terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A GENTE VAI VIVER DE QUÊ?

Segundo dados do IEFP hoje divulgados pela imprensa, no espaço de um ano o número de casais com ambos os elementos no desemprego duplicou, subiu 97.38 % para cerca de 5 600. Ainda de acordo com a mesma fonte estão a receber subsídio de desemprego 307 969 pessoas e o valor médio dos subsídios pagos voltou a baixar. Relembremos que a estimativa sobre o número total de desempregados está bem acima do dobro dos que recebem subsídio.
Aliás, há algumas semanas noticiava-se que existirão cerca de 250 000 pessoas inscritas nos Centros de Emprego que não recebem subsídio de desemprego. Há tempos foram divulgados alguns dados referindo-se a cerca de 200 000 pessoas que já terão desistido de procurar emprego e que não constam dos números do desemprego. Estas pessoas inactivas, devido à idade ou à falta de habilitações e em situação de desesperança, aumentariam, se fossem contabilizadas, a taxa de desemprego para 15,5% sabendo-se ainda, dados recentes, que 84% dos jovens com menos de 25 anos que estão desempregados não têm subsídio.
No final desta semana vai reunir-se o Conselho de Ministros para, entre outras matérias fechar o dossier relativo ao subsídio de desemprego alterando montantes e prazos, por imposição do Programa de Ajuda Externa, Esta coisa de chamar "Ajuda" a um negócio que nos empobrece embaraça-me.
Esta cenário levanta uma terrível e angustiante questão. Os milhares, muitos, de pessoas envolvidas vão (sobre)viver de quê?
Sendo de esperar um período recessivo e, portanto, sem crescimento, torna-se impossível criar a riqueza necessária e redistribuí-la de forma socialmente mais justa para minimizar esta tragédia.
É certo que em Portugal a chamada economia paralela corresponde a cerca de 24% do PIB e muita gente e muitas actividades estão envolvidas neste universo, de qualquer forma o potencial impacto social destes números é, no mínimo, inquietante.
Afirmo com frequência que uma das consequências menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de dois milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra. Curiosamente, até da área política mais próxima do actual governo surgem críticas às opções que têm vindo a ser assumidas.
A pobreza e a exclusão deveriam envergonhar-nos a todos, a começar por quem lidera, representam o maior falhanço das sociedades actuais.
A liderança que transforma é uma liderança com responsabilidade social e com sentido ético.

6 comentários:

Mafalda S. disse...

Concordo em pleno. De qualquer modo, jamais as pessoas podem baixar os braços e deixar de ir à luta (inclusive para o estrangeiro, como «alguém» resolveu sugerir). O problema é muitas vezes o desânimo que se apodera destas pessoas.

Só espero que esta crise mude realmente o paradigma que vigorou até aqui: somos um dos países com maior desigualdade social do mundo, a corrupção é elevada,a justiça ineficaz e, sobretudo,há muita falta de esperança no futuro e nas próprias capacidades (e responsabilidades) de cada um.

anónimo paz disse...

"Só espero que este crise mude realmente o paradigma que vigorou até aqui".

Fica-lhe bem essa credulidade.Mas não abuse dessa ingenuidade. Arrisca-se a ter que imigrar para ganhar seu sustento ou a pedir ajuda a uma qualquer instituição de caridade. Pode acontecer a qualquer um de nós.

Por quantas crises já passamos?! Alterou-se alguma coisa? Só se foi para pior...

"A GENTE VAI VIVER DE QUÊ?"

O povo português que é medricas tem tido sempre aquilo que escolheu.

Fazer o quê? É só ler nas entrelinhas...


saudações

Mafalda S. disse...

Caro Anónimo Paz

Gostaria de lhe explicar um pouco melhor o meu ponto de vista citando a Catarina Rivero e a Helena Marujo: “Como é possível que as academias universitárias e os cientistas não levem a sério a gravidade de uma tal incidência de pessoas crónica e profundamente tristes, e com vidas sem sentido, em que os «projectos de vida» se transformaram em «projectos de desistência e de morte»? Que tipo de comunidades não se INQUIETAM com o impacto possível nas novas gerações por serem educadas por adultos sem esperança e sem alegria?

Precisamos REANIMAR, dar nova alma a quem deixou de acreditar.”

