sousa tem vindo a contar com a prestimosa ajuda de uma imprensa amiga que apoia com clareza um dos "seus" e dos seus interesses. Para além deste apoio são ainda frequentes os ataques ou a sua cobertura a Sampaio da Nóvoa o candidato que mais pode contrariar a pré-determinada vitória de Marcelo Rebelo de Sousa.
A primeira página de hoje do Correio da Manhã vem aumentar o nível tóxico desta campanha nos ataques pessoais a Sampaio da Nóvoa enquanto no Observador passa uma bem elaborada entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa que promove claramente a sua candidatura.
Não são exemplos novos, o Expresso tem também realizado um notável trabalho na promoção de Marcelo Rebelo de Sousa.
Sampaio da Nóvoa carrega o pecado original da independência e da cidadania e um posicionamento ideológico claro traduzido numa visão para Portugal e para os portugueses. 
Acredito que seja esse pecado original que o transforma num alvo constante mas também acredito que é essa independência, cidadania e visão que o tornarão Presidente da República.