sábado, 31 de agosto de 2013

A PROLETARIZAÇÃO DA ECONOMIA

Apesar da insistência do FMI, que tem vindo a tutelar o nosso salvífico empobrecimento, em  entender que é preciso ir mais longe na “flexibilidade” dos salários, ou seja, baixar o salário mínimo, congelado há mais de dois anos, reduzir o salário mínimo dos trabalhadores mais jovens e eliminar cláusulas de protecção do trabalho aumentando a precariedade, entre outras medidas de “flexibilização, o Ministro Mota Soares afiança que tal não decisão não será necessária, já estamos pobres que chegue.
Recordo que há uns meses o Presidente da República afirmou, “Não pensem que é pelos baixos salários que se garante a competitividade da economia” e pouco depois o falecido António Borges, companheiro de estrada e de filiação partidária de Cavaco Silva veio dizer, na linha, aliás, do que tem afirmado, tal como Passos Coelho, que "o ideal era que os salários descessem".
É difícil de entender, primeiro, estas discrepâncias entre dois génios da economia que até subscrevem um ideário político semelhante e, segundo, a persistência numa estratégia de empobrecimento como salvação para as dificuldades num país em que perto de três milhões de pessoas, quase um terço da população está risco de pobreza.
Parece razoavelmente claro que a proletarização da economia não poderá ser a base para o desenvolvimento económico, mas sim o investimento e a disponibilização de crédito a custos razoáveis, sobretudo para as pequenas e médias empresas que de forma mais ágil criam emprego e emprego qualificado que não pode ter a indignidade dos salários que conhecemos.
De facto, basta atentar na situação de outros países, o nosso desenvolvimento e crescimento não irá nunca assentar no empobrecimento de quem trabalha, pagando menos por mais tempo de trabalho e, muito menos, na tolerância a situações de chantagem em que as pessoas, para manter o emprego e assegurar um mínimo para a sobrevivência, se sentem obrigadas a aceitar situações degradantes e humilhantes que configuram uma nova escravatura. Esta situação afecta tanto a mão-de-obra menos diferenciada, o trabalho em limpeza por exemplo em que se "oferecem" 2 € por hora, como a mão-de-obra mais especializada com a "oferta" do salário mínimo ou nem isso a gente com formação superior como é recorrentemente noticiado.
Eu sei que os tempos vão de maneira a que muitas pessoas preferem umas migalhas, custe o que custar, ao desemprego, mas não podemos aceitar que vale tudo na forma mais selvagem de funcionamento dos mercados. É importante sublinhar que após a intervenção da troika o emprego criado é sobretudo no patamar de rendimentos em torno dos 310 euros, uma enormidade luxuosa.
Apesar da afirmação do Presidente da República, há mesmo quem pense que os baixos salários, que não o seu evidentemente, são algo de positivo e promotor de desenvolvimento. Desde que não seja os seus porque esses são totalmente merecidos e como dizia Eduardo Catroga, correspondem a um valor de mercado. Os outros, a maioria, obviamente, não têm valor de mercado, nem chegam a ser pessoas, são activos descartáveis.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

O MEC E AS NOVAS OPORTUNIDADES, PARA ALUNOS E PARA PROFESSORES


O MEC continua uma coerente política de não deixar que ninguém se perca, todos se transformem, através de novas oportunidades.
Aos alunos que não servem oferece-lhes o ensino vocacional, aos professores que não servem oferece-lhes a requalificação e em seguida o desemprego.
A questão é que, tal como os alunos não deveriam ser "condenados" ao ensino vocacional de forma "administrativa", duas retenções, boa parte destes professores ficarão sem trabalhar, não porque sejam incompetentes, a maioria não o é, não porque não sejam necessários, a maioria é, mas “apenas” porque é preciso cortar, custe o que custar.
Assim se cumpre um política educativa que em aspectos substantivos não passa de um exercício de contabilidade.

OS SINAIS E A DESESPERANÇA

A desesperança e as dificuldades para a maioria das pessoas são tantas, que qualquer sinal que possa ser um indicador de melhoria é avidamente consumido e analisado.
Estes sinais podem vir do aumento das exportações, do abaixamento do desemprego, da melhoria do PIB, etc.
Como é evidente, sinais positivos, são isso mesmo, sinais positivos, mas as leituras que se podem fazer desses sinais são múltiplas e, como sempre, até de sinal contrário.
Vem esta introdução a propósito mais concretamente da queda da taxa de desemprego.
Qualquer variação neste sentido, a queda da taxa, é de saudar mas importa ponderar o impacto da sazonalidade, a manutenção de níveis altíssimos no desemprego de longa duração, o desemprego jovem que rouba o futuro e, sobretudo, acentuar que a criação de empregos tem sido em emprego precário com rendimento médio da ordem dos 310 euros, o espelho de um caminho de proletarização que a política de empobrecimento que nos impõem está a produzir.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A CONSTITUIÇÃO VAI PARA A MOBILIDADE ESPECIAL, PERDÃO, PARA REQUALIFICAÇÃO

Depois de mais um chumbo do Tribunal Constitucional, creio que o Governo tentará colocar a Constituição no regime de mobilidade especial, perdão, de requalificação, para que o texto constitucional fique conforme os seus desejos e interesses,  deixando de funcionar  como uma força de bloqueio através das interpretações dos juízes do Tribunal Constitucional.
Pela quinta vez o Tribunal Constitucional entende que instrumentos legislativos propostos pelo Governo ferem o texto constitucional. Agora envolveu a proposta legislativa referente ao sistema de requalificação dos trabalhadores da administração pública.
Em termos muito breves, a Constituição estabelece um quadro normativo e orientador que não é perfeito, longe disso, é datado e, também por isso, carece evidentemente de alterações e actualização.
Os actores políticos conhecem muito bem os termos em que a Constituição pode ser revista, sendo que até os próprios termos da revisão podem ser alterados. Parece claro.
No entanto, enquanto não for alterado o texto constitucional, os governos estão obrigados ao seu cumprimento.
A excessiva frequência com que surgem iniciativas legislativas que são consideradas anticonstitucionais, mais do que "simples" inabilidade, cria focos de instabilidade, desconfiança e ineficácia que têm custos elevados.
Acresce que o discurso recorrente de pressão sobre o Tribunal Constitucional, e justificação dos resultados de uma política desastrosa com os chumbos do TC, recorrentes no Governo terão, do meu ponto de vista, efeitos perversos e contrários criando uma fortíssima instabilidade, promovendo tensões e discursos que não contribuem para a solução ou minimização dos problemas do país, pelo contrário, alimentam-nos e ampliam-nos. O Ministro Poiares Maduro na sua "aula" da Universidade de Verão do PSD dá um excelente exemplo deste tipo de posições, as leis ferem a Constituição, quem avalia, o TC, assim conclui, e o problema, diz o Ministro, é de quem avalia, o que é notável. O Primeiro-ministro, também na lição aos "jotas" faz exactamente a mesma leitura na linha do habutual "a realidade está enganda, eu é que estou certo", excelenete lição.
De uma vez por todas, se a Constituição carece de alterações, alterem-na, enquanto não a alteram, cumpram-na.

GENTLE POLICY, O CONVITE AO DESPEDIMENTO DOS PROFESSORES ... E DOS OUTROS


A inovação é algo de fundamental em matéria de educação, e não só. Na mesma linha metodológica da abordagem conhecida por "gentle teaching", o MEC, o Governo, avança com a "gentle policy".
É verdadeiramente inovadora e estimulante esta nova abordagem em matéria de política educativa e de gestão de recursos, os professores são convidados a despedirem-se. Por coincidência, obviamente, o Dr. Santana Lopes sustenta os despedimentos com um argumento de justiça pois, no seu superior entendimento, despedir é mais justo que reduzir prestações sociais. Talvez as centenas de milhar de desempregados, mais de metade do total, que não recebem subsídio de desemprego, não percebam muito bem uma ideia tão justa e solidária.
É um convite generoso que muitos professores e eventualmente outros grupos profissionais certamente só não aceitarão se de todo não lhes for possível.
Alguns, provavelmente por má educação, falta de formação e que por isso mereceriam chumbar no exame de ingresso, vão recusar o convite e deselegantemente quererão continuar a trabalhar.
Há gente para tudo.

