quarta-feira, 7 de junho de 2017

OS PROBLEMAS DAS MINORIAS SÃO, EVIDENTEMENTE, PROBLEMAS MENORES OU MESMO ... NÃO PROBLEMAS

A Associação Ilga Portugal — Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo apresentou ontem um projecto com o objectivo de minimizar os comportamentos de bullying homofóbico e transfóbico. O projecto, “Aliança Da Diversidade” tem como destinatários estudantes a frequentar escolas do norte e centro sendo intenção a sua extensão a todo o país.
São frequentes os discursos ou comportamentos discriminatórios face à orientação sexual ou identidade de género em contexto escolar. De acordo com dados da Agência para os Direitos Fundamentais da União Europeia, 94% dos jovens LGBT ouvem ou testemunham comentários e comportamentos negativos em contexto escolar em Portugal", lê-se no Público. Acresce que a apresentação de queixa por parte das vítimas é rara o que é também um dado significativo.
Com demasiada frequência os problemas das minorias são eles próprios percebidos como problemas menores ou mesmo como não problemas.
Em 2014 foi divulgado um estudo referindo as dificuldades das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em lidar com crianças e jovens com orientações sexuais diferentes, um problema que raramente é abordado mas que é fonte de sofrimento para muitas crianças, adolescentes famílias.
Um Relatório da Rede Ex-Aequo referia que no ano de 2012 se registaram 37 denúncias de homofobia e transfobia, sendo que 42 % da juventude lésbica, gay ou homossexual afirmou ter sido vítima de bullying homofóbico, 67% dos jovens declarou tê-lo presenciado e 85% afirmou já ter ouvido comentários homofóbicos na escola que frequenta. Em muitas situações desta natureza emergem quadros “baixa auto-estima, isolamento, depressões e ideação e tentativas de suicídio”, contribuindo ainda para o insucesso e para o abandono escolar de muitos jovens. O mesmo relatório referia ainda episódios recorrentes de bullying homofóbico em contextos de praxes académicas, situação que já aqui também comentei.
Recordo que em Novembro de 2011, dados da UNESCO referiam que cerca de 70 % de alunos homossexuais afirma ser vítima de bullying e ainda que também no início de 2011, dois serviços do ME recusaram apoiar a distribuição pelas escolas de material produzido no âmbito do Programa Inclusão apoiado e financiado pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género. Estes materiais destinavam-se a apoiar uma campanha de combate a atitudes e comportamentos discriminatórios relativamente à orientação sexual.
A justificação, segundo a imprensa na altura, para que a Direcção Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular e o Núcleo de Educação para a Saúde, Acção Social e Apoios Educativos recusassem o apoio uma iniciativa envolvendo uma outra estrutura pública foi o "cariz ideológico" das matérias.
Para além da óbvia confusão entre ideologia e valores, ficou estranho, no mínimo, o entendimento de que a prevenção e combate à atitudes de discriminação face a minorias que tem uma incidência fortíssima e que os dados hoje divulgados só confirmam, se possa recusar por se tratar de ideologia. Pela mesma ordem de razões, não devem ser incentivadas e muito menos apoiadas pelo ME, acções que, por exemplo, combatam a xenofobia ou o racismo, terão certamente um "cariz ideológico".
Este tipo de decisões, para além da evidente incompetência, é revelador de uma assustadora irresponsabilidade. É reconhecida a presença de comportamentos discriminatórios face a minorias de diferente natureza. Sabe-se que tanto como na remediação, importa apostar na prevenção, parece claro que em matéria de prevenção o público mais jovem terá de ser sempre ser um alvo privilegiado, é de "pequenino que se torce o pepino", e foi o Ministério da Educação que se opôs a iniciativas que outros organismos públicos julgaram relevantes. A titular da pasta da educação ainda veio alguns dias depois apresentar umas desculpas irrelevantes e que não alteraram a substância da primeira decisão.
É claro que face à dimensão dos incidentes de bullying, de discriminação ou de má abordagem, que continuam a verificar-se, e dirigidos a um alvo em particular a que acrescem os outros comportamentos da mesma natureza, esta questão se transforme numa preocupação não ideológica mas de direitos e de natureza civilizacional no contexto das políticas e processos educativos.
Neste contexto percebe-se as dificuldades de resposta das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens a crianças e adolescentes com orientação sexual diferente. Juntam-se, aliás, às dificuldades que também sentem por várias razões, meios e volume e complexidade de casos, por exemplo, em dar resposta a outras situações.
Veremos a adesão e o alcance do projecto agora anunciado.

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