O Relatório da Comissão de Acompanhamento
e Fiscalização dos Centros Educativos volta a sublinhar os problemas sérios
destas instituições que recebem jovens com penas de internamento por
comportamentos de delinquência cometidos antes dos 16 anos.
Um dos dados mais preocupantes é
o agravamento significativo do número de jovens com problemas de saúde mental sem o diagnóstico e acompanhamento adequados.
Segundo o Relatório, 73,5% do
total de rapazes e raparigas entre os 12 e os 16 anos que estão nos Centros Educativos
apresentam estas problemáticas. Considerando os números temos 100 entre os 136
enquanto no ano de 2015 se contavam 82 em 186 jovens internados, 44%.
Algumas notas.
Parece importante considerar que conforme dados da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais diminuiu em
8.6% o número de jovens internados em centros educativos em Dezembro de 2016
face ao número de Dezembro de 2015, 186 para 136.
Este abaixamento, pode dever-se a
uma alteração na administração da medida de internamento pois no mesmo período
foram registados 1920 pedidos de apoio a medidas tutelares educativas na
comunidade, representando um crescimento de 40,14% face a 2015. Assim, o abaixamento
do número de internamentos não será explicado apenas pela diminuição dos
comportamentos de delinquência entre jovens.
Na verdade, a experiência e os
estudos relativos à reincidência mostram que apenas prender, ou internar no
caso dos jovens, é muitas vezes insuficiente para alterar trajectos de
delinquência o que o Relatório deste ano volta a sublinhar.
Considerando os 186 jovens que em
Fevereiro de 2015 cumpriam medidas tutelares nos Centros Educativos, 144
estavam já sinalizados, referenciados, por processos de promoção e protecção.
Dito de outra maneira, trata-se de jovens com um processo longo e conhecido de
problemas e circunstâncias de vida bem adversas.
Recordo também que resultados do
Projecto Reincidências – Avaliação da Reincidência dos Jovens Ofensores e
Prevenção da Delinquência, da responsabilidade da Direcção-Geral de Reinserção
e Serviços Prisionais, e realizado entre Janeiro de 2013 e Janeiro de 2015
mostram que 33.2% dos jovens inquiridos e que já passaram por uma medida
tutelar educativa que pode incluir internamento em Centro Educativo reincidem
na prática de delitos.
Acresce que os Centros Educativos
sentem ainda forte constrangimento em matéria de recursos humanos pelo que mais
dificilmente cumprem o seu papel fundamental de reabilitação através da
construção de programas de educação e formação profissional.
Ainda de acordo com um estudo
divulgado há algum tempo realizado no âmbito do Programa de Avaliação e
Intervenção Psicoterapêutica no Âmbito da Justiça Juvenil, promovido pela
Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e co-financiado pela
Comissão Europeia, a população que está nos Centros Educativos acumula, em
geral, mais de três anos de chumbos na escola e em 80% dos casos é oriunda de
famílias de baixo estatuto socioeconómico.
Sempre que estas matérias são
discutidas, os especialistas acentuam a importância da prevenção e da
integração comunitária como eixos centrais na resposta a este problema sério
das sociedades actuais pelo que a resposta recentemente criada, (mas creio que
ainda só no papel) “casas de autonomização” pode constituir-se como um
contributo se dotada de recursos adequados.
As Comissões de Protecção de
Crianças e Jovens sentem-se incapazes de acompanhar o volume de casos das
respectivas comunidades, gerando situações, muitas conhecidas, com fim grave de
crianças que depois ficamos a saber, os dados de hoje confirmam-no, que estavam
“sinalizadas” ou “referenciadas”, mas sem resposta.
Sabemos que educação, prevenção e
programas comunitários e de integração têm custos, no entanto, importa ponderar
entre o que custa prevenir e cuidar e os custos posteriores do mal-estar e da
pré-delinquência ou da delinquência continuada e da insegurança.
Parece ser cada vez mais
consensual que mobilizar quase que exclusivamente dispositivos de punição,
designadamente a prisão, parece insuficiente para travar este problema e,
sobretudo, inflectir as trajectórias de marginalização de muitos dos envolvidos
mais novos em episódios de delinquência.
No entanto a discussão sobre
estas matérias é inquinada por discursos e posições frequentemente de natureza
demagógica e populista alimentados por narrativas sobre a insegurança e
delinquência percebida, alimentadora de teses securitárias.
Apesar de, repito, a punição e a
detenção constituírem um importante sinal de combate à sensação de impunidade
instalada, é minha forte convicção de que só punir e prender não basta.
É em todo este caldo de cultura
que nascem e se desenvolvem as sementes de mal-estar que geram os os episódios que regularmente nos assustam e inquietam e com consequências sérias.
É urgente que nos questionemos e
questionemos as instituições, em nome dos nossos filhos e dos filhos dos nossos
filhos.
Recordo Brecht, "Do rio que
tudo arrasta diz-se que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o
comprimem".
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