A imprensa de hoje faz referência
a um Programa da responsabilidade da Universidade de Coimbra, “Anos Incríveis”, que envolverá 60 jardins-de-infância implantados em meios sociais desfavorecidos e
que, através do envolvimento dos pais, educadores e técnicos de saúde, visa
prevenir problemas de comportamento e promover competências sociais nas
crianças.
Assenta na chamada parentalidade
positiva, disponibilidade e tempo para os pais interagirem com os filhos,
privilegiar o elogio em detrimento da crítica, definição consistente de regras
e limites, envolvimento dos educadores e técnicos de saúde no trabalho com as
famílias, etc.
O Programa, já ensaiado em
Portugal e com origem nos Estados Unidos revela bons resultados na prevenção do
“mau comportamento” das crianças bem como no minimizar de “problemas de
comportamento” já instalados.
Este tipo de iniciativas é
essencial, deve ser estudado e, desejavelmente generalizado, a grande falha de
múltiplas acções que oferecem bons resultados mas que só se mantêm enquanto
dura o “Projecto” ou o “programa”.
Algumas notas sobre pais e
crianças pequenas.
Acontece com razoável frequência quando
se assiste ou se comentam alguns comportamentos dos miúdos, sobretudo quando se
trata de birras ou a imposição de desejos ou vontades aos adultos, quase sempre
os pais, surgirem explicações como “é dos mimos”. Neste tipo de diálogos,
“mimos” é entendido quase como sinónimo de “afecto”, “amor”, “gostar”, etc.
Tal justificação costuma depois
servir para se afirmar a ideia de que as crianças hoje em dia têm muitos mimos
que as estragam, dito de outra maneira, têm “afecto” a mais ou ainda “gosta-se
de mais” das crianças. Estes discursos parecem-me sempre muito curiosos estes
discursos pois assentam, do meu ponto de vista, num enorme equívoco.
As crianças, de uma forma geral,
não terão afecto ou elogios a mais, pode existir “afecto a mais” "elogio
excessivo" mas se for excessivo é mau afecto é mau elogio. Não é mau por
ser muito, é mau porque asfixia, oprime, não deixa que os miúdos cresçam,
distorce a percepção da criança de si própria. Mas não é este o tipo de
situações que leva as pessoas a falar dos mimos ou dos elogios a mais.
Insisto, as crianças não têm
elogios ou mimos a mais, têm nãos de menos, os adultos sendo quase sempre
capazes de dar os mimos e os elogios, muitas vezes mostram-se incapazes de dar
os nãos, de estabelecer os limites e as regras que, como sempre digo, são tão
necessárias às crianças como respirar e alimentar-se.
Esta dificuldade dos adultos em
oferecer os nãos aos miúdos, decorre muitas vezes de alguma desconforto
culpabilizante sentido com as circunstâncias e estilos de vida que inibem o
tempo e a disponibilidade que desejariam ter para os filhos. Ficando sem nãos,
muitas crianças, a coberto do afecto ou dos elogios dos pais, transformam-se em
pequenos ditadores que infernizam a vida de toda a gente, a começar por si
próprios.
Mas não têm mimos, afecto,
elogios a mais. Têm, repito, nãos a menos.
Por outro lado, também é muito
frequente falar dos comportamentos das crianças constatando que “não páram”,
são “agitadas”, “só gritam”, etc.
Por vezes digo que as crianças gritam
muito e agitam-se porque nós, por várias razões, ficamos mais surdos, só quando
gritam as ouvimos e só quando se agitam” reparamos nelas. E os miúdos são
inteligentes, percebem que assim é e agem em conformidade.
Neste contexto fomentar e ajudar
os pais a desenvolverem comportamentos de disponibilidade escuta dos miúdos, a
assumirem com firmeza e sem culpa a necessidade de definir regras e limites, de
elogiar mostrar afecto sem que se sintam a dar “mimos” a mais e que “estragam”
as crianças só pode ser um bom trabalho.
De pequenino é que se torce o
destino.
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