BRIEFINGS AO FUNDO

Mais uma decisão lamentável. Agora que o Génio Poiares Maduro e o Geniozinho Pedro Lomba se prepraravam para apresentar um novo modelo de briefing, o Primeiro-ministro entende que não não haverá briefings para ninguém.
É verdade que a experiência não correu particularmente bem, aliás, correu mesmo bastante mal.  No entanto, errar é humano, mesmo em génios. Era de conceder uma Nova Oportunidade aos briefings.
Na verdade, depois da partida do "Dr." Relvas a relação do Governo com a imprensa no que mais foi o que era. O "Dr." Relvas era um especialista em comunicação e os grandes profissionis não são facilmente substituíveis.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

UNIVERSIDADES DE VERÃO, O FUTURO PASSA POR AQUI

Com o ensino superior a viver momentos agitados face ao desinvestimento do MEC e à conjuntura desfavorável, existe um pequeno nicho do ensino universitário que está em franca actividade, sem aparentes sobressaltos e ao qual importa estar atento. Refiro-me às Universidades de Verão organizadas pelas estruturas partidárias. PSD e PS têm as suas em desenvolvimento.
Confesso que fico sempre impressionado com estas iniciativas e julgo que devem ser olhadas com particular atenção.
Em primeiro lugar porque penso que os estudantes que as frequentam, depois de passarem por sucessivos dispositivos de selecção e exames que certifiquem a qualidade da sua preparação, são certamente de um nível de excelência que autoriza a pensar estarmos na presença de uma elite de que o país muito espera e, seguramente, beneficiará.
Por outro lado, o corpo docente destas Universidades é todo ele de uma qualidade científica que obviamente levará a que os estudantes se sintam verdadeiramente privilegiados pela oportunidade de lidar com professores de uma craveira ímpar.
Para além de figuras reconhecidas do mundo universitário, os estudantes têm a possibilidade de ouvir lições de notáveis como o Dr. Carlos Zorrinho, o Dr. Santana Lopes ou o Dr. Marco António de quem ouvi um excerto da conferência proferida, creio que no primeiro dia da Universidade do PSD, que me deixou verdadeiramente fascinado.
Na verdade, estas Universidades de Verão culminam um longo trabalho de formação e qualificação produzido pelas juventudes partidárias e que finalmente é certificado com a excelência aqui atingida.
É nestas actividades académicas que se forjam verdadeiramente os líderes de amanhã, é importante seguirmos com atenção. O futuro passa por aqui.

A FOLHA DE EXCEL

A Folha de Excel talvez seja uma das mais importantes criações dos humanos. De tal maneira esta entidade é importante que está em risco de substituir a humanidade dos humanos.
Toda a vida dos humanos vai sendo organizada em função das determinações de uma Folha de Excel e assim a humanidade é desnecessária.
As sociedades organizam-se a partir dos modelos elaborados na Folha de Excel. A infalibilidade da Folha de Excel substitui a falibilidade dos humanos, ou seja, a sua humanidade que, evidentemente, deve ser eliminada.
Os humanos não decidem, entregam as suas decisões às formulas das Folhas de Excel.
A Folha de Excel criarão uma religião cuja fé substituirá as várias confissões que os humanos professam e que lhes conferem, justamente, humanidade.
As actividades humanas, de natureza mais pessoal ou profissional serão pensadas, geridas e desenvolvidas com base nos dados da Folha de Excel. A Folha de Excel não é permeável à fraqueza dos humanos, isto é, à sua humanidade.
As pessoas vão-se transformando em colaboradores, em activos, e vão ficando cada vez mais pequenas até caberem nas células da Folha de Excel onde ficam presas e passam a dados, perdem a sua humanidade.
As ideias não se promovem, trocam e desenvolvem, a Folha de Excel é imune, é neutra, face às ideias, os dados, contrariamente aos humanos, não têm ideias, ou seja, não têm humanidade.
Diariamente, cada um de nós espreita o mundo a partir da célula, das células das diferentes Folha de Excel onde está inserido, fechado, negando, evidentemente, a nossa humanidade, fraqueza não aceite pelas Folhas de Excel.
Todos os movimentos, todas as acções dos humanos irão ser registadas numa Folha de Excel. Os modelos das Folhas de Excel construirão modelos de novas Folhas de Excel que gerem modelos de Folhas de Excel que gerem as pessoas que perdem a humanidade.
De acordo com a Folha de Excel o tempo que eu tinha para escrever este texto, está no fim. Vou passar para uma outra célula de outra Folha de Excel.

MELHOR TRABALHO OU MAIS TRABALHO E DESEMPREGO?

Sem surpresa o Presidente da República promulgou o diploma que alarga o horário de trabalho dos funcionários da administração pública para as 40 horas semanais. Dado que os partidos da oposição, bem como os sindicatos do sector, anunciaram a intenção de requerer a fiscalização sucessiva, importa aguardar a decisão do Tribunal Constitucional, algo que já nos vamos habituando com variadíssimas propostas legislativas apresentadas pelo Governo.
Algumas notas, de novo, sobre esta questão, o aumento da carga horária.
Esta medida, aparentemente simpática aos olhos de quem diaboliza os privilegiados funcionários públicos, alvos preferenciais do saque a que vamos assistindo, não terá, como reconhecem os especialistas, impacto significativo ao nível da produtividade e é pouco amigável na promoção de emprego ou, se preferirem, no combate ao desemprego como também alguns técnicos já alertaram.
Como tenho vindo a afirmar, apesar de não ser um especialista, apenas um cidadão que procura estar atento, creio que a abordagem da relação entre o tempo de trabalho, a competitividade a produtividade é contaminada por alguns equívocos.
É minha convicção de que o problema da produtividade é, fundamentalmente, uma questão de melhor trabalho e não de mais trabalho. Aliás, conhecem-se estudos nesse sentido e podemos reparar o que se passa noutros países com cargas de horário laboral semelhantes à nossa. Lembram-se certamente de há alguns meses, a propósito de umas afirmações da Senhora Merkel sobre os "preguiçosos" do sul da Europa, ter sido divulgado, creio que na imprensa o I referiu os dados, um relatório sobre a duração do trabalho na União Europeia verificando-se que, contrariamente a alguns entendimentos, a duração do trabalho em Portugal é a terceira mais elevada da Europa, repito, a terceira mais elevada da Europa, embora a competitividade e produtividade sejam das mais baixas. Este quadro retira sustentação ao grande argumento do Governo  de aproximação à realidade o sector privado pois os efeitos não são significativos, antes pelo contrário.
Parece assim claro que a produtividade não decorre fundamentalmente do tempo de trabalho. Existem, tenho-o afirmado, factores menos considerados e que do meu ponto de vista desempenham um papel fundamental, a qualificação profissional, a organização do trabalho, a qualidade dos modelos de organização e funcionamento, no fundo, a qualidade das lideranças nos contextos profissionais. O nível de desperdício no esforço, nos meios e nos processos em alguns contextos laborais é extraordinariamente elevado. Na administração central, autárquica e no universo das empresas públicas, por diferentes ordens de razões, este tipo de circunstâncias é razoavelmente frequente, sendo que em muitas situações as lideranças estão entregues por razões de aparelhismo partidário e troca de favores e não por competência ou currículo o que, naturalmente se traduz na qualidade do desempenho na gestão.
Neste cenário, a decisão de aumentar o horário de trabalho não parece ser, só por si, a solução milagrosa de incremento da produtividade e de combate ao desemprego, antes pelo contrário.
Parece-me bem mais potente um esforço concertado e consistente de reorganização e estruturação de serviços e de modernização e formação de chefias, funcionários e procedimentos do que impor o recurso simplista e “fácil” ao aumento da carga horária.
Aumentar o horário de trabalho não parece a forma mais eficaz de combater as famosas "gorduras" do estado, antes pelo contrário, boa parte das políticas em curso promovem, isso sim, o emagrecimento dos cidadãos, ou, pelos menos, dos seus rendimentos.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

VAMOS ANDANDO

O português, como língua riquíssima que é, apesar da ameaça do acordo, tem um conjunto de expressões, das mais simples às mais sofisticadas, que são muito particulares. Algumas destas expressões são, creio, definidoras de nós portugueses enquanto povo. Uma das que mais gosto é a fórmula “vai-se andando”, com ligeiríssimas variações. Um português que se preze ao ser inquirido sobre o seu estado de alma, ou de qualquer outra dimensão, nunca responde com um assertivo e convicto “bem” ou “mal”. Com aquele jeito entre o fado, a resignação e a paciência, ouve-se “vai-se andando”.
Então a saúde? Vai-se andando e tu? Vou andando.
Tudo bem com o trabalho? Vai-se andando e tu? Vou andando.
E ela, está boa? Vai andando e a tua mulher? Vai andando.
Que achas desta crise? Temos que ir andando.
Os miúdos? Vão andando e os teus? Vão andando.
Então que achas das cenas da política? Vai andando como de costume, não muda nada.
Ela partiu, acabou-se. E tu? Tenho que ir andando.
Com estes exemplos dá para perceber que nós não nos movemos, vamos andando, não andamos, vamos andando, não amamos nem odiamos, vamos andando, não sofremos nem vibramos, vamos andando.
E o País? Vai andando.

