Através do blogue do Paulo Guinote encontrei uma notícia que merece reflexão. A Rede Europeia Anti-Pobreza
(EAPN) em Portugal, Jardim Moreira divulgou a assinatura de um protocolo com o
ME visando o “combate à pobreza em Portugal, a partir das escolas”.
A iniciativa procurará chegar
progressivamente a toas as escolas com o desenvolvimento de projectos e o
envolvimento de alunos e docentes. Claro.
Não está, evidentemente, em
discussão a importância de que a educação de crianças e jovens envolva as grandes
questões das comunidades, antes pelo contrário, é importante. No entanto, umas
notas breves.
Por diversas ocasiões tenho aqui
manifestado a minha reserva face ao entendimento de que tudo o que possa de
alguma forma dizer envolver os mais novos deve ser ensinado/trabalhado na
escola. Esta visão obesa da escola não funciona, nem tudo pode ou deve ser transformado
em disciplinas, conteúdos escolares, projectos, … para além de que a escola tem
um conjunto de funções incontornáveis que tornam finita a sua capacidade de
responder.
Por outro lado, foi-se instalando
em Portugal, não só em Portugal mas também em Portugal, a ideia de uma
educação, de uma escola, fundamentalmente centrada em competências
instrumentais, em saberes “úteis”, "essenciais" como lhes chamava
Nuno Crato, destinada sobretudo a formar “técnicos” e não “cidadãos”
qualificados. Os currículos são progressivamente aliviados de conteúdos que não
sejam “práticos”, promotores de “produtividade”, “domínio de técnicas” como
seja toda a área da formação cívica, da educação para a saúde, dos valores, das
expressões e conteúdos artísticos, etc.
A escola deve formar empresários,
poucos, e técnicos qualificados e de formação estreita, muitos. Estas ideias
traduziram-se, traduzem-se apesar de algumas mudanças indiciadas e afirmadas,
nos conteúdos curriculares, nos modelos de avaliação, nas concepções do que
deve ser o trabalho dos professores, na organização do sistema educativo,
selectivo, prescritivo e incapaz de acomodar diferenças entre os alunos, etc.
Entretanto, com a mudança no ME e
a definição do Perfil dedo Aluno para o Séc. XXI reabriu-se a mudanças em
matéria de currículo, agora em modo flexibilidade mas ainda pouco claro.
Sabemos que, independentemente
das opções e visões ideológicas, uma das questões que no universo a educação
estarão sempre em aberto é a que envolve os conteúdos e organização curricular.
De facto, a velocidade de produção e acesso ao conhecimento e ao
desenvolvimento, as mudanças nos sistemas e no quadro de valores das
comunidades determinam a regular reflexão e ajustamento sobre o que a escola
deve ensinar e trabalhar, sobretudo durante a escolaridade obrigatória.
Por outro lado, o tempo da escola
e a competência da escola são finitos, isto é, a escola não tem tempo nem pode
ou deve ensinar tudo. Lembram-se certamente das discussões sobre se matérias
como educação sexual, educação cívica, literacia financeira, educação para a
saúde, para citar apenas alguns exemplos, deverão, ou não, constituir-se como
"disciplinas", conteúdos ou mesmo se devem integrar os currículos
escolares.
Em princípio, independentemente
dos conteúdos poderem ser mais ou menos pertinente, vejo sempre com alguma
reserva as propostas de introdução de mais uma disciplina, mais conteúdos, mais
um manual, mais umas orientações, mais um programa de formação de professores, como
se a escola, o currículo escolar, os conteúdos, as suas competências, pudessem continuar a
engordar indefinidamente. E não se trata de um problema de recursos ainda que
seja de considerar.
Como é evidente, pode dizer-se
sempre que muitas destas questões podem integrar o trabalho escolar
considerando até que os alunos passam um tempo imenso, diria excessivo, nas
escolas. Aliás, tal acontece em muitas escolas e agrupamentos.
A questão central, do meu ponto
de vista, é que as competências da escola, os conteúdos que nela são
trabalhados, integrando ou não formalmente os currículos, não podem mesmo
aumentar continuamente. Urge uma reflexão serena, participada e com tempo sobre
o ajustamento dos conteúdos, a sua integração e organização, a forma como podem
acomodar a diversidade dos alunos e a necessidade de diferenciação dos
professores, a formação global dos alunos e não exclusivamente a promoção de competências instrumentais,
etc.
Somar conteúdos e competências à
escola sem ajustamento dos conteúdos e organização existentes, pode promover
problemas e não soluções, de tanto que lhe exigem corre risco de não
providenciar o que lhe compete.
Na verdade, nem tudo o pode ser
interessante saber terá de caber numa disciplina da escola ou num conteúdo
escolar formal e nem tudo o que se pode saber se aprende na escola. A
dificuldade é que os alunos estão muito tempo na escola e a tentação é óbvia, a
escola que faça.
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