"Quem te ama não te agride! diz campanha contra a violência no namoro"
O Governo lança hoje uma campanha dirigida aos
adolescentes e jovens sob o tema geral “Quem te ama, não te agride!.” A campanha,
a desenvolver em várias frentes, conta com o apoio de algumas figuras públicas
e pretende combater comportamentos agressivos ou violentos nas suas relações
amorosas.
Esta questão não tem, do meu ponto de vista, merecido
a atenção que a sua gravidade e prevalência justificam.
Um trabalho da responsabilidade da
Universidade do Porto envolvendo um grupo populacional significativo, cerca de
3000 jovens nascidos em 1990, divulgado no início de 2014 mostrava que no
âmbito das relações de namoro, 60% dos jovens inquiridos relataram pelo menos
um caso de agressão psicológica, insultar por exemplo. Um em cada
três jovens também refere pelo menos um episódio de coacção sexual e
18 % referiram pelo menos um acto de violência física, bater ou arremessar um
objecto com o objectivo de atingir o outro. É ainda de registar que mais de
metade dos jovens envolvidos assume o estatuto de vítimas mas também de
agressores.
Estes números que são coerentes com outros estudos
sobre comportamentos de violência nas relações amorosas indiciam o que está por
fazer em matéria de valores e comportamentos sociais.
Recordo ainda um trabalho interessante de há algum
tempo divulgado UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta, um estudo
envolvendo 885 pessoas com idades entre os 11 e os 18 a frequentar escolas da
área do Porto e de Braga. Em síntese, para mais de metade dos inquiridos neste
estudo será normal proibir ao namorado(a) o uso de determinadas roupas, 5% dos
rapazes acham que agredir a namorada não é violência. 25 % dos rapazes e 13,3%
das raparigas acham que humilhar o parceiro(a) é legítimo e 15,65 dos rapazes e
5% das raparigas entendem que ameaçar é um comportamento normal.
Este conjunto de dados é preocupante, gostar não é
compatível com maltratar, mas creio que não é surpreendente. Os dados sobre
violência doméstica em adultos que permanece indomesticável deixam perceber a
existência de um trajecto pessoal anterior que suporta os dados destes e de
outros trabalhos.
Os sistemas de valores pessoais alteram-se a um
ritmo bem mais lento que os nossos desejos e estão, também e obviamente,
ligados ao quadro de valores sociais presentes em cada época. De facto, e
reportando-nos apenas aos dados mais gerais, é relevante a percentagem de
jovens que afirmam um entendimento de normalidade face a diferentes comportamentos
que evidentemente significam relações de abuso e maus tratos.
Como todos os comportamentos fortemente ligados à
camada mais funda do nosso sistema de valores, crenças e convicções, os nossos
padrões sobre o que devem ser as relações interpessoais, mesmo as de natureza
mais íntima, são de mudança demorada. Esta circunstância, torna ainda mais
necessária a existência de dispositivos ao nível da formação e educação de
crianças e jovens; de uma abordagem séria persistente nos meios de comunicação social;
de um enquadramento jurídico dos comportamentos e limites numa perspectiva
preventiva e punitiva e, finalmente, de dispositivos eficazes de protecção e
apoio a eventuais vítimas.
Entretanto e enquanto não, "só faço isto,
porque gosto de ti, acreditas não acreditas?"
Sem comentários:
Enviar um comentário