Lê-se no Público que, no âmbito da revisão da versão IV do Diagnosis and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM) da responsabilidade da Associação Americana de Psiquiatria, a referência nesta matéria para a generalidade da comunidade científica, será redefinido o diagnóstico de autismo. Pretende-se com esta revisão minimizar uma espécie de “surto” diagnóstico, em alguns casos “sem haver quadro clínico que o justifique”. A pedopsiquiatra Áurea de Ataíde refere ainda que “Não podemos esquecer que pode ser muito grave para uma família a realização ‘leviana’ de um diagnóstico como este, que tem um peso emocional, familiar e social importantíssimo”.
Já em diferentes circunstâncias tenho referido no Atenta Inquietude a preocupação com a facilidade com se colocam rótulos, diagnósticos, nas crianças.
Se bem repararem, de há uns tempos para cá uma boa parte dos miúdos e adolescentes ganharam uma espécie de prefixo na sua condição, o "dis", transformaram-se em (dis)miúdos.
A diversidade é enorme, ao correr da lembrança temos os meninos que são disléxicos em gama variada, disgráficos, discalcúlicos, disortográficos ou até distraídos.
Temos também as crianças e adolescentes que têm (dis)túrbios. Estes também são das mais diferenciadas naturezas, distúrbios do comportamento, distúrbios da atenção e concentração, distúrbios da memória, distúrbios da cognição, distúrbios emocionais, distúrbios da personalidade, distúrbios da actividade, distúrbios da comunicação, distúrbios da audição e da visão, distúrbios da aprendizagem ou distúrbios alimentares.
Como é evidente existem ainda os que só fazem (dis)parates e aqueles cujo ambiente de vida é completamente (dis)funcional.
Pois é, há sempre um "dis" à espera de qualquer miúdo e senão, inventa-se, "ele tem que ter qualquer coisa".
Agora um pouco mais a sério, sabemos todos que existem um conjunto de problemas que podem afectar crianças e adolescentes mas, felizmente, não tantos como por vezes parece. Inquieta-me muito a ligeireza com que frequentemente são produzidos "diagnósticos" e rótulos que se colam aos miúdos e dos quais eles dificilmente se libertarão. Neste sentido a revisão do DSM parece ser um passo positivo relativamente ao espectro de autismo.
Esta matéria, avaliar e explicar o que passa com os miúdos e adolescentes, exige um elevadíssimo padrão ético e deontológico além da óbvia competência técnica e científica. Não se pode aligeirar, é "dis"masiado grave.
Para ilustrar, uma pequena história, uma gaiata de nove anos que já carrega um rótulo de "disléxica", dizia com um ar entre o esperançado e o envergonhado, "a minha professora diz que há meninos lá na sala que dão mais erros que eu e não são disléxicos, eu é que sou".
Elucidativo.
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