A propósito de referências na imprensa de hoje a
iniciativas de várias instituições de ensino superior privado no sentido de captar
ou manter alunos através de descontos em propinas e matrículas, algumas notas.
De acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance
2013, Portugal é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior
mais depende do financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de
universidades e politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia (UE)
23,6%.
Esta informação não é nova. Na verdade e como é
do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o ensino superior,
Portugal, contrariamente ao que muitos afirmam, tem um dos mais altos custos de
propinas da Europa. Conforme dados de 2011/2012 da rede Eurydice, Portugal tem o
10º valor mais alto de propinas na Europa, mas se se considerarem as excepções
criadas em cada país, temos na prática o terceiro custo mais alto no valor das
propinas.
Em 2012 foi divulgado um estudo realizado pelo
Instituto de Educação da Universidade de Lisboa que contribui para desmontar um
equívoco que creio instalado na sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos
outros países da Europa, Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias
para um filho a estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas
fazem um esforço bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus
filhos acedam a formação superior. Se considerarmos a frequência de ensino
superior particular o esforço é ainda maior.
Tem vindo a ser regularmente noticiada a
desistência da frequência dos cursos por muitos alunos que, por si, ou os
respectivos agregados familiares não suportam os encargos com o estudo. Sabe-se
também dos constrangimentos na atribuição de bolsas de estudo.
Segundo um estudo da Universidade do Porto, quase
um quarto dos seus alunos abandona o curso durante os três primeiros anos. Os
números dos diferentes cursos têm variações acima ou abaixo do valor médio, mas
são muito elevados. Embora existam outros factores contributivos, as
dificuldades económicas parecem constituir a razão fundamental para esta enorme
taxa de abandono.
Também um inquérito envolvendo estudantes de todo
o país coordenado pela Associação Académica da UTAD, apurou que 48% dos
inquiridos já passaram por dificuldades económicas e cerca de 65% temem
abandonar o curso em consequência das dificuldades.
Recordo ainda um trabalho recente realizado pelo
Público junto de um grupo significativo de estabelecimentos de ensino superior,
em que se constatou que, face a igual período do ano passado, aumentou 6% o
número de desistências do ensino superior por efeitos da crise. Esta
percentagem corresponde a cerca de 3300 estudantes o que é significativo. As
dificuldades económicas, a dificuldade no acesso a bolsas e o aumento de
propinas são os motivos identificados.
As dificuldades pelas quais passam muitos
estudantes do ensino superior e respectivas famílias, quer no sistema público,
quer no sistema privado, são, do meu ponto de vista, considerados
frequentemente de forma ligeira ou mesmo desvalorizadas. Tal entendimento
parece assentar na ideia de que a formação de nível superior é um luxo, um bem
supérfluo pelo que ... quem não tem dinheiro não tem vícios.
Neste quadro, a redução significativa das bolsas
e apoios, as dificuldades enormes que muitas famílias atravessam e o desemprego
mais elevado entre os jovens, que poderia constituir uma pressão para continuar
os estudos, as elevadas propinas, designadamente no 2º ciclo, tornam ainda mais
difícil a realização de percursos escolares que promovam mobilidade social e
que se traduzem, por exemplo, no aumento das desistências.
Considerando tal como Relatório refere, o ainda
baixo nível de qualificação da população portuguesa e quando se espera e
entende que a minimização das assimetrias possa, também, depender da educação e
qualificação, o seu preço e as dificuldades actuais, longe de as combater,
alimenta-as.
É preocupante.
Quanto aos descontos no ensino superior privado a questão central, do meu ponto de vista, continua a ser a qualidade e a racionalidade da oferta educativa.
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