segunda-feira, 12 de agosto de 2013

SINALIZADOS, REFERENCIADOS MAS ... A TRAGÉDIA ESPREITA

Segundo dados da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens, a sinalização de casos de maus tratos a menores regista um aumento significativo no primeiro semestre deste ano, verificando-se um aumento nos casos detectados nos serviços de pediatria dos hospitais.
O Presidente da Comissão, o Juiz Armando Leandro, refere que esta "sinalização" é "algo de muito positivo", revelador de uma "consciência pública mais aprofundada" embora tenhamos que ser mais eficazes.
Também me parece meu caro amigo Armando Leandro, como todos sabemos, precisamos de ir bem mais longe nesta matéria.
Em muitas circunstâncias relatadas de maus-tratos e negligência encontramos com demasiada frequência que essas crianças estavam "sinalizadas", "referenciadas" mas ... os episódios aconteceram.
De há muito e a propósito de várias questões, que afirmo que em Portugal, apesar de existirem vários dispositivos de apoio e protecção às crianças e jovens e de existir legislação no mesmo sentido, sempre assente no incontornável “supremo interesse da criança, não existe o que me parece mais importante, uma cultura sólida de protecção das crianças e jovens. Poderíamos citar a insuficiência e falta de formação de juízes que se verifica nos Tribunais de Família, as frequentemente incompreensíveis decisões ou demoras em casos de regulação do poder parental, etc.
Temos também em funcionamento as Comissões de Protecção de Crianças e Jovens que procuram fazer um trabalho eficaz mas em difíceis circunstâncias, para além da falta de agilidade processual na articulação das múltiplas entidades envolvidas como também é frequente entre nós e terá acontecido nestas duas situações dramáticas.
É verdade que existem situações que se desenvolvem, por vezes, de forma extremamente rápida e imprevisível, em ambos os casos parece existir nas mães alguma perturbação do foro da saúde mental o que torna tudo ainda mais difícil, mas também exige maior celeridade e atenção.
No entanto, boa parte das Comissões têm responsabilidades sobre um número de situações de risco ou comprovadas que transcendem a sua capacidade de resposta. A parte mais operacional das Comissões, a designada Comissão restrita, tem muitos técnicos a tempo parcial. Tal dificuldade repercute-se, como é óbvio, na eficácia e qualidade do trabalho desenvolvido, independentemente do esforço e empenho dos profissionais que as integram. O Ministro Nuno Crato anunciou há tempos o reforço das Comissões com professores excedentários, vamos ver se tal acontece ou é apenas mais uma promessa em modo Crato, isto é, não é para cumprir.
Este cenário permite que ocorram situações, frequentemente com contornos dramáticos, envolvendo crianças e jovens que, sendo conhecida a sua condição de vulnerabilidade não tinham, ou não tiveram, o apoio e os procedimentos necessários. Ouve-se então uma das expressões que me deixam mais incomodado, a criança estava “sinalizada” ou “referenciada” o que foi insuficiente para a adequada intervenção. Em Portugal sinalizamos e referenciamos com relativa facilidade, a grande dificuldade é minimizar ou resolver os problemas referenciados ou sinalizados.
Por isso, sendo importante registar a menor tolerância da comunidade aos maus tratos aos miúdos, também será importância que desenvolva a sua intolerância face à ausência de respostas e surgimento de tragédias como a de Alenquer em que uma mãe tirou a vida a duas crianças que estavam "sinalizadas" e de que hoje se conheceu a sentença judicial. 

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