Como seria de esperar a espirituosa
decisão de em 2013 reduzir o consumo de álcool entre os mais novos foi
"ineficaz" afirma um estudo do Serviço de Intervenção nos
Comportamentos Aditivos e nas Dependências. A investigação concluiu que os
jovens mantiveram os mesmos comportamentos de consumo com os mesmos riscos e
efeitos e consideram que a lei “não seja sempre respeitada”.
Acho que estes resultados seriam
exactamente os que seriam de esperar. A decisão que interdita as
bebidas espirituosas até aos 18 anos mas permite o consumo de vinho e cerveja aos
16 anos não tem sentido, não existe "álcool bom" e "álcool mau"
como também a restrição da publicidade ao álcool dirigida a jovens terá pouco impacto.
A intenção parece ser agora de
interditar o consumo de qualquer tipo de álcool até aos 18 anos.
Como disse na altura a legislação
em vigor foi obviamente uma cedência às pressões que logo se fizeram ouvir
quando a ideia foi anunciada. Ficou estabelecido que existe um álcool mais
álcool que outro, numa lógica pouco sustentável fora, naturalmente, dos
interesses de produtores e distribuidores de vinho e cerveja. Será certamente
excessivo, mas lembrei-me da incontornável referência do Estado Novo, “Beber
vinho é dar de comer a um milhão de portugueses”.
Neste quadro, pelos seus
potenciais efeitos, o consumo de álcool por parte de adolescentes merece alguma
reflexão, já por aqui considerada, sobretudo no que respeita à facilidade de
consumo e aquisição e aos estilos de vida.
O consumo de álcool tem vindo a
crescer alterando-se também os padrões de consumo, beber na rua (é bastante
mais barato, e o consumo excessivo e rápido (binge drinking). Segundo alguns
especialistas, a embriaguez parece deixar de ser uma consequência do consumo
excessivo para passar a ser um objectivo em si mesmo. Este padrão tem vindo a
ser sublinhado por diferentes estudos sobre os hábitos dos adolescentes e
jovens portugueses, cerca de 80% dos jovens com 15 anos consomem álcool segundo
um trabalho da Unidade de Alcoologia de Coimbra do IDT e em 2007 56% dos jovens
com 16 anos inquiridos referiram este tipo de consumos enquanto em 2003 o
indicador era de 25%. Algumas notas mais.
Uma primeiro aspecto a considerar
é o facto de os adolescentes poderem facilmente comprar cerveja e outras
bebidas, as “litrosas”ou os shots, como lhes chamam, no comércio mais habitual,
lojas de conveniência ou pequenos estabelecimentos de bairro, a um preço bem
mais acessível que nos estabelecimentos que frequentam na noite e recorrendo à
“toma” simples ou com misturas ao longo da noite, comprida aliás. A presente
legislação restringe o comércio e estabelece multas bem mais pesadas mas
veremos o efeito prático pois em diferentes domínios a restrição devido à idade
nem sempre é respeitada. O consumo em quantidade e em grupos, sobretudo ao
fim-de-semana, é muitas vezes entendido e sentido como o factor de pertença ao
grupo, potenciando a escalada do consumo, juntos bebemos mais do que sós, como
é óbvio e o estado que se atinge é sentido como um "facilitador"
relacional e temo que o controlo das idades de quem compra seja ineficaz e
facilmente ultrapassado. Por outro lado, a venda processa-se com a maior das
facilidades e sem qualquer controlo da idade dos compradores o que a alteração da
idade, só por si, não mudará. Muitos adolescentes, ouvidos em estudos nesta
matéria, referem ainda a ausência de regulação dos pais sobre os gastos, sobre
os consumos ou sobre as horas de entrada em casa, que muitas vezes tem que ser
discreta e directa ao quarto devido ao “mau estado” do protagonista.
Como é evidente, já muitas vezes
aqui o tenho referido com base na minha experiência de contacto com pais de
adolescentes, não estamos a falar de pais negligentes. Pode haver alguma
negligência mas, na maioria dos casos, trata-se de pais, que sabem o que se
passa, “apenas fingem” não perceber desejando que o tempo “cure” porque se
sentem tremendamente assustados, sem saber muito bem o que fazer e como lidar
com a questão. De fora parece fácil produzir discursos sobre soluções, mas para
os pais que estão “por dentro” a situação é muitas vezes sentida como maior que
eles.
É preciso que a comunidade esteja
atenta a estes adolescentes que logo desde os 13 ou 14 anos “acedem” às
“litrosas” e aos shots e também aos seus pais que estão tão perdidos quanto
eles.
Apesar de se poder vir a legislar no
sentido de apenas aos 18 anos ser permitida a aquisição de qualquer tipo de álcool, parecem-me imprescindíveis a adequada
fiscalização e a criação de programas destinados a pais e aos adolescentes que
minimizem o risco do consumo excessivo.
A proibição, como sempre, não
basta, restringir a publicidade só por si não adianta.
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