Num tempo de chumbo lembrei-me do
Brincalhão. O Brincalhão foi um companheiro de escola durante alguns anos. Não
era o seu nome mas era assim que todos o tratávamos.
Era um tipo fantástico, com ele
presente não havia depressão ou mau humor que resistisse. Percebia quando
alguém do grupo não estava bem e encontrava sempre a melhor forma de, sem se
tornar excessivo, recompor o ânimo mais em baixo.
Disponível para quase tudo, as
conversas com o Brincalhão não tinham fim, discutia tudo com um empenho
convicto mas sempre com um inultrapassável sentido de humor que só por si
justificava a discussão.
Uma outra particularidade que
mexia verdadeiramente connosco era o sucesso do Brincalhão junto das miúdas.
Confesso que a inveja, coisa feia, era grande. Bem que tentávamos justificar o
sucesso com o facto de ele ser um excelente palhaço e as miúdas gostarem de
circo. A justificação não era de facto muito boa nem muito inteligente, mas não
nos ocorria outra e sempre tentávamos, sem o conseguirmos, proteger a nossa
auto-estima porque as miúdas gostavam quase todas do Brincalhão.
Para a realização de qualquer
tarefa era importante a colaboração do Brincalhão, ajudava a organizar as
dúvidas, a escolher os caminhos e sempre nos ríamos imenso. Era um tipo com uma
sensibilidade enorme às injustiças, tinha uma visão quase romântica do mundo e
da revolução que se deveria fazer. Com o fino e inteligente humor que o
caracterizava minava qualquer discurso mais conservador.
O cumprimento das estradas de
cada um levou de mansinho à dispersão do grupo. O primeiro a afastar-se e para longe,
para muito longe foi o Brincalhão.
Com o tempo fomos percebendo
todos que tínhamos perdido a pessoa mais séria que conhecemos.
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