ESTAMOS CONTRAFEITOS

Depois da carne de cavalo em vez de vaca nos hambúrgueres e almôndegas, do desconhecido peixe-caracol em vez de bacalhau, algo verdadeiramente insultuoso para os portugueses, eis que nos atingem de novo, o azeite também não anda bem, anda contrafeito. Até azeite "biológico" não é azeite, descobre a DECO. Que mais nos irá acontecer?
Na verdade, lamentavelmente, não é surpresa, regularmente emergem notícias  por cá e lá por fora sobre novas situações de fraude relativas aos alimentos, quer na sua composição quer na sua qualidade.
Este enorme sobressalto na área da alimentação junta-se a situações a ocorrer em muitos outros sectores cruciais, como o dos medicamentos, em que floresce um enorme mercado envolvendo a produção e a distribuição potenciada pelo recurso à net.
Na verdade, nos últimos anos, as economias de muitos países têm sofrido um ataque pesadíssimo através das práticas de contrafacção que envolvem muitos bilhões de euros em muitíssimas áreas.
Em Portugal temos também, como não podia deixar de ser, um florescente mercado de produtos contrafeitos que, através das populares "feiras" ou da mais sofisticada net, disponibilizam tudo o que se pretender, de qualquer marca, perdão "griffe". Ainda há pouco tempo me ofereceram com insistência uns óculos Armani, mesmo Armani, por 5 € que, obviamente, recusei, eram caríssimos apesar da excelência da qualidade e da marca, claro.
As organizações de defesa do consumidor, em particular a DECO, bem como a ASAE, destacam-se na forma como procuram combater a contrafacção, por vezes em acções com forte cobertura mediática, sempre no supremo interesse da “defesa do consumidor”. Assumindo, como qualquer de nós, esta condição de consumidor, não posso estar mais de acordo com esta atitude, embora possa discutir a mediatização e aparato de que se revestem muitas das acções desenvolvidas, apesar de, reconheça-se, ter aumentado a discrição.
Nesta perspectiva preocupa-me que a emergência e o alargamento destas situações em sectores tão importantes como a alimentação, possam retirar eficácia para lidar com um problema também muito sério, a presença de produtos de contrafacção na nossa vida política o que, obviamente, compromete a sua qualidade.
Na verdade a contrafacção no nosso cenário político constitui uma enorme preocupação.
Quando analisamos e sentimos os discursos e as práticas das lideranças políticas percebe-se sem necessidade de recorrer a sofisticados dispositivos laboratoriais que se trata de produtos contrafeitos, muitos deles altamente tóxicos e ameaçadores da saúde social, económica, mental e física dos portugueses.
Seria, portanto, imprescindível que os elementos da classe política, de diferentes quadrantes, que são obviamente produtos contrafeitos e de uma falta de qualidade ameaçadora, sejam detectados e recolhidos por iniciativa da DECO ou da ASAE para que os eleitores, quando procuram “adquirir”, através do voto, representantes de qualidade certificada e de boas marcas e que garantam um serviço público de qualidade, não tomem gato por lebre.
Mesmo que sejam licenciados, por exemplo, em Ciência Política e Relações Internacionais e tentem parecer políticos a sério.
Estamos contrafeitos. 

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

A DOENÇA DAS FINANÇAS LOUCAS


"As universidades e institutos politécnicos não vão poder aumentar o peso das receitas próprias nos seus orçamentos. Uma directiva da Direcção-Geral do Orçamento (DGO), que foi recentemente enviada às instituições de ensino superior, estabelece um limite máximo dos fundos angariados e impõe ainda uma cativação de parte dessas verbas.", no Público.
Quando parece que já vimos tudo ainda acontece algo que nos surpreende. Por decisão do Ministério das Finanças, as universidades e institutos politécnicos não podem aumentar o peso no respectivo orçamento das receitas que conseguem angariar por sua iniciativa, aliás, também com limite definido (?!), e ainda são obrigadas a cativar parte dessas verbas.
Não acredito que nas Finanças se desconheça a associação fortíssima, estudade e reconhecida de há muito, entre o investimento em educação, a investigação e o desenvolvimento das comunidades, seja por via directa, qualificação e produção de conhecimento, seja por via indirecta, condições económicas, qualidade de vida e condições de saúde, por exemplo.
Assim sendo, só posso depreender que as Finanças, de tanto lidar com produtos tóxicos, tenham muito provavelmente contraído alguma estranha doença ainda por estudar, mas cujos efeitos são preocupantes, a doença das finanças loucas.

OS FOGOS COMBATEM-SE NO INVERNO, NÃO NO INFERNO

Com mais uma morte, a quinta nesta época de incêndios, o número elevado de feridos e com a devastação decorrente é impossível olhar para esta situação sem um sobressalto de indignação e preocupação, um cenário que se repete anualmente e, por isso mesmo, mais difícil de entender apesar da imprevisibilidade de algumas situações.
Este ano, um Inverno que se prolongou e foi chuvoso deixou as zonas não habitadas com uma enorme cobertura vegetal que se constitui como uma enorme quantidade de combustível a que só falta um gesto criminoso, um comportamento negligente ou um qualquer incidente para se transformar em potenciais tragédias.
Todos os anos, como sempre de resto, se anunciam novas estruturas de resposta rápida e meios de combate, designadamente meios aéreos mais sofisticados e somos informados de melhorias nos dispositivos de prevenção e combate, no aumento de meios à disposição, na racionalização da gestão dos recursos, etc. etc.
Entretanto, quando se começa a verificar a ocorrência mais frequente de fogos surge o costume, a comunicação social, sobretudo a televisiva, de forma frequentemente desajeitada, a mostrar o "terreno", o "cenário dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco", a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase tudo. Um filme sempre visto e sem surpresas.
Este ano acresce a tragédia da morte dos bombeiros com as tão intermináveis quanto inconsequentes análises e lamentações.
É evidente que temperaturas muito altas e vento que nos caracterizam durante os meses de Verão são condições desfavoráveis, mas a falta de prevenção, a negligência e delinquência dão um contributo fortíssimo ao inferno que sobressalta cada Verão.
Sem nenhuma espécie de conhecimento destas matérias, para além do interesse e preocupação de um cidadão minimamente atento e preocupado com os custos enormes destes cenários de destruição, tenho alguma dificuldade, considerando a dimensão do nosso país, em compreender a inevitabilidade destes cenários. É recorrente a referência à falta de limpeza dos terrenos. Os espanhóis têm por uso afirmar que os incêndios se combatem no inverno, nós combatemo-los no inferno, opção obviamente mais cara, cerca de quatro vezes mais cara segundo trabalho no Público.
Trata-se de um destino que não pode ser evitado? Trata-se de uma área de negócios, a fileira do fogo, que, pelos muitos milhões que envolve, importa manter e fazer funcionar sazonalmente? Trata-se "só" de incompetência na decisão política e técnica em termos de resposta e prevenção? Trata-se da falência de modelos de desenvolvimento facilitadores de desertificação e abandono, designadamente das áreas rurais?
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos, quando rouba a vida a pessoas, dói mais e não se perdoa.
Acresce que em Portugal passamos o ano todo a apagar fogos de diferentes naturezas e implicações.

PRIORIDADES


Trata-se evidentemente de uma gestão adequada das prioridades num cenário de contenção e austeridade.
O Natal é um luxo dispensável e a equitação é um bem de primeira necessidade.

domingo, 25 de agosto de 2013

TERRA DE TROCA-TINTAS


A lei, intencionalmente ambígua, presta-se à manha das interpretações, consoante o interesse dos troca-tintas. Como não sou jurista, parece-me clara a intenção de combater o caciquismo e a eternização no poder por parte das mesmas figuras. Claro que os "especialistas" torturam as leis ou armam-nas com as ambiguidades necessárias para que possam ser "interpretadas" conforme os interesses de ocasião.
Seja qual for a decisão que o Tribunal Constitucional venha a tomar perdem a ética e o pudor, bens de primeira necessidade mas que boa parte desta gente não usa.

