Dois textos para a participação no Conselho Geral do ComRegras deste mês. Ordem de Trabalhos proposta pelo Paulo Guinote:
Ponto 1 - Como reanimar as salas de professores
Ponto 2 - Ensino profissionalizante ou vocacional no ensino básico
Conselho Geral: A Imprescindível Valorização dos Professores | Do Ensino Vocacional – Por José MorgadoPonto 1 - Como Reanimar as salas de professores.
Os valores, padrões e estilos e
vida das famílias alteraram-se significativamente fazendo derivar para a
escola, para os professores, parte do papel que competia(e) à família. Este
trabalho é realizado, muitas vezes, sem qualquer tipo de apoio ou suporte, com
cada professor entregue a si mesmo.
Importa ainda considerar o
impacto de variáveis relativas à estabilidade e segurança profissional, bem
como os modelos de carreira e progressão. Acrescem ainda questões como a
liderança e a autonomia das escolas variáveis importantes na construção de
climas positivos nas instituições educativas.
Também deve ser ponderada a
deriva política a que o universo da educação tem estado exposto nas últimas
décadas, criando instabilidade e ruído permanente sem que se perceba um rumo,
um desígnio que potencie o trabalho de alunos, pais e professores. Sucessivas
equipas ministeriais têm empreendido um empenhado processo de desvalorização
dos professores com impacto evidente nas relações que a comunidade estabelece
com estes profissionais
Com muita frequência os
professores são injustiçados na apreciações de muita gente que no minuto a
seguir à afirmação de uma qualquer ignorante barbaridade, vai, numa espécie de
exercício sadomasoquista, entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata,
depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores
e os seus problemas. Também são conhecidos os casos sucessivos de agressão e
insulto por parte de alunos e famílias.
A forma como os miúdos, pequenos
e maiores, vêem e se relacionam com os professores está directamente ligada à
forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem e isto contamina a
serenidade do processo de trabalho.
É também imprescindível que a
educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta política
baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos que se
assumem como seus representantes.
Na verdade, ser professor é uma
das funções mais bonitas do mundo, ver e ajudar os miúdos a ser gente, mas é
seguramente uma das mais difíceis e que mais respeito deveria merecer.
Os sistemas educativos com
melhores resultados são, justamente, os sistemas em que os professores são mais
valorizados, apoiados e reconhecidos.
Ponto 2 - Ensino profissionalizante ou vocacional no ensino básico
Os discursos sobre o chamado
ensino vocacional ou ensino profissional têm, do meu ponto de vista, sido
contaminados por alguns equívocos.
Estes equívocos estão presentes
quando se colocam questões como “sim ou não ao ensino vocacional?” Esta formulação emergiu de novo com a decisão
do actual Governo de finalizar o modelo de ensino vocacional instituído por
Nuno Crato no ensino básico defendendo que só no ensino secundário se deve
disponibilizar este tipo de oferta educativa.
Como muitas vezes tenho afirmado
é fundamental diversificar a oferta formativa, a diferenciação de percursos, de
forma a conseguir um objectivo absolutamente central e imprescindível, todos os
alunos devem atingir alguma forma de qualificação, única forma de combater a exclusão
e responder mais eficazmente à principal característica de qualquer sala de
aula actual, a heterogeneidade dos alunos. Aliás, a oferta formativa de
natureza profissional a alunos mais velhos, no âmbito do ensino secundário que
também está a acontecer, pode ser um passo nesse sentido desde que não
canalizado para os "que não servem" para a escola. Esta oferta tem
contribuído para baixar os níveis de abandono.
Assim sendo é claro que temos de
estruturar percursos de ensino com formação de natureza profissional.
A questão que se coloca é quando
deve ser disponibilizada esta oferta e para quem.
Relativamente ao modelo que
estava em vigor sempre considerei fortemente discutível, até num plano ético, a
introdução desta diferenciação tão cedo, aos 13 anos, e “obrigatória” para os
que chumbam. Por outro lado, aos 13 anos, apesar de se remeter a “decisão” para
um processo de orientação vocacional que a insuficiência gritante de recursos
não permite assegurar, que alunos decidem? Alguém vai decidir por eles.
Poucos sistemas educativos
assumem este entendimento e o facto de o ensino alemão, a inspiração de Nuno
Crato, colaboradores e admiradores, o admitir não é nenhuma chancela de
correcção do modelo como atestam as apreciações internacionais.
Na verdade, Relatórios da OCDE e
da UNESCO têm sustentado que a colocação dos alunos com piores resultados
escolares em ensino de carácter técnico e vocacional muito cedo em vez da
aposta nas aquisições escolares fundamentais, aumenta a desigualdade social.
É verdade e devastador que em
Portugal temos cerca de 150 000 alunos que chumbam em cada ano. Temos de
responder às causas deste enorme problema mas não podemos mascarar as
estatísticas empurrando os “maus” para percursos que “recebem” um rótulo de
“segunda” pois são percebidos por parte da comunidade como destinados aos menos
dotados.
Por outro lado este tipo de
oferta tem de ser adequado às comunidades educativas, voltamos à quase
inexistente autonomia das escolas, e dotado dos recursos e meios necessários o
que tem estado longe de acontecer.
Julgo que se deve sublinhar que
todos os alunos deverão cumprir uma escolaridade de 12 anos, a idade de entrada
no mercado de trabalho é aos 16 e isso deve ser considerado no desenho de
ofertas formativas que envolvam trabalho em empresas. Aliás, esta questão deve,
é uma forte convicção ser considerada quando se trata de alunos com
necessidades especiais que ao abrigo de uma coisa chamada CEI são em algumas
situações sujeitos a situações inaceitáveis que de educação, formação ou inclusão
têm nada, seja em espaço escolar, seja em espaço institucional ou laboral.
Também por isto o modelo que estava em vigor parece francamente desajustado e
foi generalizado sem que na altura tivesse terminado a sua avaliação.
No modelo que estava em vigor, os
alunos com insucesso, estamos a falar, presumo, de gente com capacidades
"normais" irão “obrigatoriamente para” o ensino vocacional. Sabe-se
que o insucesso escolar é mais prevalente em famílias mais desfavorecidas
embora também conheçamos as excepções, muitas. Assim, mantemos a velha ordem,
os mais pobres "destinados" preferencialmente para o trabalho manual,
os mais favorecidos preferencialmente para o trabalho intelectual como a UNESCO
reconhece.
A diferenciação dos percursos,
necessária e imprescindível mas, reafirmo, deve surgir mais tarde, disponível
para todos os alunos como se verifica na maioria dos sistemas educativos que se
preocupam com os miúdos, com todos os miúdos.
Uma nota final para lançar a
ideia de que a prazo, de forma bem cautelosa e sustentada se poderia considerar
a introdução no 3º ciclo de disciplinas opcionais mais vocacionadas para a
aquisição de competências e saberes a desenvolver em formação de natureza mais
profissionalizante durante o ensino secundário.
Sem comentários:
Enviar um comentário