Deixem que comece com uma pequena história real. Um rapaz da minha geração, meu colega de primária, que se ficou pelo escolaridade básica, aqui há uns anos e quando nos cruzámos no café à hora da bica, desabafou qualquer coisa como “lá me chamaram outra vez à escola por causa dos miúdos, disseram-me que tinha que resolver o problema porque eles já não sabem o que fazer”. Em seguida acrescentou, “Zé, já não sei o que lhes fazer, mais porrada já não sou capaz, só se os matar, eles que estudaram para professores não sabem o que fazer, eu também não”.
Esta história vem a propósito da ideia hoje defendida pelo presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais, o eterno Dr. Albino Almeida, de que os pais dos alunos “difíceis” deveriam ser responsabilizados pelos comportamentos dos seus filhos e quando fossem ineficazes, (não se sabe se por negligência ou por incompetência), poderiam até ver cortados os apoios sociais. O Dr. Albino diz ainda que é preciso “dar sinais” de que não há tolerância face à indisciplina. Acho muito interessante esta ideia e aqui ficam umas notas telegráficas e, certamente, discutíveis.
Começo por registar o pormenor da rápida associação dos miúdos indisciplinados a pais que recebem apoios sociais. Gosto também da ideia tão portuguesa de “dar sinais”, toda a gente defende que se diga ou faça alguma coisa para dar um sinal de … seja o que for. Bem vemos os sinais que nos são dados. A ideia da tolerância zero à indisciplina é certamente realista porque vivemos numa sociedade tranquila com lideranças e estilos de vida que são um modelo de civismo e bom relacionamento social. Só mesmo os filhos dos pobres para estragarem o paraíso em que vivemos.
Haverá certamente pais negligentes, tal como professores ou elementos de um qualquer grupo social ou profissional, mas a maioria dos pais, pobres ou não, cujos filhos criam problemas têm a maior dificuldade em lidar e resolver a questão. Se fosse fácil, num estabelecimento de educação onde todos os dias se cruzam dezenas de licenciados, mestres e doutores na área da educação, certamente se resolveria qualquer problema.
Como dizem os africanos “para fazer uma casa bastam 4 homens, para educar uma criança é preciso uma aldeia”. Respeitando cada papel, a responsabilidade é de todos, veja-se o caso trágico e recente da criança de Mirandela. Não estou a dizer com isto que os professores devem “resolver”, estou a dizer que muitos pais que conheço com crianças difíceis, SOZINHOS, não são capazes de resolver os problemas mesmo que lhes tirem os subsídios, (os que tiverem). O problema é que nas mais das vezes, os miúdos andam sós, abandonados e perdidos, os pais perdidos se sentem e os professores também se sentem perdidos com a imensidade de problemas com que lidam pela "simples" razão de que a maior parte do tempo os miúdos se encontram na escola, mesmo que não seja nas aulas.
A questão passa pelo entendimento da necessidade de recursos ajustados e suficientes, por modelos de organização mais eficazes, de respostas comunitárias, exteriores à escola que enquadrem os miúdos e complementem a escola, etc.
No fim, face a um pai comprovadamente negligente, então retire-se-lhe a guarda do miúdo, porque não passará a pai competente só porque lhe tiram um qualquer apoio social.
De qualquer forma esta ideia do Dr. Albino Almeida é uma ideia que muitas pessoas, lamentavelmente, aplaudirão. Os filhos dos outros são sempre o problema.
Sem comentários:
Enviar um comentário