Constituição da República Portuguesa:
Lei 46/2005 - Limitação de mandatos:

SE CUIDAR É CARO, FAÇAM CONTAS AO DESCUIDAR

Um trabalho de hoje no Público retoma a sempre presente questão dos consumo de drogas.
De acordo com os especialistas parece assistir-se a um acréscimo significativo do consumo de diferentes substâncias, incluindo o álcool.
Embora não possa ser estabelecida uma relação de causa-efeito, as actuais circunstâncias de vida de muita gente criam contextos de fragilidade e desesperança, favoráveis à busca de um escape que pode ser retomar o consumo ou iniciá-lo, seja do que for. A experiência de outros países mostra quadros semelhantes.
Por outro lado, para além disto importa considerar as alterações significativas que têm vindo a ser produzidas no universo das estruturas e modelos de resposta à questão da toxicodependência que, como também muitos técnicos desta área salientam, retiram eficácia por desajustamento da organização ou falta de meios e recursos, com reflexos evidentes nos casos de recaídas bem como no aumento dos comportamentos de consumo.
Como sempre afirmo, existem áreas de problemas nas comunidades em que os custos da intervenção são claramente sustentados pelas consequências da não intervenção. A toxicodependência é uma dessas áreas. Um quadro de toxicodependência não tratado desenvolve-se habitualmente, embora possam verificar-se excepções, numa espiral de consumo que exige cada vez mais meios e promove mais dependência. Este trajecto potencia comportamentos de delinquência, alimenta o tráfico, reflecte-se nas estruturas familiares e de vizinhança, inibe desempenho profissional, promove exclusão e guetização. Este cenário implica por sua vez custos sociais altíssimos e difíceis de contabilizar.
Costumo dizer em muitas ocasiões que se cuidar é caro façam as contas aos resultados do descuido. Assim sendo, dificilmente se entendem algumas opções.

sábado, 24 de agosto de 2013

SOBREVIVÊNCIA E DIGNIDADE

De acordo com dados da Segurança Social diminui o número de beneficiários de diversos tipos de apoios sociais, incluindo o subsídio de desemprego e o Rendimento Social de Inserção.
Dado que não aumentou o rendimento disponível das famílias, pode concluir-se que o deixar de receber apoios sociais não se deve à não necessidade, mas às condições de elegibilidade que têm vindo a ser mais restritivas.
Recordo que em Junho, dados do INE afirmavam que apenas 41% dos desempregados recebem subsídio e também até Junho de 2013 menos cerca de 69 000 pessoas recebiam o Rendimento Social de Inserção quando comparado com Junho de 2012. O número em Junho era de  271 302 beneficiários.
Este cenário impressionante, que pode agravar-se com a anunciada reforma do Estado, isto é, cortes nas suas funções sociais, coloca uma terrível e angustiante questão. Os milhares, muitos, de pessoas envolvidas vão (sobre)viver de quê?
Sendo de esperar a continuação de um período recessivo e, portanto, sem crescimento, torna-se impossível criar a riqueza necessária e redistribuí-la de forma socialmente mais justa para minimizar esta tragédia. Aliás, as previsões do Banco de Portugal são preocupantes, sobretudo para 2014.
É certo que em Portugal a chamada economia paralela corresponde a cerca de 25% do PIB e muita gente e muitas actividades estão envolvidas neste universo, de qualquer forma o potencial impacto social destes números é, no mínimo, inquietante.
Afirmo com frequência que uma das consequências menos quantificável das dificuldades económicas, sobretudo do desemprego, em particular o de longa duração e de situações em que o tempo obriga a perder o subsídio, é o roubo da dignidade às pessoas envolvidas. Sabemos que se verifica oportunismo e fraude no acesso aos apoios sociais, mas a esmagadora maioria das pessoas sentem a sua dignidade ameaçada quando está em causa a sobrevivência a que só se acede pela “mão estendida” que envergonha, exactamente por uma questão de dignidade roubada.
A questão da pobreza é um terreno que se presta a discursos fáceis de natureza populista e ou demagógica, sem dúvida. Mas também não tenho dúvidas de que os problemas gravíssimos de pobreza que perto de três milhões de portugueses conhecem, exigem uma recentração de prioridades e políticas que não se vislumbra. Na verdade, apesar da retórica oficial de que existe justiça social nas medidas de austeridade, o que é verdadeiramente insustentável é que as políticas assumidas, por escolha de quem decide, estão a aumentar as assimetrias sociais, a produzir mais exclusão e pobreza. Mais preocupante é a insensibilidade da persistência neste caminho.
A pobreza e a exclusão deveriam envergonhar-nos a todos, a começar por quem lidera, representam o maior falhanço das sociedades actuais. 

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

EXAMES, A POÇÃO MÁGICA

Quando se escreve diariamente sobre o que nos rodeia e inquieta é inevitável voltar com regularidade a algumas matérias de que tece a nossa vida.
Dado que hoje estão a decorrer novas negociações entre o MEC e os representantes dos professores sobre a introdução de exames para acesso à profissão docente, julgo de retomar algumas notas.
Como é sabido, de acordo com a proposta do MEC, para além dos novos candidatos todos os professores que não estejam integrados na carreira, ou seja, pessoas com muitos anos de experiência avaliada e reconhecida terão de realizar um exame de acesso a uma profissão que exercem há anos. Este é, justamente, um dos grandes pontos de divergência entre o MEC e as diferentes organizações de professores.
À primeira vista, promover um exame de acesso à profissão a professores  que, muitos deles, já exercem há anos e foram avaliados com resultados positivos, pode parecer estranho. Na verdade não acho estranho, é apenas coerente com a relação mágica que o Ministro tem com os exames, ou seja, fazem-se exames, muitos exames, que a coisa melhora, seja o que for. Deve no entanto dizer-se que o exame estava previsto desde 2007 sem nunca ter sido concretizado sendo que agora se designará Prova de Avaliação de Conhecimentos, Capacidades e Competências naquela tendência actual de sofisticar e mascarar designações.
Como sempre tenho referido, a imposição deste exame traduz, como parece claro, a desconfiança sobre a formação de professores quer nos politécnicos, quer nas universidades, curiosamente também sob tutela do MEC. Relembro que em 2009, o então Secretário de Estado da Educação, Jorge Pedreira, defender a realização do exame de entrada para a carreira docente com o argumento de que existem Escolas de Ensino Superior sem qualidade e facilitistas, sempre o facilitismo, que não dão garantias de qualidade na formação dos seus alunos, citando em declarações à Lusa, os casos do Instituto Piaget e do Instituto Superior de Ciências Educativas. A falta de regulação da qualidade do ensino superior, público e privado, é algo que toda a gente minimamente conhecedora do meio tem como adquirido.
É, no entanto, necessário um “pequenino” esclarecimento, a falta de regulação da qualidade de formação inicial, neste caso dos professores, é da exclusiva responsabilidade do Estado através do quadro legal que definiu e da demissão com que encarou a proliferação de cursos públicos e privados que contribuindo, caso dos privados, para que milhares de jovens acedessem a formação de nível superior que as instituições públicas não tinham condições de providenciar, nasceram e cresceram sem qualquer controlo sério de qualidade. Do caos instalado emergem, naturalmente, boas e más instituições. Regule-se pois a sua qualidade, independentemente da questão do exame para entrar na carreira docente.
Dito de outra maneira, a imposição do exame evidencia a incompetência e negligência da regulação a que a tutela estaria obrigada mas de que se tem demitido.
Acredito que se trata de uma medida que aos olhos de muita gente passará positivamente, traz o habitual mantra cratês do rigor, da qualidade e da excelência que se não reconhece na prática do MEC, no entanto, é apenas a tradução da incompetência e negligência de boa parte dos ocupantes da 5 de Outubro.

