A minha adolescência decorreu na
segunda metade dos sessenta. Alguns lembrar-se-ão, eram tempos social e
culturalmente fechados, sombrios, para muitos de nós. O que acontecia fora,
ideias, tendências, cultura, etc., dificilmente chegava à maioria das pessoas e
o pouco que conhecíamos surgia, invariavelmente mais tarde.
No entanto, este cenário não se
aplicava ao meu amigo Zé Manel. Nunca percebemos como, naqueles tempos não era
fácil, mas o Zé Manel andava sempre mais à frente que nós. Falava-nos de
ideias, factos ou modas que estavam a desenvolver-se no estrangeiro e que só
algum tempo depois, e nem sempre, nós conhecíamos.
Mostrava-nos música, nomes para
nós desconhecidos, que só mais tarde se ouviam, nem todos, de forma mais
alargada. Usava roupa diferente de nós, enfrentando a reprovação activa de
muitos adultos.
Quando lhe perguntávamos como
tinha acesso a tudo aquilo, respondia entre o gozo e o mistério, “eu vivo no
futuro”, quanto maior era a nossa curiosidade, mais o Zé Manel insistia, “vivo
no futuro, as coisas lá são assim”.
O final do liceu separou-nos, a
alguns até geograficamente. Nunca mais vi o Zé Manel. De vez em quando,
perguntava a antigos companheiros se sabiam dele. Estranhamente, ninguém soube
mais nada, nunca.
Será que o Zé Manel foi,
definitivamente, viver para o futuro? Ele parecia tão pouco interessado no
presente.
Há muitos rapazes e raparigas
assim, pertencem a um tempo em que não vivem. E sofrem com isso.
Sem comentários:
Enviar um comentário