O Público faz hoje referência a um estudo com uma escala significativa divulgado na Lancet Psychiatry evidenciando que o bullying assume impactos negativos mais significativos no bem estar psicológico dos adolescentes aos 18 anos que maus tratos de adultos sofridos na infância. Mostra ainda que crianças maltratadas na infância são vítimas
potenciais de bullying em adolescentes.
Esta constatação e o conhecimento
de que, caso de Portugal, diferentes
estudos sugerem cerca de um terço dos adolescentes entre os 13 e os 15 anos é
vítima de bullying sublinham a particular importância deste fenómeno com uma
particular preocupação com a subida significativa do cyberbullying.
Sabe-se também que a ocorrência
de situações de bullying é bem superior ao número de casos que são
relatados. Uma das características do fenómeno, nas suas diferentes
formas, incluindo o emergente cyberbullying, é justamente o medo e a ameaça de
represálias a vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a queixa pelo
que ainda mais se justifica a atenção proactiva e preventiva de adultos, pais,
professores ou funcionários.
Estima-se que nos últimos três anos
o fenómeno tenha provocado pelo menos 12 suicídios nos Estados Unidos. Recordo
ainda que foi anunciado em 2013 que a Direcção-geral de Saúde iria promover em
várias escolas do país um projecto de prevenção do suicídio dirigido a
adolescentes. Felizmente, a taxa de suicídio adolescente em Portugal não é
muito alta, embora um só caso já seja uma tragédia. No entanto, os
comportamentos de natureza auto-destrutiva são bem mais prevalentes do que se
pensa. Em algumas circunstâncias, mais tarde estes comportamentos podem
culminar em suicídio.
Neste contexto e dada a gravidade
e frequência com que ocorrem estes episódios é imprescindível que lhes
dediquemos atenção ajustada, nem sobrevalorizando, nem tudo é bullying, o que
promove insegurança e ansiedade, nem desvalorizando, o que pode
negligenciar riscos e sofrimento.
Neste universo importa considerar
dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a
intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez
e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou
repressão e punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e
ligeireza a propósito do bullying, as vozes a clamar por castigo têm do meu
ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de
prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso
disso.
Relembro que o Portal sobre o
bullying teve durante o seu primeiro ano de funcionamento cerca de 650 000
visitas e respondeu a 700 solicitações.
Esta utilização mostra a
necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais
para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio.
Lamentavelmente, este serviço é exterior às escolas e ilustra a falta de resposta
estruturada e global do sistema educativo, para além das insuficiências na
formação de técnicos e de professores sobre esta complexa questão, desde logo
para o seu reconhecimento. A existência de dispositivos de apoio sediados nas
escolas, com recursos qualificados e suficientes, designadamente no que
respeita aos assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços
escolares, é, a par de ajustamentos nos modelos de organização e funcionamento
das escolas e de uma séria reestruturação curricular, uma tarefa urgente.
Do meu ponto de vista, o
argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são
incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil
dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes
evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal estar a que, por vezes, não
damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não
devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser trágico. Como o estudo hoje referenciado demonstra.
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