"EVITA" MENEZES


Num despudorado plágio de modelos de acção política bem conhecidos, desde a mítica Evita Péron ao não menos mítico Alberto João, o Dr. Menezes, sentado à sua secretrária da Câmara de Gaia chama uns pobrezinhos com rendas em atraso e paga-lhes a renda. Lindo.
Por acaso os pobrezinhos escolhidos vivem do outro lado do Douro, justamente onde está a outra secretária pela qual se bate o Dr. Menezes, apoiado numa manhosa interpretação da lei da limitação de mandatos.
Ao que parece o Dr. Menezes paga rendas e manda assar porcos para os pobrezinhos do Porto apenas pelo seu reconhecido espírito de missão e generosidade.
Mais a sério, a Comissão Nacional de Eleições proibiu a propaganda eleitoral através de correio electrónico e de telefone mas, como se vê, expedientes como pagar rendas a pobres e oferecer porcos talvez seja aceitáveis e certamente rentáveis.
Em desenvolvimento posterior a CNE solicita explicações a Menezes que reafirmará, provavelmente, a sua generosidade e solidariedade desinteressadas
No entanto, esperará que os pobrezinhos do Porto, não sejam pobre e mal agradecidos e passem a palavra, são muitos, apelando ao voto na Evita Menezes, o Messias que os tirará da pobreza e miséria, como, aliás, fez em Gaia com todos os que passavam mal.
O despudor sem fim desta gente.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

UM ESTRANHO BAILADO

Pelo título poderia pensar-se que me refiro ao estranho bailado cantado pelos Trovante em “Travessa do Poço dos Negros”, mas não, nem sequer é em tom dolente.
Vejamos então de que se trata.
Boa parte das minhas manhãs de Verão em tempo de férias passam por deambulações matinais pelas minhas praias de sempre, as da Costa da Caparica, as mais bonitas do mundo desde que se tenha o cuidado de manter o olhar sempre na praia e no mar para não enfrentar o terrorismo urbanista que décadas de incompetência e negligência produziram.
Sempre que a maré está em baixa podemos assistir a um espectáculo curiosíssimo. Muitíssimas pessoas à beirinha da água agitam-se furiosamente num estranho bailado rodopiante, ora em cima de um pé, ora em cima do outro, abrem buracos na areia e de vez em quando baixam-se.
A coreografia, devo dizer, não é particularmente brilhante e criativa mas a performance envolve, e isso é notável, bailarinos de todas as idades, predominando adultos e seniores, todos com o mesmo empenho. A produção também não é superlativa, predominam os fatos de banho clássicos, um boné ou um mais sofisticado “panamá” na cabeça e uma garrafinha na mão para onde diligentemente é remetido o resultado do estranho bailado, meia dúzia de minúsculas cadelinhas que gozando as delícias do mar da Costa estavam bem longe de se imaginar engarrafadas pelos azafamados bailarinos.
Não sei o que mais admirar. Por um lado, acho notável o empenho e a atitude profissional dos bailarinos que sempre que apanham uma desgraçada cadelinha olham à volta para se certificar que alguém viu como caçaram, ou pescaram, mais uma e de que aquela não vai parar à garrafinha do bailarino da poça a seguir. Por outro lado, acho fantástico imaginar aqueles bailarinos e a respectiva família a preparar um delicioso e bem regado lanche com a meia dúzia de cadelinhas pequeninas, ainda juniores, que a sua empreendedora acção matinal conseguiu e que, para uma família média, dará, pelo menos, a indigesta enormidade de uma ou duas por prato.
Este estranho bailado ficaria muito bem numa versão beira-mar do notável “Aquele querido mês de Agosto” de Miguel Gomes.

O MAL-ESTAR COMO SEMENTE. Novo episódio

Nos últimos tempos são recorrentes as notícias relativas a problemas sérios no âmbito das relações interpessoais entre adolescentes e jovens, frequentemente noutras paragens, mas também entre nós. Por estes dias somos surpreendidos com a tragédia acontecida nos Estados Unidos, três adolescentes resolvem matar um outro jovem porque sim, "porque não tinham nada melhor para fazer".
São demasiado evidentes e frequentes os casos extremos de violência e abusos entre gente mais nova o que nos leva a questionar os nossos valores, trabalho educativo (família, escola e comunidade), códigos e leis pela perplexidade que nos causam.
A questão que me leva de novo a estas notas é mais no sentido de tentarmos perceber um processo que designo como "incubação do mal" que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente, começam interiormente a ganhar um peso insuportável cuja descarga apenas precisa de um gatilho, de uma oportunidade.
A fase seguinte pode passar por duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva, possa drenar esse mal-estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra via, aumenta exponencialmente o risco de um pico que pode ser um tiroteio numa escola, a bomba meticulosamente e obsessivamente preparada ou uma investida contra alguém arriscando a entrada numa espiral de violência cheia de "adrenalina", em nome de coisa nenhuma a não ser de um "mal-estar" que destrói valores e gente.
É evidente que a punição e a detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade perigosamente presente na nossa comunidade mas é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
Assim, sabendo que prevenção e programas comunitários e de integração têm custos, importa ponderar entre o que custa prevenir e os custos posteriores da violência, da delinquência continuada e da insegurança.
Finalmente, a importância de uma permanente atenção às pessoas, desde pequenas,  ao seu bem-estar, tentando detectar, tanto quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.
Nos Estados Unidos ou em Portugal.

OS FOGOS COMBATEM-SE NO INVERNO, NÃO NO INFERNO

Com mais uma morte de uma pessoa, uma bombeira, a terceira nesta época de incêndios, o número elevado de feridos e com a devastação decorrente é impossível olhar para esta situação sem um sobressalto de indignação e preocupação, um cenário que se repete anualmente e, por isso mesmo, mais difícil de entender apesar da imprevisibilidade de algumas situações.
Este ano, um Inverno que se prolongou e foi chuvoso deixou as zonas não habitadas com uma enorme cobertura vegetal que se constitui como uma enorme quantidade de combustível a que só falta um gesto criminoso, um comportamento negligente ou um qualquer incidente para se transformar em potenciais tragédias.
Todos os anos, como sempre de resto, se anunciam novas estruturas de resposta rápida e meios de combate, designadamente meios aéreos mais sofisticados e somos informados de melhorias nos dispositivos de prevenção e combate, no aumento de meios à disposição, na racionalização da gestão dos recursos, etc. etc.
Entretanto, quando se começa a verificar a ocorrência mais frequente de fogos surge o costume, a comunicação social, sobretudo a televisiva, de forma frequentemente desajeitada, a mostrar o "terreno", o "cenário dantesco", a ouvir "moradores que passaram uma noite em branco", a ouvir o "senhor comandante dos bombeiros", a referir os "meios aéreos, dois Canadairs e um Kamov", a ouvir os "responsáveis locais ou regionais da protecção civil", a gravar despudoradamente imagens de dor, sofrimento e perda de gente anónima que tendo quase nada, vê arder o quase tudo. Um filme sempre visto e sem surpresas.
Este ano acresce a tragédia da morte dos bombeiros com as tão intermináveis quanto inconsequentes análises e lamentações.
É evidente que temperaturas muito altas e vento que nos caracterizam durante os meses de Verão são condições desfavoráveis, mas a falta de prevenção, a negligência e delinquência dão um contributo fortíssimo ao inferno que sobressalta cada Verão.
Sem nenhuma espécie de conhecimento destas matérias, para além do interesse e preocupação de um cidadão minimamente atento e preocupado com os custos enormes destes cenários de destruição, tenho alguma dificuldade, considerando a dimensão do nosso país, em compreender a inevitabilidade destes cenários. É recorrente a referência à falta de limpeza dos terrenos. Os espanhóis têm por uso afirmar que os incêndios se combatem no inverno, nós combatemo-los no inferno, opção obviamente mais cara.
Trata-se de um destino que não pode ser evitado? Trata-se de uma área de negócios, a fileira do fogo, que, pelos muitos milhões que envolve, importa manter e fazer funcionar sazonalmente? Trata-se "só" de incompetência na decisão política e técnica em termos de resposta e prevenção? Trata-se da falência de modelos de desenvolvimento facilitadores de desertificação e abandono, designadamente das áreas rurais?
O poeta falava de um fogo que arde sem se ver, é bonita a imagem. Mas quando um fogo arde e se vêem os seus efeitos devastadores e dramáticos, quando rouba a vida a pessoas, dói mais e não se perdoa.
Acresce que em Portugal passamos o ano todo a apagar fogos de diferentes naturezas e implicações.

COISAS DE MIÚDOS ... OU DE GRAÚDOS

 
Conseguimos realizar uma intervenção cardíaca, inédita em Portugal, para abrir uma válvula pulmonar num bebé de 28 semanas, pouco mais de um quilo.
Há poucos dias, também em Portugal, conseguimos implantar com sucesso um coração artificial num bebé com três meses e meio.
Estranhamente, não conseguimos evitar que muitas outras crianças passem fome e sofram maus-tratos.
Problema de ciência? De valores?
Porquê?

CADA CAVADELA, CADA MINHOCA

A linguagem popular tem um conjunto de expressões que muitas vezes nos ajudam a retratar o quotidiano. No fundo, também é esse o seu papel.
A propósito desta enorme trapalhada tóxica dos "SWAPS", lembro-me do enunciado "cada cavadela, cada minhoca".
Na verdade, cada vez que se ouve ou sabe algo sobre esta matéria acrescenta-se um nó a uma trama que nos trama, seja por questões relativas aos impactos financeiros desastrosos para as contas públicas das operações envolvidas, seja pelo envolvimento e responsabilidades de quem de alguma forma interveio neste processo. Hoje trata-se da destruição, em circunstâncias de duvidosa legalidade, de papéis importantes sobre o "negócio", numa curiosa coincidência com o também tóxico filme dos submarinos
Decididamente, este universo, a gestão e administração de empresas públicas e a promiscuidade  e o tráfego entre estruturas públicas e privadas alimentado pela partidocracia como ferramenta de gestão de interesses, é um lugar mal frequentado, é um caso de polícia.
E não acontece nada.
Nada de novo, portanto.