Pessoalmente, acredito que as pessoas devem realmente de ter esperança num futuro melhor, mesmo que tudo pareça negro. Aliás, creio que os próprios Centros de Emprego deveriam incluir acções que passassem por trabalhar a motivação de pessoas desempregadas. As pessoas jamais devem desistir de si mesmas!

(continua)

Mafalda S. disse...

(continuação)
Achei realmente incómodo o «convite à emigração» do Sr. Primeiro-ministro. Enquanto líder de uma nação, e é só a minha opinião, deveria fazer de tudo para inspirar-nos a lutarmos por um futuro melhor, dentro do país que governa. Esse parecia mais ser um sinal de «desistência».

Contudo, em situações de desespero, em que ambos os elementos de um casal estão desempregados, o objectivo primordial deverá ser lutar pelo bem-estar da família. O problema existe e não irá desaparecer como que por artes mágicas, há pois que enfrentá-lo. Há que procurar todas as alternativas de emprego (e isto é um trabalho diário) ou a criação do próprio emprego, por maior que seja o embaraço poder-se-á recorrer ao RSI, e, em último caso, sim, ir para o estrangeiro. Por mais que custe, o objectivo a ter em mente deve mesmo ser o bem-estar da família.

E sim, pode acontecer a todos nós. Tenho já alguns familiares que emigraram e tenho vários amigos (na generalidade com curso superior) a viver no estrangeiro. Aliás, o meu próprio marido tem nacionalidade estrangeira. Conheço bem de perto estas situações, como há-de perceber.

Mafalda S. disse...

(continuação)
Considero igualmente que todos nós devemos não só falar, mas agir para que o nosso país melhore, bem como a situação das pessoas.

Posso referir-lhe algumas mudanças para melhor, da minha experiência pessoal.

Quando tive uma bebé e andava com ela de carrinho nos passeios, só aí me apercebi realmente das dificuldades que as pessoas com mobilidade reduzida tinham em deslocar-se (falta de rampas, sinais colocados no meio dos passeios, etc.). Voluntariamente, envolvi-me nesta situação e sugeri diversas alterações na zona onde vivo. A verdade, é que algumas alterações foram feitas e, com isso, sei que beneficiei alguém. Pode ter sido pouco, mas acreditei na possibilidade de um futuro melhor para aquelas pessoas (tive esperança), mas não bastou sonhar, fiz algo para ver mudanças (por menores que fossem). Envolvi-me voluntariamente noutras causas (com pessoas cegas, com cancro e pessoas com deficiências). Posso não ter feito o suficiente, mas sei que melhorei alguma coisa.

Estou numa posição em que posso «dar» emprego a alguém e na verdade não me interessa a idade ou a experiência, mas a competência. Privilegio quem realmente necessita e vi olhos de choro (sim, em entrevistas para emprego), transformarem-se em olhos alegres e constituírem-se em óptimos profissionais. Mas também vejo o oposto. Vejo o meu marido a pedir empregados e não lhe aparecer ninguém (sim, com boa remuneração, mas com um trabalho difícil). Vejo pessoas a faltarem injustificadamente e não demonstrarem outro interesse que não seja o vencimento ao fim do mês. Neste país vê-se de tudo… como em muitos outros.

Quanto às crises, a história demonstra que vivemos melhor do que há muitas crises atrás. A crise pode trazer mudanças positivas, negativas ou até ambas. Mas há que aproveitá-la para lutar para melhorar; não perder a capacidade para sonhar, mas passar à acção (não acredito que os sonhos sem acção sejam muito viáveis).

E pronto é isto. Posso ser ingénua como me chamou, mas não deixo de ter esperança e não quero baixar os braços, porque acredito numa outra citação que lhe deixo, desta vez da Madre Teresa de Calcutá: "O que eu faço, é uma gota no meio de um oceano. Mas sem ela, o oceano será menor."

As melhores felicidades,
Mafalda

anónimo paz disse...

Senhora Mafalda S.

Eu acredito incondicionalmente na solidariedade humana voluntária e incógnita tal como a Senhora a pratica. E sonha...

"O HOMEM É DO TAMANHO DO SEU SONHO"
Fernando Pessoa.

MAS...

"A TERRA PROVÊ O BASTANTE PARA SATISFAZER A NECESSIDADE DE TODOS OS HOMENS, MAS NÃO A GANÂNCIA DE TODOS OS HOMENS"
MAHATMA GANDHI

Um bom ano e...

saudações