Em texto de opinião no Público sobre
a questão da educação inclusiva, Rita Soares, psicóloga clínica no CADIn –
Neurodesenvolvimento e Inclusão, termina escrevendo, “Nas novas escolas
inclusivas, para que a inclusão não passe de uma utopia, vai ser necessário
mais do que o Decreto-Lei nº 54/2018. Vai ser necessária a continuação do
investimento, da reflexão e da construção constantes.
Algumas notas.
Como muitas vezes afirmo não
acredito numa escola inclusiva, nada do que diga respeito a humanos é
verdadeiramente inclusivo pelo que a escola também não o pode ser, a sociologia
e a experiência demonstram-no desde que existe escola. O insucesso escolar, o
abandono, a retenção são formas não ultrapassadas de exclusão.
Acredito, isso sim, e é um
trajecto em que estou envolvido há décadas, que possamos ir construindo
contextos educativos assentes em princípios de educação inclusiva. Dito de
outra forma, estando todas as crianças e jovens em idade escolar na escola que
todos frequentam, acredito e defendo que em cada momento e em cada escola temos de identificar e contrariar processos de insucesso e de exclusão que se instalam
pelas mais variadas razões, a deficiência é apenas uma delas, sendo que muitas vezes a origem do processo de exclusão nem está sediado no aluno. Continuamos
excessivamente presos à “ideia” de que educação inclusiva é algo que respeita a
alunos com necessidades especiais, ainda mantenho esta terminologia.
Este caminho de educação
inclusiva tem como base ser (direitos respeitados), estar (onde estão os pares
da mesma idade das comunidades), aprender (tendo sempre por referência o currículo
que se define para todos), participar (tanto quanto possível nas actividades
comuns da comunidade educativa) e pertencer (perceber-se e ser percebido como “alguém”
da escola, do grupo).
Este caminho é fundamentalmente
matéria de direitos e não exclusivamente de opções políticas ou científicas.
Quanto à utopia, não, não é uma utopia,
todos conhecemos múltiplas situações de alunos que, independentemente, da
natureza dos seus problemas desenvolvem percursos educativos bem-sucedidos e,
vamos chamar-lhes assim, inclusivos. Por tanto, não é uma utopia, é possível.
A questão é que também conhecemos
múltiplas situações de escolas, professores e técnicos que guetizam, excluem,
não promovem direitos, participação, pertença e aprendizagem, os verdadeiros
critérios de educação inclusiva que transformam a “integração” em “entregação”,
os alunos estão “entregados”, não integrados muitas vezes … em nome da
inclusão.
Considerando agora o Decreto-Lei
nº 54/2018, como já muitas vezes afirmei e escrevi quero muito que do processo
de alteração resulte mais qualidade nos processos educativos de todos os
alunos, menos exclusão, tantas vezes em nome da … inclusão, mais participação
de todos os alunos nas actividades comuns, mais apoios e de qualidade aos professores
de ensino regular, os actores centrais nos processos educativos de todos os
alunos para além dos pais, a disponibilização de recursos suficientes,
adequados e em tempo oportuno e dispositivos de regulação do trabalho
desenvolvido que minimizem os efeitos em que, perdoem-me o excesso e a
repetição, da dimensão o sistema é verdadeiramente inclusivo, coexistem sem um
sobressalto práticas excelentes com práticas e discursos que atentam contra os
direitos de alunos, famílias e docentes.
No entanto, temo que apesar de
uma “nova lei” se mantenha algum “velho” quadro de práticas e visões.
O novo quadro legislativo para a
educação inclusiva vem acompanhado de um “Manual de apoio à prática”.
Constituirá certamente um bom contributo para as desejadas boas práticas de resposta educativa à diversidade mas …
precisava de se chamar “manual”?
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