OS TIROS DOS SUBMARINOS, JUSTIÇA AO FUNDO

 
Conheceu-se mais um episódio da eterna e certamente inconclusiva saga conhecida pelo “O estranho negócio dos submarinos”.
Os episódios anteriores foram marcados por uma enorme "surpresa" preparada pelos argumentistas, o desaparecimento da papelada relativa ao negócio o que faz correr o sério risco de comprometimento das investigações.
Nada de extraordinário, do meu ponto de vista, as investigações estavam comprometidas à partida, estamos em Portugal. Relembro que na Alemanha, o pessoal envolvido neste esquema já foi julgado e condenado, na Grécia o processo desenvolveu-se com a acusação dos responsáveis e nós por cá, como de costume, andamos aos papéis com eles desaparecidos e realizamos umas investigações, julgamentos e "indiciações" que ninguém acredita que terminem com alguma condenação, ou seja, tal como acontecia nas nossas míticas batalhas navais jogadas nas aulas, não passam de tiros na água.
De forma curiosa e mais preocupante é que estes tiros na água abrem mais um rombo no casco do porta-aviões da confiança na justiça e em boa parte da classe política.
Acresce que de quem se espera que seja parte da solução é, na verdade, parte do problema, resultado, justiça ao fundo.

POLÍTICA "BY THE BOOK"


Como é evidente e natural, o enunciado "que se lixem as eleições" era a brincar, por assim dizer. A tradição ainda é o que era.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A SÉRIO?!


O Dr. Fernando Seara não está a referir-se a uma rapaziada que anda por aí e que tem como peça curricular mais significativa  uma excelente folha de serviços no âmbito das "jotas". É verdade que a maioria, à excepção evidentemente do Dr. Relvas, consegue acrescentar um curso tirado de forma empenhada numa universidade amiga e ainda um desempenho esporádico de alguma actividade em escritórios que o amiguismo disponibiliza ou em empresas, quase sempre públicas, que a generosidade da partidocracia providencia, pois os amigos são para as ocasiões e a sua incompetência ficará impune.
Alguns também conseguem dar umas aulinhas em universidades simpáticas que acolhem como assistentes convidados ou mesmo como professores auxiliares convidados jovens e promissores políticos. Na verdade é algo que fica sempre bem num currículo e, por outro lado, essas universidade acautelam-se face ao futuro, nunca se sabe onde as qualidades e competências destas pessoas as levarão.
Certamente que o Dr. Seara não se estaria a referir ao Dr. Passos Coelho ou ao Dr. António José Seguro, são muito novos para ser "dinossauros da política" e têm um currículo académico e profissional sólido e extenso.
Afinal a quem se referirá o Dr. Seara? 

ÉTICA, UMA INCONSISTÊNCIA PROLEMÁTICA

O Dr. Ruas, Presidente da Associação Nacional de Municípios e Presidente da Câmara de Viseu, ofereceu contribuições financeiras, no âmbito de contratos-programa com instituições locais, sendo que essa entrega e assinatura dos programas se realizaram em Igrejas antes das missas.
A oposição contesta e o Dr. Ruas responde que não tem de dar explicações e que sempre fez aquilo, "Faço o que fiz todos os anos, e não só em alturas eleitorais, e com os mesmos critérios."
O modelo é um clássico na política portuguesa e não só no universo autárquico, só variam, naturalmente, cenários e protagonistas e escala. O Dr. Alberto João Jardim é, aliás, uma referência nesta forma generosa e nobre de administrar os bens públicos.
Neste contexto, nem sequer percebo os protestos da oposição mas, naturalmente, a corrida às eleições exige que se diga qualquer coisa e pode ser isto, evidentemente.
No entanto, estas actuações tem uma vantagem, compreende-se mais claramente a necessidade de combater o caciquismo e amiguismos políticos que alguns querem perpetuar através do entendimento manhoso de uma intencionalmente ambígua legislação sobre limitação de mandatos que, por sua vez, decorre de um pressuposto constitucional claro e sem margem para dúvidas, o princípio da renovação na ocupação de cargos políticos.
Só que o despudor e a inconsistência ética problemática ética desta gente não tem limites.

EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

As universidades e politécnicos que não têm estatuto de fundação são obrigadas à cativação de 10 milhões de euros do orçamento em execução, o que, de acordo com os reitores e presidentes de politécnicos, coloca em risco o funcionamento para o próximo ano lectivo.
Por outro lado e ao que parece, a proposta de Orçamento do Estado para 2014 contempla mais um corte no financiamento do sistema de ensino superior, cerca de 15 milhões no esino universitário e 20 milhões no ensino polítécnico .
Como é habitual a educação é um terreno privilegiado para os cortes orçamentais pelo que a medida e a proposta não surpreendem.
No entanto, como sempre, é importante não esquecer os riscos desta política cega e suicida.
Recordo, por exemplo, que a Conferência WISE – World Innovation Summit for Education de 2012, em Doha no Qatar, definiu como eixo central o investimento em educação mesmo em tempos recessivos, sublinhando a importância da qualificação, incentivos e apoios aos professores e a relação dos percursos educativos com o mercado de trabalho.
Sendo certo que importa racionalizar custos e optimizar recursos combatendo desperdício e ineficácia, o caminho que temos vindo a percorrer é justamente o contrário, o desinvestimento na educação, do básico ao superior com custos que o futuro se encarregará de evidenciar.
Está estudada e reconhecida de há muito a associação fortíssima entre o investimento em educação e investigação e o desenvolvimento das comunidades, seja por via directa, qualificação e produção de conhecimento, seja por via indirecta, condições económicas, qualidade de vida e condições de saúde, por exemplo.
Corremos o sério risco de ver ameaçados os excelentes resultados que a investigação eas instituições de ensino superior têm vindo a alcançar.
Como em quase tudo é uma questão de escolhas e prioridades de quem lidera. O problema como referia o Professor Sobrinho Simões num entrevista sobre estas questões é que "os nossos políticos têm um problema ... alguns não se apercebem do valor do ensino superior e da investigação".
O empobrecimento e o desinvestimento em educação nunca poderão ser factores de desenvolvimento.

O ENCERRAMENTO SEGUE DENTRO DE ALGUM TEMPO


É fundamental que ano lectivo arranque com toda a normalidade e tranquilidade como sempre tem sido nos últimos anos.
O facto de existirem eleições autárquicas no início do ano lectivo e as populações serem muito reactivas ao encerramento das escolas é, óbviamente, uma coincidência.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

