O Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia entendeu
não aceitar as candidaturas de seis cidadãos que encabeçavam listas para
assembleias de freguesias do concelho. De acordo com o Público, a decisão
considera que a leitura da lei da limitação de mandatos, em conjugação com o
artigo 118º da Constituição (princípio da Renovação)”, "só pode ser o de
proibir" a candidatura a qualquer órgão autárquico e não apenas nas
autarquias. A mesma decisão já tinha sido tomada há dois dias pelo Tribunal de
Santa Maria da Feira relativamente a um candidato a uma freguesia e, estou a acrescentar o texto a 12 de Agosto, também os Tribunais de Vila Real de Santo António e Guarda rejeitaram candidaturas em Castro Marim, Guarda e Tavira embora o Tribunal de Évora tenha aceite uma situação da mesma natureza.
Apesar de saber que existirão recursos destas decisões
e de aguardar com expectativa a decisão de outros Tribunais a conhecer na
próxima semana considero que são genericamente boas notícias face a uma dança de cadeiras tão
despudorada como atentatória da ética e da lei e justifica a insistência nesta
matéria que também tem a ver com a saúde ética da nossa vida cívica que tão
maltratada tem sido.
As decisões impeditivas das candidaturas
radicando na legislação parecem-me, talvez por não ser jurista, as mais óbvias
das decisões e um indicador importante para a dança
das cadeiras em curso e que produz o deprimente espectáculo a que vamos assistindo na
tentativa de promover e dar cobertura às migrações de "dinossauros"
autarcas que assim se eternizam ao serviço da partidocracia.
A lei de limitação de mandatos parece clara na
sua intenção e formulação mas, como sempre, se não serve os interesses partidários
de ocasião, torce-se a lei, é simples, e ela passa a dizer o que nós queremos
que ela diga. Até tivemos um episódio, de uma mestria insuperável, a
"descoberta" feita em Belém de que se trocaram os "da"
pelos "de" entre a lei aprovada na AR e a publicada no DR e, claro,
avolumou-se o alarido.
Não sou jurista nem constitucionalista, mas como
cidadão parecem-me razoavelmente claras duas ideias, é saudável e desejável do
ponto de vista, político, democrático e ético que se limitem os mandatos de
cargos políticos exercidos pelo mesmo cidadão e a Constituição estabelece o
mesmo entendimento no artigo 118º, "Princípio da Renovação"
afirmando, "Ninguém pode exercer a título vitalício qualquer cargo
político de âmbito nacional, regional ou local", ponto.
Parece-me, pois, claro, que qualquer lei que
cumpra a Constituição, como não pode deixar de ser, não pode aceitar e admitir
que um cidadão, desde que vá saltando de município em município, possa ocupar a
função de presidente de câmara, por exemplo, a título vitalício. Foi esta a obvia
base da decisão agora conhecida dos dois Tribunais que já se pronunciaram sobre
candidaturas “manhosas”.
É este entendimento também ele manhoso,
inconstitucional, que a maioria dos partidos representados na Assembleia da
República assume na defesa dos seus interesses locais onde impera amiguismo,
aparelhismo e pagamento de favores de natureza variada. No entanto, deve
sublinhar-se que mesmo dentro dos partidos que enquanto tal "torcem"
a lei, interpretando-a no restrito sentido dos seus interesses, existe muita
gente que sustenta o óbvio, autarcas com três mandatos cumpridos não podem
candidatar-se.
No entanto, em termos de saúde ética da nossa
vida cívica, o preço deste pântano é altíssimo e troca-tintas como Seara, Menezes,
Moita Flores e outros menos mediáticos, não querem entender isso. O despudor e
a partidocracia capturaram e debilitaram a qualidade da democracia, a confiança
e o envolvimento cívico dos cidadãos. Aliás, as próximas eleições serão as que terão
mais candidaturas de cidadãos e movimentos fora dos aparelhos partidários.
Este é, também, uma dimensão enorme da crise, das
crises. Talvez as decisões dos tribunais no sentido de se pronunciarem contra a
possibilidade destes troca-tintas se candidatarem sejam um sinal de que algo
pode mudar embora tudo venha a ser decidido no Tribunal Constitucional.
Como diz o Velho Marrafa no Meu Alentejo, "Deixe
lá ver". Até à decisão final tenho alguma esperança.
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