O editorial do Público levanta
uma questão pertinente a partir do momento em que o ME disponibiliza
gratuitamente manuais escolares, apenas os manuais, e exige a sua devolução de
forma a garantir a sua reutilização.
Era claro que tal objectivo seria
muito dificilmente atingido.
Quem tem mais do que um filho em
idades próximas tem a perfeita consciência da dificuldade de reutilizar manuais
com as óbvias e significativas consequências económicas.
A elaboração dos manuais
escolares, um importante nicho de mercado, sempre considerou a sua não
utilização. De facto, a quantidade e o tipo de trabalho que os alunos realizam no manual impede a sua
reutilização. Acresce que as mudanças frequentes quer nos conteúdos
curriculares, quer nos manuais aprovados nos diferentes agrupamentos e escolas são também
um obstáculo à sua reutilização.
Neste sentido, a gratuitidade dos
manuais escolares e a sua reutilização exigem um outro olhar sobre os manuais, considerando
os conteúdos e a utilização. As práticas já desenvolvidas em muitas salas de
aula e a experiência de outros sistemas educativos mostra que é possível apesar
da evidente resistência dos donos do mercado do livro escolar.
Assim, e com tantas vezes tenho
afirmado creio que o caminho a percorrer em matéria de manuais escolares
deveria incluir estratégias que tentassem contrariar o que costumo designar por
uma excessiva “manualização” do ensino que emerge de práticas pedagógicas pouco
diferenciadas muito decorrentes de conteúdos curriculares demasiado extensos,
prescritivos e normalizadores. Seria desejável atenuar a fórmula predominante,
o professor ensina com base no manual o que o aluno aprende através do manual
que o pai acha muito importante porque tem tudo o que professor ensina.
O número de alunos por turma é
também um facto contributivo para este cenário. A anunciada redução do número
de alunos por turma ao abrigo de uma verdadeira autonomia das escolas e dos
professores, permitiria a alunos e professores um trabalho de pesquisa e
construção de conhecimentos com base noutras fontes incrementando, por exemplo,
a acessibilidade a conteúdos e informação diversificada que as novas
tecnologias oferecem. Sem surpresa este entendimento é um dos eixos da reforma
em curso na Finlândia.
A construção dos próprios
manuais, tendo um outro papel no trabalho de alunos e professores pode evitar a
sua utilização como suporte do trabalho dos alunos e, assim, não impedir a sua
reutilização. Aliás, o mercado também é fértil em materiais como “cadernos de
actividades”, “fichas”, “Cds”, etc. que são suportes para o trabalho dos alunos
A questão é que os manuais
escolares constituem um importantíssimo nicho de mercado potenciado por esta
enorme quantidade de materiais que os acompanham os manuais. Como exemplo é de registar
que a gratuitidade dos manuais para o 1º ano envolve um montante de três
milhões de euros. É um nicho de mercado com muito e peso os donos deste mercado
dele não querem abdicar, recebam das famílias ou recebam do Estado.
Como é evidente, a resistência à
reutilização é grande e dificulta o surgimento de outro tipo de manuais ou
mesmo o seu abandono.
É também sabido que a reutilização
de manuais é prática já verificada em muitos países.
Os manuais escolares são
disponibilizados pelas escolas e devolvidos pelos alunos no final do ano
lectivo ou da sua utilização. As famílias são responsabilizadas pelo seu
eventual dano ou extravio e ficando, assim, com "folga" para
aquisição de outros materiais, livros por exemplo, um bem com pouca presença em
muitos agregados familiares.
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