Creio que passou relativamente despercebido o Relatório da OCDE ontem divulgado sobre as desigualdades entre os países que a compõem, “Divided We Stand: Why Inequality Keeps Rising”, embora o JN e o Público coloquem hoje em primeira página que Portugal lidera nos países europeus o fosso existente entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres. Em termos globais Portugal ocupa o sexto lugar.
Esta constatação sobre o fosso enorme que ainda permanece na população portuguesa entre os mais ricos e mais pobres aparece numa época particularmente marcada por austeridade e dificuldades pesadíssimas. Por coincidência surge no mesmo dia em que se anuncia que os custos das taxas moderadoras nas urgências hospitalares e nos centros de saúde passam só para o dobro.
Temos cerca de 13% de desemprego afectando sobretudo jovens e trabalhadores mais velhos e com menor qualificação. É certo, como refere o DN, que também ocorre a entrega por ajuste directo de milhões de euros por parte do estado aos grandes escritórios de advogados, processo que se desenvolve sem escrutínio e transparência. Ontem relatava-se a enorme dificuldade no combate à corrupção e são por demais conhecidas as dificuldades e hesitações, por exemplo em legislar sobre o enriquecimento ilícito.
As instituições de solidariedade social registam aumentos exponenciais de pedidos de ajuda e apoio a que elas próprias, objecto de restrições nos recursos, não conseguem responder.
Todos os dias ouvimos referências à necessidade de equidade na repartição de dificuldades e sacrifícios. Na maior parte das vezes estas referências fazem parte da retórica política sem impacto significativo em políticas promotoras de justiça social. O ministro das Finanças consegue até falar num país abençoado por um consenso político de que o resultados está à vista e não é só de agora.
É neste caldo que se alimenta a manutenção do fosso entre os mais ricos e os mais pobres. A sua oscilação pode relativizar-se a questões de conjuntura.
A sua manutenção decorre de questões de estrutura, os modelos de desenvolvimento económico e social que têm sido mobilizados não conseguem, como sublinha o secretário-geral da OCDE, "O contrato social está a começar a deslaçar em muitos países. Este estudo desfaz as assunções de que os benefícios do crescimento económico se transmitem automaticamente aos mais desfavorecidos e que maior desigualdade favorece uma maior mobilidade social”, citado no Público.
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