Fecham-se maternidades pois existem demasiadas salas de parto sem qualidade e há que ser bem acolhido quando se chega ao mundo.
Fecham-se escolas pois parece que temos alunos a menos, professores a mais e há que racionalizar uma vez que, como bem sabemos, tudo o que nos rodeia é racionalmente organizado.
Fecham-se os putos na “escola a tempo inteiro” pois hão-de intoxicar-se até ficarem “agarrados”.
Fecham-se os adolescentes dentro de um ecrã pois assim não andam com “más companhias”.
Fecham-se cursos e escolas no ensino superior pois parecem não ter saídas profissionais e só se “deve estudar o que faz falta”.
Fecham-se empresas pois falta a produtividade e qualificação que, como se sabe, abundam nos explorados dos “mercados emergentes”.
Fecham-se urgências e serviços de saúde pois, se andarmos um bocadinho mais, ficaremos um bocadinho melhores.
Fecham-se aldeias pois há que promover desenvolvimento sustentado e com economia de custos.
Fecham-se os espaços habitacionais urbanos abertos pois os condomínios fechados promovem qualidade de vida
Fecham-se as pequenas queijarias e outras actividades do mesmo tipo pois temos que proteger a saúde do consumidor e, por isso, só comemos uma comida que é tão boa que nem o bicho lhe pega, como dizemos no Alentejo.
Fecham-se as capoeiras pois até as aves se constipam. Onde é que eu vou encontrar um peito de frango como o dos que a minha mãe criava. Nos de aviário parece-me tudo igual e com sabor a coisa nenhuma.
Fecha-se o pequeno comércio pois o que nós precisamos é de comprar tudo no mesmo local e encostado ao carro, e não de ouvir “Bom dia, tá bom Sr. Zé e a família? Então o nosso Benfica lá ganhou!”
Fecham-se os velhos nos lares pois sempre ficam ajuntadamente sós.
Fecham-se os olhos ao sofrimento dos outros. O outro ganhou uma estranha transparência, não o vemos e também… “já me chega a minha vida”.
Fecha-se a boca em vez de dizer pois… adianta alguma coisa?
Fecha-se a cabeça ao pensamento pois “deus por escárnio deu-me a inteligência” algo que só serve para nos incomodar.
Finalmente, alguém nos fecha numa memória. Esperamos.
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