OS ALUNOS DO ENSINO SUPERIOR. A qualificação é um kit de sobrevivência

Conforme os dados disponibilizados pelo MEC e que o Público está a analisar, verifica-se que entre 2010/2011 e 2011/2012 o número de novos inscritos no ensino superior diminuiu 5% bem como a população global deste nível de ensino, 3,2%. Este dado não é unicamente explicado pela variação demográfica nem pela crise económica embora sejam, naturalmente factores com impacto fortíssimo.
Quando terminou a 1ª fase de candidatura ao ensino superior para o ano lectivo que vai começar foi divulgada uma redução de cerca de 5 000 inscritos face ao ano anterior, 2012/2013 o que mostra a continuidade do declínio da população a frequentar o ensino superior.
No entanto, para além da analise do impacto real da variável demografia o que me parece verdadeiramente preocupante é que dos cerca de 160 000 alunos inscritos nos exames da primeira fase, apenas 57% manifestavam intenção de frequentar o ensino superior e destes, apenas 44% procederam a matrícula.
Temo que o número relativamente baixo de alunos com a intenção de adquirir formação de nível superior possa estar ligado à perversa e errada ideia do “país de doutores” que, muitas vezes com o auxílio de uma imprensa preguiçosa e negligente, se foi instalando a propósito do número de jovens licenciados no desemprego e da conclusão de que “não vale a pena estudar”, um verdadeiro tiro no pé e que não corresponde de todo à verdade.
Em primeiro lugar, os jovens licenciados não estão no desemprego por serem licenciados, estão no desemprego porque temos um mercado pouco desenvolvido e ainda insuficientemente exigente de mão-de-obra qualificada e muitos estão no desemprego porque, por desresponsabilização da tutela, a oferta de formação do ensino superior é completamente enviesada distorcendo o equilíbrio entre a oferta e a procura.
A qualificação profissional, de nível superior ou não, é essencial, continuamos com taxas de formação superior abaixo das médias europeias, como também é essencial a racionalidade e regulação da oferta do ensino superior e, naturalmente, a regulação eficaz do mercado de trabalho minimizando o abuso do recurso à precariedade. É ainda de sublinhar que conforme um estudo recente, "Empregabilidade e Ensino Superior em Portugal", da responsabilidade da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior a qualificação de nível superior compensa em termos de estatuto alarial e empregabilidade, como aliás estudos internacionais, por exemplo da OCDE, também demonstram.
Por outro lado, parece oportuno recordar que, de acordo com o Relatório da OCDE, Education at a glance 2013, Portugal é um dos países europeus em que a frequência de ensino superior mais depende do financiamento das famílias, cerca de 31% dos gastos de universidades e politécnicos. A média da OCDE é 32% e a da União Europeia (UE) 23,6%.
Esta informação não é nova. Na verdade e como é do conhecimento das pessoas mais perto deste universo, o ensino superior, Portugal, contrariamente ao que muitos afirmam, tem um dos mais altos custos de propinas da Europa. Conforme dados de 2011/2012 da rede Eurydice, Portugal tem o 10º valor mais alto de propinas na Europa, mas se se considerarem as excepções criadas em cada país, temos na prática o terceiro custo mais alto no valor das propinas.
Em 2012 foi divulgado um estudo realizado pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa que contribui para desmontar um equívoco que creio instalado na sociedade portuguesa. Comparativamente a muitos outros países da Europa, Portugal tem um dos mais altos custos para as famílias para um filho a estudar no ensino superior, ou seja, as famílias portuguesas fazem um esforço bem maior, em termos de orçamento familiar, para que os seus filhos acedam a formação superior. Neste cenário, o número de desistências da frequência tem vindo a aumentar pois muitos alunos ou famílias  não suportam os encargos com o estudo. Sabe-se também dos constrangimentos na atribuição de bolsas de estudo.
Como sempre que abordo estas matérias, finalizo com a necessidade de, uma vez por todas, evitar o discurso "populista" do país de doutores, continuamos com uma enorme probabilidade não cumprir a meta europeia para 2020 de 40% de licenciados no escalão etário 30-34 anos. 

OS PROFESSORES A MAIS E OS ALUNOS A MENOS. Será?

O Público apresenta um trabalho interessante sobre os dados do sistema de educação em Portugal, mostrando as variações da demografia escolar e do número de professores considerando a informação divulgada pelo MEC relativa aos anos de 2010/2011 e 2011/2012.
Dada a natureza deste espaço, umas breves notas. Exceptuando os adultos em processo de formação, verifica-se, sem surpresa, que existem menos alunos, cerca de 13 000 sendo que a diferença se deve ao 1º ciclo, resultado dos últimos anos com crescimento negativo, mas um aumento de alunos no 3º ciclo e sobretudo no ensino secundário, situação que deve acentuar-se devido ao aumento da escolaridade para os 18 anos.
No que respeita aos professores verifica-se também um fortíssimo abaixamento, cerca de 9500 professores, que terá sido ainda mais significativo no ano  de 2012/2013.
Os números evidenciam que a justificação da demografia para os cortes no número de professores carece de sustentação e são bem mais resultado da PEC - Política Educativa em Curso que das variações do número de alunos.
O Ministério tem também vindo a sustentar o número de vagas definido com “a actual conjuntura económica e financeira” pelo que promove “a empregabilidade possível”, sendo que as “vagas colocadas a concurso foram definidas em função das necessidades reais e futuras do sistema” o que aliás nem sequer corresponde ao que na verdade aconteceu.
Como já tenho referido, parece-me claro que a questão do número de professores necessário ao funcionamento do sistema é uma matéria bastante complexa que, por isso mesmo, exige serenidade, seriedade, rigor e competência na sua análise e gestão, exactamente tudo o que tem faltado nesta matéria, incluindo a alguns discursos de representantes dos professores.
Para além da questão da demografia escolar que, aliás, o MEC tratou de forma incompetente e demagógica, importa não esquecer que existem muitos professores deslocados de funções docentes, boa parte em funções técnicas e administrativas que em muitos casos seriam dispensáveis pois fazem parte de estruturas do Ministério pesadas, burocráticas e ineficazes.
Por outro lado, os modelos de organização e funcionamento das escolas, com uma série infindável de estruturas intermédias e com um excesso insuportável de burocratização, retiram muitas horas docentes ao trabalho dos professores que estão nas escolas.
No entanto e do meu ponto de vista, o “excesso” de professores no sistema e sem trabalho deve ser também analisado à luz das medidas da PEC – Política Educativa em Curso. Vejamos alguns exemplos.
Em primeiro lugar, a mudança no número de professores necessário decorre do aumento do número de alunos por turma que, conjugado com a constituição de mega-agrupamentos e agrupamentos leva que em muitas escolas as turmas funcionem com o número máximo de alunos permitido e, evidentemente, com a as implicações negativas que daí decorrem.
As mudanças curriculares com a eliminação das áreas não curriculares que, carecendo de alterações registe-se, também produzem um desejado e significativo “corte” no número de professores, a que acrescem outras alterações no mesmo sentido.
O Ministro “esquece-se” obviamente destes “pormenores”, apenas se refere à demografia e aos recursos disponíveis para, afirma, definir as necessidades do sistema.
Este conjunto de medidas, além de outras, sairão, gostava de me enganar, muito mais caras do que aquilo que o MEC poupará na diminuição do número de docentes, que ficarão no desemprego, muitos deles tendo servido o sistema durante anos.
Ficarão sem trabalhar, não porque sejam incompetentes, a maioria não o é, não porque não sejam necessários, a maioria é, mas “apenas” porque é preciso cortar, custe o que custar.
Conhecendo os territórios educativos do nosso país, julgo que faria sentido que os recursos que já estão no sistema, pelo menos esses e incluindo os contratados com muitos anos de experiência, fossem aproveitados em trabalho de parceria pedagógica, que se permitisse a existência em escolas mais problemáticas de menos alunos por turma ou ainda que se utilizassem em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades.
Os estudos e as boas práticas mostram que a presença de dois professores na sala de aula são um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio precoce às dificuldades dos alunos.
Sendo exactamente estes os dois problemas que afectam os nossos alunos, talvez o investimento resultante da presença de dois docentes ou de mais apoios aos alunos, compense os custos posteriores com o insucesso, as medidas remediativas ou, no fim da linha, a exclusão, com todas as consequências conhecidas.
É só fazer contas. E nisso o Ministro Nuno Crato é especialista.

DE TANTO CHUMBAR, UM DIA APRENDES

Em 2011/2012 a taxa de conclusão do ensino básico baixou  de 86,2% para 83,1%, um dos valores mais baixos dos últimos anos.
O número ainda significativo de chumbos, traduzindo a convicção errada de que a repetição só por si conduz ao sucesso, acaba por promover a instalação do que a OCDE já classificou de "cultura da retenção".
Na verdade, muitos estudos, nacionais e internacionais, mostram que os alunos que começam a chumbar, tendem a continuar a chumbar, ou seja, a simples repetição do ano, não é para muitos alunos, suficiente para os devolver ao sucesso. Os franceses utilizam a fórmula “qui redouble, redoublera” quando referem esta questão.
Nesta conformidade e do meu ponto de vista, a questão central não é o chumba, não chumba e quais os critérios ou o número de exames, mas sim que tipo de apoio, que medidas e recursos devem estar disponíveis para alunos, professores e famílias de forma a evitar a última e genericamente ineficaz medida do chumbo. É necessário diversificar percursos de formação com diferentes cargas académicas e finalizando sempre com formação profissional. Como é evidente este tipo de discurso não tem rigorosamente a ver com "facilitismo" e, muito menos, com melhoria "administrativa" das estatísticas da educação uma tentação a que nem sempre se resiste.
Neste cenário a insistência na introdução de mais exames como panaceia da qualidade corre, do meu ponto de vista, o risco do trabalho escolar se organizar centrado na preparação dos alunos para a multiplicidade de exames que realizam, ou seja, como me dizia há tempos um professor do ensino secundário, "o trabalho com os alunos é muito interessante mas a partir de certa altura sou eu e eles contra os exames".
Esta perspectiva, mais exames como fonte de qualidade, parece decorrer da estranha convicção de que se medir muitas vezes a febre, esta irá baixar o que é, no mínimo, ingénuo.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

