quarta-feira, 28 de junho de 2017

O VELHO QUE COLECCIONAVA SONHOS

Estes dias feios e turbulentos que vão passando recordaram-me um Velho que tinha um gosto curioso, coleccionava sonhos.
Acho que só mesmo os velhos têm o tempo necessário para coleccionar, não o tempo medido no relógio, mas o tempo medido na alma. Pois este Velho tinha já uma boa colecção de sonhos. Era uma colecção muito interessante porque quase não existem repetições, mesmo quando os sonhos são sobre o mesmo tema, cada pessoa sonha à sua maneira e, por isso, nunca o Velho Coleccionador encontrou dois sonhos rigorosamente iguais.
Pedindo às pessoas que conhecia, que pediam às pessoas que conheciam, os sonhos já sonhados e de que não precisassem, o Velho Coleccionador aproveitava-os para a sua colecção extensa e variada.
A primeira operação era ver o estado em que vinha cada sonho e cuidar dele, se necessário. Havia sonhos que, de tanto sonhados pelo sonhador, vinham mais gastos, faltavam bocadinhos, por exemplo. O Velho Coleccionador tentava então encontrar bocadinhos de sonho que os pudessem completar e restaurar. Ficavam como novos alguns desses sonhos, prontos a serem sonhados como se fosse a primeira vez. Alguns chegavam-lhe à mão incompletos, sonhos que se interromperam ao ser sonhados, porque atemorizaram o sonhador que acordou, encontrou muitos casos destes.
A segunda operação era arrumá-los. O Velho Coleccionador tinha os sonhos arrumados em dois grandes armários, um para sonhos bons e outro para sonhos maus. Este armário, o dos sonhos maus, estava sempre fechado à chave, o Velho Coleccionador tinha medo que os netos que adoravam a colecção de sonhos, mexessem nos sonhos maus sozinhos e se assustassem. Dentro de cada armário os sonhos estavam ainda arrumados pelos temas, uma quantidade de temas diferentes.
Às vezes, o Velho Coleccionador, quando lhe aparecia alguém aborrecido com a vida emprestava alguns dos sonhos bons e mais bonitos que tinha na colecção. Ele próprio, o Velho Coleccionador adormecia todas as noites com um sonho desses à cabeceira. Era um Velho tranquilo, como só os velhos que sonham sonhos bons podem ser.

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