O Público de hoje apresenta um excelente trabalho sobre estado da Educação elaborado a partir do Relatório do Conselho Nacional de Educação. De entre os vários aspectos considerados, o jornal deu destaque, incluindo a primeira página, ao facto de a quebra de emprego ter atingido fundamentalmente os jovens com qualificação superior. É sabido e percebem-se as razões, falta de novos empregos e precariedade, que as pessoas mais novas ocupam sempre uma fatia muito significativa do desemprego em Portugal, actualmente está em 30 %.
No caso mais particular dos mais novos vem sempre associada a situação dos que têm qualificação académica, ensino superior sobretudo, que não "lhes serve para nada". Como já tenho referido muitas vezes este tipo de discurso e o tratamento que boa parte da imprensa dá esta matéria causa-me alguma preocupação. Daí, de novo, algumas notas sobre isto.
Primeiro, os jovens licenciados não estão no desemprego por serem licenciados, estão no desemprego porque temos um mercado pouco desenvolvido e ainda insuficientemente exigente de mão de obra qualificada e estão no desemprego porque, por desresponsabilização da tutela, a oferta de formação do ensino superior é completamente enviesada distorcendo o equilíbrio entre a oferta e a procura.
No que respeita ao mercado de trabalho é, mais uma vez, de sublinhar que muitas empresas, sobretudo as de menor dimensão (as que asseguram cerca de 95% do emprego), provavelmente também devido ao baixo nível de qualificação dos empresários (é um dos mais baixos da UE e, estranhamente, nunca é associado a esta questão), revelam-se as mais avessas à contratação de mão de obra qualificada. Deve também sublinhar-se que este universo, pequenas e médias empresas, salvo algumas excepções de nicho, é também o segmento com menor inovação e desenvolvimento pelo que a absorção de mão de obra qualificada é ainda mais difícil.
No entanto e o trabalho do Público, felizmente, deixa isso claro, deve sublinhar-se que a taxa de emprego de indivíduos licenciados é superior à de outros grupos.
Por outro lado, se atentarmos em dados da OCDE e do INE, um trabalhador licenciado ganha em média mais 80% que alguém com o ensino secundário. Um indivíduo com a escolaridade básica recebe em média menos 57% que alguém com o Ensino Secundário. Apenas 7.5% de pessoas com o 9º ano recebem duas vezes mais que a média nacional enquanto licenciados a receber duas vezes mais que a média são quase 60%. Os filhos de pais licenciados têm 3,2 vezes mais probabilidades de obter uma licenciatura. Entre os 25 e os 34 anos, 19% dos jovens tem uma licenciatura enquanto na OCDE a média é 32%. Em Portugal, o número de licenciados é metade da média da União Europeia. Na franja entre os 35 e 44 anos a percentagem ainda baixa para 13%. Um indivíduo com apenas o básico corre um risco de pobreza 20 vezes superior ao de um indivíduo com um curso superior.
Quanto à questão da precariedade que atinge os jovens licenciados à entrada no mercado de trabalho, aspecto dramático e inibidor da construção de projectos de vida, é bom ser absolutamente claro, esta situação não atinge os jovens licenciados por serem licenciados, atinge toda a gente que entra no mercado de trabalho porque a legislação e regulação do mercado conduzem a esta situação, trata-se dos efeitos da agenda liberal e não o efeito da qualificação dos jovens, é bom que se entenda. Portugal é o segundo país da Europa, a seguir à Polónia, com maior nível de contratos a prazo.
Deste quadro, releva a absoluta imprudência da mensagem demasiado frequente de que a formação é irrelevante, o desemprego é o destino como muitas vezes esta questão é tratada.
A qualificação profissional, de nível superior ou não, é essencial como também é essencial a racionalidade e regulação da oferta do ensino superior e, naturalmente, a regulação eficaz do mercado de trabalho minimizando o abuso do recurso à precariedade.
Como sempre que abordo estas matérias, finalizo com a necessidade de, uma vez por todas evitar o discurso "populista" do país de doutores, continuamos com uma enorme probabilidade não cumprir a meta europeia para 2020 de 40% de licenciados no escalão etário 30-34 anos. Trata-se de um enorme erro e pode desincentivar a busca por qualificação o que terá consequências gravíssimas.
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