A tragédia recente tem produzido
na imprensa e nas redes sociais uma gigantesca chuva de ideias, opiniões,
críticas, debates, etc., envolvendo especialistas reconhecidos, especialistas autodesignados,
opinadores profissionais ou amadores, senadores(?), comentadores, achistas e
tudólogos, os que sabem de tudo e também, evidentemente de
fogos florestais.
A forma como boa parte desta gente
opina, e quase sempre quanto maior a ignorância maior se torna a arrogância, vem acentuar algo
que do meu ponto de vista vai caracterizando o nosso quotidiano.
A evolução dos modelos de organização social,
económica e cultural das sociedades conduziu a um progressivo abandono da
troca, substituindo-a pela compra e venda. A concepção romântica da troca de
produtos, já não passa de isso mesmo, de romantismo, tudo se compra e vende.
Não digo isto por entender que deveria ser de outra forma, não vislumbro que
pudesse ser de outra forma.
Apenas lamento que até a troca de
ideias e saberes tenha sido substituída pela venda das ideias e do saber, real ou imaginado. Já é difícil assistir a
uma conversa entre pessoas que pensam e sabem alguma coisa do que estão falar
sem que os intervenientes assumam a postura de quem está a vender as suas
ideias e não, apenas a trocá-las com os outros parceiros. Os debates, jogam-se
mais em torno das técnicas de marketing, de venda, das ideias que dos conteúdos
das mesmas. Cada vez consigo menos participar numa tertúlia, mais formal ou
mais informal, sobre um qualquer tema, mais denso ou mais ligeiro, em que os
companheiros de conversa não tentem vender as suas ideias e saberes, obrigando-me á sua compra.
Quase sempre encontro pessoas
pouco dispostos a trocar as suas ideias e saberes com o que eu próprio carrego, a experimentá-las, apreciá-las
e, se for caso disso, também as usarem ou eu achar que as ideias e saberes (ou crenças) que me foram
apresentadas, não impostas em agressivas e às vezes mal-educadas técnicas de
convencimento, são interessantes conjugando-as ou substituindo as minhas.
Nas discussões as frases já
começam pouco com “que achas?”, “que te parece” ou outra fórmula qualquer que
ajude a aceder ao pensamento do outro. Começamos cada vez mais as frases com “É
assim”, “Não, isso está errado, deve ser assim” e outras alternativas que
apenas servem para apresentar a definitiva e indiscutível ideia e saber sendo que frequentemente a
opinião é mascarada e vendida como saber.
Este cenário, pouca troca e muita
venda agressiva, numa terra de achistas e opinadores profissionais
empobrece-nos a todos, menos a alguns iluminados, os que vendem as ideias e os saberes.
No entanto, como se sabe, os
mercados estão atentos e tudo é … mercado.
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