COM AMIGOS ASSIM, QUEM PRECISA DE INIMIGOS

Segundo dados oficiais, a Alemanha poupou cerca de 41 mil milhões de euros com a crise das dívidas soberanas na zona euro devido à queda das taxas de juro sobre a sua taxa de dívida pública, considerada um "refúgio seguro" pelos investidores do mercado.
Nada de novo embora os números sejam significativos.
Lembrar-se-ão de dados de Julho que mostravam como os grupos empresariais franceses e alemães foram os que mais beneficiaram das políticas de ajuda do BCE sendo prejudicadas as empresas espanholas e portuguesas. As taxas de juro do BCE decididas como medidas de apoio à economia e a forma como os bancos gerem as taxas de juro nos empréstimos às empresas, levaram a que, de acordo com a Comissão Europeia as pequenas e médias empresas portuguesas, gregas, espanholas e cipriotas as que mais são penalizadas pagando taxas de juro por empréstimos bancários entre os 6% e os 7% sendo que as alemãs e as francesas beneficiam de uns mais simpáticos 2% a 3%. Muito interessante e elucidativo.
Aliás, segundo o "Financial Times", com base em dados do Banco Central Europeu estima-se uma diminuição de cerca de 42 mil milhões de euros em pagamentos de dívida pelas empresas europeias nos próximos cinco anos. Acontece que esta diminuição envolve sobretudo os grandes grupos empresariais alemães e franceses admitindo-se uma poupança de 14 e 9 mil milhões de euros, respectivamente e a Itália, com uma diminuição de 2,3 mil milhões. No entanto e curiosamente, Portugal e Espanha verão as suas empresas ainda mais penalizadas do que já estão com o aumento do pagamento.
Um mês antes, dados do Eurostat mostravam como de 2009 para 2012 os países do Centro e Norte da Europa ficaram mais ricos e os do Sul mais pobres, ou seja e como sempre, a crise tornou os ricos mais ricos e os pobres mais pobres. Para exemplificar, Portugal em 2009 tinha Portugal um PIB per capita 80% da média da EU27 para em 2012 passar para 75% sendo agora um dos quatro países com menor poder de compra.
A análise dos dados mostra como os países envolvidos em programas de austeridade impostos pela "ajuda" estão a afundar-se em dificuldades e os países que generosamente "ajudam" vão enriquecendo.  Deve ser a isto que chama solidariedade e coesão europeias.
Parece claro que para além das enormes responsabilidades políticas internas, importa considerar como, sem surpresa face a muitos dados já conhecidos, que os países mais ricos têm beneficiado fortemente com os pacotes de "ajuda solidária" dirigidos, impostos, aos países mais pobres com os resultados conhecidos. Esta desinteressada ajuda acontece mediante a cobrança de juros altíssimos. Mais um exemplo, Portugal paga por ano 4,4% do seu PIB em juros, 7,2 mil milhões de euros, valor que voa dos nossos bolsos para "dezenas de cofres de Estados e bancos europeus".
Por outro lado e como também se sabe,  as economias fortes do norte da Europa financiam-se a taxa zero ou mesmo, estranhamente a taxas negativas, enquanto nós, as economias do sul e a Irlanda pagamos juros altos cujo montante seria um excelente contributo para a redução dos nossos problemas de equilíbrio. Está certo, somos pobres, temos o dinheiro mais caro, os mais ricos têm o dinheiro mais barato. Deve ser isto a que chamam os mercados a funcionar.
Eu sei que sou estúpido, a economia e as finanças constituem uma matéria inacessível ao cidadão comum, mas parece-me, certamente de forma errada, que assim se torna mais difícil que os países em dificuldades deixem de ser pobres e que haja maior equidade e coesão económica e política na União Europeia.
Que não me levem a mal os nossos generosos amigos, mas às vezes até penso que é justamente isso que pretendem com a ajuda desinteressada que nos dão, que, naturalmente, temos de pagar mas que nos vai deixando pobres.
Tenho até medo de estar a ser injusto para com os nossos generosos amigos e para com os feitores que em seu nome nos administram e estão de forma tão empenhada e eficaz a promover o nosso empobrecimento.

CAMPANHAS ELEITORAIS LOW COST. Sim, mas não exagerem

Ao que parece, dado o tempo de contenção que atravessamos, os diversos partidos concorrentes às próximas eleições autárquicas prevêem gastos de 9.6 milhões de euros na campanha eleitoral. Se considerarmos que nas eleições de 2009 PSD e PS estimavam gastar cerca de 50 milhões, a diferença é substancial.
Trata-se sem dúvida de uma decisão interessante e oportuna mas, devo confessar, que esta opção por campanhas low cost me levanta algumas inquietações.
Não sei como se reflectirá nas acções e materiais das campanhas esta redução de custos mas consideremos alguns iniciativas mais habituais.
Talvez seja reduzida a utilização de outdoors, são caros e em termos estéticos alguns, valha-nos Deus, pelo que a redução é positiva mas, por outro lado, custa-me ver milhares de rotundas sem as promessas que em todas as campanhas são feitas, quase sempre, com as mesmas caras e chavões.
Uma outra forma de economizar poderia ser a reciclagem dos tempos de antena de campanhas anteriores. Em muitos discursos de muita gente, não há novidades, é o que se convencionou designar por cassete.
No entanto, embora simpatize com campanhas eleitorais low cost acho que é preciso ter alguma cautela e não exagerar.
Por favor, peço encarecidamente aos responsáveis partidários pelas campanhas que não cortem na distribuição das esferográficas, sacos e bonés que tanto nos atraem e pelos quais somos capazes de criar conflitos.
Agradeço ainda que não cortem aqueles megacomícios em que é preciso trazer gente de fora. Nós portugueses apreciamos uma viagenzinha de borla mesmo que tenhamos que dar vivas a um partido e agitar uma bandeira. Sempre espairecemos um bocado das agruras da vida.
Finalmente, solicito encarecidamente que não deixem de organizar uns almocinhos ou jantares de campanha que são deliciosos e baratos. É certo que variam entre o bacalhau com natas, a carne assada e os bifinhos com cogumelos, uma vedeta musical e ainda levamos com os discursos. Bom, mas também temos que fazer algum sacrifício, o preço compensa.
Vamos ver como correm então as campanhas eleitorais low cost. E, sobretudo, como acabam.

domingo, 18 de agosto de 2013

PELA EDUCAÇÃO É QUE VAMOS

A realização da tourada em Viana do Castelo, aceite pelo Tribunal contra a decisão da Câmara, e a abertura da época da "morte ao touro", reabrem o debate sobre a realização das touradas, quer envolvam as excepções com a morte do  touro, como o caso de Barrancos, quer na versão mais soft em que o touro não é morto, (na praça).
Poder-se-á, o que não é raro, dizer que existem assuntos mais importantes a merecer discussão mas, do meu ponto de vista, vale a pena insistir, sobretudo quando as matérias estão com tempo de antena e, portanto, susceptíveis de envolver mais gente.
Como já tenho afirmado, lamento mas nem sequer me parece discutível a existência das touradas, com ou sem morte dos touros na arena.
Esta discussão é insustentável num plano racional, o touro é objecto de um tratamento que causa mal-estar e sofrimento e entender esta situação como um espectáculo cultural é algo que me escapa. Por outro lado, o argumento habitual de natureza económica e de preservação da espécie é, do meu ponto de vista, curto, estas questões poderiam ser acauteladas sem a realização de touradas como também já tem sido referido.
Na verdade, a defesa da tourada radica em questões de natureza emocional, cultural, psicológica ou sociológica que entendo mas que não tenho que subscrever, o que torna particularmente difícil uma discussão racional e conclusiva.
No entanto, parece-me que a argumentação mais frequente, a tradição e cultura que este "espectáculo", a "festa brava" alimenta não colhe só por si. Como é óbvio, nada se deve manter só porque é tradicional ou integrado na cultura, se tal representar um atentado a direitos básicos. Posso, com uma ponta de demagogia evidentemente, evocar a "tradição" e "cultura" que alimentaram os combates de gladiadores, escravatura, a pena de morte, ou mesmo a violência doméstica e a exploração infantil, que de tradição e cultura passaram a procedimentos inaceitáveis ou mesmo criminalizados.
Sabemos que as mudanças em matéria de "cultura" e "tradição" são difíceis, são lentas, mas ... "e pur si muove". Também me parece que a mudança será mais fácil com a emergência de gerações mais novas que crescem sem o peso da "tradição" e da "cultura" que nós mais velhos carregamos e que mais dificilmente alteramos.
Como em tudo, pela educação é que vamos, numa variante à fórmula de Sebastião da Gama.