Sem surpresa o Presidente da República promulgou
o diploma que alarga o horário de trabalho dos funcionários da administração
pública para as 40 horas semanais. Dado que os partidos da oposição, bem como os sindicatos
do sector, anunciaram a intenção de requerer a fiscalização sucessiva, importa
aguardar a decisão do Tribunal Constitucional, algo que já nos vamos habituando
com variadíssimas propostas legislativas apresentadas pelo Governo.
Algumas notas, de novo, sobre esta questão, o
aumento da carga horária.
Esta medida, aparentemente simpática aos olhos de
quem diaboliza os privilegiados funcionários públicos, alvos preferenciais do
saque a que vamos assistindo, não terá, como reconhecem os especialistas,
impacto significativo ao nível da produtividade e é pouco amigável na promoção
de emprego ou, se preferirem, no combate ao desemprego como também alguns técnicos
já alertaram.
Como tenho vindo a afirmar, apesar de não ser um
especialista, apenas um cidadão que procura estar atento, creio que a abordagem
da relação entre o tempo de trabalho, a competitividade a produtividade é
contaminada por alguns equívocos.
É minha convicção de que o problema da
produtividade é, fundamentalmente, uma questão de melhor trabalho e não de mais
trabalho. Aliás, conhecem-se estudos nesse sentido e podemos reparar o que se
passa noutros países com cargas de horário laboral semelhantes à nossa.
Lembram-se certamente de há alguns meses, a propósito de umas afirmações da
Senhora Merkel sobre os "preguiçosos" do sul da Europa, ter sido
divulgado, creio que na imprensa o I referiu os dados, um relatório sobre a
duração do trabalho na União Europeia verificando-se que, contrariamente a
alguns entendimentos, a duração do trabalho em Portugal é a terceira mais
elevada da Europa, repito, a terceira mais elevada da Europa, embora a
competitividade e produtividade sejam das mais baixas. Este quadro retira
sustentação ao grande argumento do Governo
de aproximação à realidade o sector privado pois os efeitos não são
significativos, antes pelo contrário.
Parece assim claro que a produtividade não
decorre fundamentalmente do tempo de trabalho. Existem, tenho-o afirmado,
factores menos considerados e que do meu ponto de vista desempenham um papel
fundamental, a qualificação profissional, a organização do trabalho, a
qualidade dos modelos de organização e funcionamento, no fundo, a qualidade das
lideranças nos contextos profissionais. O nível de desperdício no esforço, nos
meios e nos processos em alguns contextos laborais é extraordinariamente
elevado. Na administração central, autárquica e no universo das empresas
públicas, por diferentes ordens de razões, este tipo de circunstâncias é
razoavelmente frequente, sendo que em muitas situações as lideranças estão
entregues por razões de aparelhismo partidário e troca de favores e não por
competência ou currículo o que, naturalmente se traduz na qualidade do
desempenho na gestão.
Neste cenário, a decisão de aumentar o horário de
trabalho não parece ser, só por si, a solução milagrosa de incremento da
produtividade e de combate ao desemprego, antes pelo contrário.
Parece-me bem mais potente um esforço concertado
e consistente de reorganização e estruturação de serviços e de modernização e
formação de chefias, funcionários e procedimentos do que impor o recurso
simplista e “fácil” ao aumento da carga horária.
Aumentar o horário de trabalho não parece a forma
mais eficaz de combater as famosas "gorduras" do estado, antes pelo
contrário, boa parte das políticas em curso promovem, isso sim, o emagrecimento
dos cidadãos, ou, pelos menos, dos seus rendimentos.
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