"Violência contra profissionais de saúde mais que duplicou em 2014"
Segundo a Direcção-Geral de
Saúde, entre Janeiro e Outubro de 2014 (DGS) registaram-se 477 casos de
violência contra profissionais de saúde no local de trabalho. Este número é
mais do que o dobro dos casos reportados em 2013, 202. Este tipo de episódios
tem vindo a aumentar significativamente desde 2007 com 35 registos.
São referidos como eventual
explicação para estes fenómenos, os potenciais efeitos que a situação de grande
dificuldade e económica que atravessamos, incluindo dificuldades específicas no
âmbito do SNS, que tornarão as pessoas mais stressadas, mais instáveis e
agressivas.
Sem minimizar estes efeitos de
natureza mais psicológica que alguns especialistas também sustentam, creio que
importa reflectir numa outra perspectiva.
Em primeiro lugar sublinhar que
os profissionais da saúde não são os únicos destinatários de
emergentes e regulares comportamentos de agressividade. Há algum tempo representantes
de forças policiais vieram a público apresentar o mesmo problema e são
demasiado frequentes e graves os episódios de agressão a professores.
Por outro lado, é minha convicção
que, para além dos efeitos da crise, vale a pena considerar dois aspectos que me
parecem essenciais, a mudança na percepção social dos traços de autoridade e o
sentimento de impunidade, que me parecem fortemente ligados a estes fenómenos.
Uma observação minimamente atenta
às mudanças sociais, culturais e económicas nas últimas décadas, permite,
creio, constatar como tem vindo a mudar significativamente a percepção social
do que poderemos chamar de traços de autoridade. Os médicos e enfermeiros,
entre outras profissões, professores ou polícias, por exemplo, eram percebidos,
só pela sua condição profissional, como fontes de autoridade, como também os
velhos, curiosamente. Tal processo alterou-se, a profissão ou a idade já não
conferem “autoridade” que iniba a utilização de comportamentos de agressão.
Dito de outra maneira, a identificação como médico ou enfermeiro, através da
"bata", polícia com a "farda" ou professor com o "peso
social" da função e da escola, já não são, por si sós, reguladores dos
comportamentos. Estas mudanças implicam uma reflexão profunda, pois sendo um
fenómeno "novo", não poderemos recorrer unicamente às soluções
"velhas".
O segundo aspecto que me parece
de considerar remete para um ambíguo e abrangente sentimento instalado em
Portugal de que não acontece nada, faça-se o que se fizer. Este sentimento que
atravessa toda a nossa sociedade e camadas sociais é devastador do ponto de
vista de regulação dos comportamentos, ou seja, podemos fazer qualquer coisa
porque não acontece nada, a “grandes” e a “pequenos”, mas sobretudo a
"grandes", o que aumenta a percepção de impunidade dos “pequenos”.
Considerando este quadro, parece
importante um trabalho no âmbito da formação cívica sobretudo no sistema
educativo e na formação profissional dos grupos profissionais para a gestão e
prevenção de situações de conflito, bem como um discurso político e social
consistente de valorização da autoridade, não do autoritarismo.
Por outro lado e finalmente é
ainda fundamental que se agilizem, ganhem eficácia e sejam divulgados os
processos de punição e responsabilização séria dos casos verificados, o que
contribuirá para combater, justamente, a ideia de impunidade.
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