quinta-feira, 5 de maio de 2011

A SOPA DE BELDROEGAS, O SEGREDO E A BOA ACÇÃO

Aqui há uns anos, no Meu Alentejo, estava uma mesa grande para almoço à volta da qual estavam alguns adultos e gaiatos que se entretinham nas lérias à espera da petiscagem.
Quando me preparava para servir uma bela sopa de beldroegas, um dos gaiatos, o Miguel, põe-se em cima dos seus oito anos e discretamente informa-me que precisava de me dizer um segredo.
Poisei a terrina, como sabem um segredo de um miúdo é algo de prioritário e, sendo um segredo, fomos de mansinho para a cozinha, mais longe de ouvidos indiscretos.
O Miguel, compõe um ar seriíssimo e numa voz baixa mas firme diz-me, "Zé, não gosto de sopa". Devo dizer que fiquei siderado, não imaginava que se pudesse não gostar de uma sopa, para mais de beldroegas apanhadas tenrinhas nas caldeiras de rega das laranjeiras do Meu Alentejo.
Mas um segredo é um segredo e assim deve continuar. Combinámos então que eu colocaria uma quantidade mínima de sopa no prato do Miguel que, enquanto toda a gente comia, também pegaria na colher e mexeria no prato que eu depois levantaria calmamente e com o segredo bem protegido. Devo dizer que correu na perfeição, tal e qual fora planeado. Creio que ninguém à mesa reparou que o Miguel não tinha comido sopa.
Quando recolhi os pratos da sopa, o Miguel estendeu-me o dele com um sorriso enorme e fez uma das piscadelas de olho mais cúmplices que alguma vez vi.
Senti-me lindamente, a sopa de beldroegas estava excelente, o segredo do Miguel continuou segredo e eu fiz uma boa acção.
Só hoje, passado tanto tempo, me atrevo a dizer, o Miguel não gosta da sopa. Mas desculpa lá Miguel, não sabes o que perdeste, a sopa de beldroegas estava uma delícia.

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