A partir de agora e muitas vezes
por um período prolongado, tal como nos movimentos migratórios, as cidades com
ensino superior começam a ser invadidas por uma população curiosa, os caloiros.
Andam aos bandos pelas ruas, com um ar patético, mascarado de divertido,
enquadrados por um pessoal jovem vestido de negro, trajados, como gostam de dizer. É o
tempo das praxes aos que chegam ao ensino superior.
Não sei se em resultado de alguns
episódios lamentáveis, até com consequências graves do ponto de vista físico o
que levou a tutela e as instituições a "desencorajar" ou mesmo
proibir as praxes, recordo o Programa Praxe +, se em resultado das escolhas dos
próprios estudantes ou em resultado dos esforços do MATA (Movimento
Anti-Tradição Académica), registo que as “actividades” de praxe têm vindo a ser
mais brandas apesar de alguns excessos que sempre se verificam. No entanto, ao que se vê na imprensa, já se observa o que ão pode acontecer, humilhar não rima com integrar.
Fico satisfeito com esta
alteração, sobretudo se corresponder a decisões assumidas pelos estudantes no
seu conjunto e não fruto de ameaças ou determinações da tutela ou da direcção
das diferentes escolas, estamos a falar de gente crescida e, espera-se,
autodeterminada.
De facto, como regularmente aqui
afirmo partindo de um conhecimento razoavelmente próximo deste universo, a
regulação dos comportamentos nas praxes tem-me parecido indispensável.
Parece-me ainda importante que os dispositivos de regulação das praxes integrem
o respeito por posições diferentes por parte dos estudantes sem que daí
advenham consequências implícitas ou explícitas para a sua participação na vida
académica que, frequentemente, não sendo "enunciadas", são,
evidentemente, praticadas.
Os repetidamente referidos
"Códigos de Praxe", nas suas diferentes designações, não parecem
suficientes para inibir abusos dos comportamentos e as consequências negativas
sobre os não aderentes às praxes.
Na verdade, de forma
aparentemente tranquila coexistem genuínas intenções de convivialidade,
tradição e integração na vida académica com boçalidade, humilhação e violência
sobre o outro, no caso o caloiro, a “besta” como elegantemente é designado.
Tenho assistido e todos temos conhecimento de cenas absolutamente deploráveis
por mais que os envolvidos lhes encontrem virtudes.
Apesar dos discursos dos seus
defensores, continuo a não conseguir entender como é que, a título de exemplo,
humilhar rima com integrar, insultar rima com ajudar, boçalidade rima com
universidade, abusar rima com brincar, ofender rima com acolher, violência rima
com inteligência ou coacção rima com tradição. Devo, no entanto sublinhar que
não simpatizo com estratégias de natureza proibicionista, sobretudo em matérias
que claramente envolvem valores. Nesta perspectiva, parece-me um passo positivo
uma anunciada iniciativa de regulação envolvendo diferentes academias.
Quando me refiro a esta questão,
surgem naturalmente comentários de pessoas que passaram por experiências de
praxe que não entendem como negativas, antes pelo contrário, afirmam-nas como
algo de positivo na vida universitária. Acredito e obviamente não discuto as
experiências individuais, falo do que assisto e conheço.
A minha experiência
universitária, dada a época, as praxes tinham entrado em licença sabática, por
assim dizer, foi a de alguém desintegrado, isolado, descurriculado, dessocializado
e taciturno porque não acedeu ao privilégio e experiência sem igual de ser
praxado ou praxar. Provavelmente, advém daí a minha reserva.
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