É com frequência que se ouvem expressões como as "crianças merecem tudo" ou outras com significados da mesma natureza, mas hoje confrontei-me com uma abordagem curiosa a este entendimento, por assim dizer.
Uma reportagem no Telejornal da RTP1 centrava-se no mercado de luxo na moda para crianças que representa 5% do mercado de luxo global, uma percentagem em franco crescimento num mercado que resiste à crise, como a peça sublinhava e nós anteciparíamos.
Da reportagem constavam entrevistas a empresárias de lojas de roupa e calçado para crianças representando as melhores "griffes" que para além de afirmarem o potencial deste nicho de mercado, sustentaram as opções dos extremosos pais em nome de uma ideia de exclusividade e não de luxo e ainda por ser uma forma de os próprios pais, também eles consumidores destas marcas, se projectarem nos seus filhos, ideia aliás também referida por alguns pais entrevistados.
Uma menina de 8 anos e com ar desenvolto identificou as várias marcas de que gostava e explicou que delas gostava porque "têm tudo a ver comigo", claro. A peça mostrou ainda uma passagem de modelos por várias crianças, a tentação da passerelle é estimulada cedo, e um criador português de artigos para este segmento afirmou que o mercado está muito receptivo a este produto, retomando a ideia de que é uma forma dos pais se prolongarem nos filhos.
Achei profundamente estimulante esta reportagem, bem mais até do que a afirmação feita ao Expresso por uma senhora de boas famílias e melhores posses, que tanto alarido inexplicavelmente causou, referindo que passar uns dias numa casinha que a família tem lá para os lados da Comporta é assim como que "brincar aos pobrezinhos" o que eu achei uma afirmação bem conseguida, séria, generosa e de grande alcance social.
Na verdade, as crianças merecem tudo, mas talvez seja de lembrar que em Portugal, 28,6% das crianças estavam em situação de risco de pobreza ou de exclusão em 2011, que tenha conhecimento, não estão ainda disponíveis dados de 2012. A pobreza infantil, por coincidência, foi, aliás, objecto de um trabalho interessante do Público na revista de hoje
Sim, eu sei, é um bocadinho demagógico, estamos de férias, mas ... as crianças merecem tudo.
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