sábado, 17 de junho de 2017

"DOPING" MENTAL

O bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses, em entrevista ao Público, chama a atenção para aumento do consumo de fármacos na época das avaliações escolares.
Este consumo de fármacos não é um problema novo mas, do meu ponto de vista e como já o tenho referido aqui, é uma matéria que continua a exigir mais atenção e, sobretudo, intervenção. No entanto, como também afirma o bastonário, faltam os meios. Assim sendo … que venham as drogas. É uma questão de opção.
De facto, os ansiolíticos e o metifenidato (mais conhecido por uma das designações comerciais, Ritalina) são consumidos em níveis preocupantes que aparentemente ainda são mais elevados em época de exames. Aliás, o metilfenidato também é conhecido pelo “comprimido da inteligência” o que é ilustrativo.
Segundo estudo realizado pelo ISCTE e pela Egas Moniz – Cooperativa de Ensino Superior sobre Medicamentos e Consumos de Performance, divulgado em 2014, cerca de um quarto dos jovens portugueses, dos 18 aos 29 anos, assume ter consumido fármacos para melhorar a concentração e o mesmo número assume o consumo para descontrair e acalmar.
Este consumo e a forma de o minimizar têm de considerar alguns aspectos relativos aos estilos de vida actuais, bem como ao quadro de valores subjacente.
Em primeiro lugar e como tantas vezes tenho afirmado, a pressão para a excelência no desempenho escolar tem vindo a aumentar seriamente quer no contexto familiar quer também em muitas comunidades escolares, já não se confina à pressão para o alto rendimento desportivo, área em que a situação era mais conhecida. Acresce que em termos gerais, dadas as dificuldades e a competição, a pressão para o rendimento é algo de constante e abrangente.
Muitas pessoas, crianças, jovens ou adultos, lidam mal com esta enorme pressão para o alto rendimento e ambientes competitivos. A experiência tem-me mostrado variadíssimos casos de crianças evidenciando enorme dificuldade em gerir a pressão familiar para a excelência dos resultados escolares. Neste quadro germina facilmente quadros severos de ansiedade que são mais um “incentivo” à busca de uma ajuda química que a faça diminuir.
Por outro lado, são também conhecidos os excessos no consumo de álcool entre os adolescentes que entre si não aceitam facilmente ter um desempenho "inferior" ou medíocre em situações de grupo.
A esta pressão para o "alto rendimento" acresce a facilidade de acesso aos medicamentos e a atitude de automedicação que nos leva a sermos um dos países em que este comportamento mais prevalece e em que se consomem mais psicofármacos.
Finalmente, uma atitude genérica face ao trabalho, o trabalho escolar por exemplo, que nos faz remeter para a véspera o que deveria ser realizado de forma mais regular e espaçada no tempo. Tal facto, aumenta a sobrecarga e a pressão em curtos períodos de tempo que solicita então uma "ajudinha milagrosa" que algum colega sempre sugere e sempre se consegue.
O "doping mental" não é, no entanto, um problema dos estudantes, é, apenas, uma das muitas faces daquilo que são os nossos estilos de vida que, estes sim, deveriam merecer alguma atenção, designadamente nos programas educativos.
Seria também necessário que as escolas e agrupamentos contassem com os recursos necessários e competentes para minimizar este tipo de problemas. Como o bastonário também afirma o número de psicólogos que integrem as equipas de agrupamentos e escolas, bastante inferior às orientações internacionais sobre esta matéria, sendo que boa parte deles tem contratos provisórios para assumir funções e lidar com problemas que são permanentes e o recurso ao “outsourcing” para prestar serviços de psicologia nas escolas é um fingimento de resposta apesar do empenho e competência da generalidade dos psicólogos envolvidos que recebem muitas vezes uma indignidade que é mais um subsídio de sobrevivência que um salário e desenvolvem apoios contabilizados ao minuto e dificilmente suficientes e eficazes.
Ao que também é dito e conforme sucessivos anúncios está previso o aumento de técnicos para o próximo ano lectivo que, aliás, já deveria ter sido para este que está a terminar.
A ver vamos.

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