sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

PESSOAS EM BOM ESTADO PARA TODO O SERVIÇO. Vendem-se

Continua a ser estranhamente frequente, demasiado frequente, o surgimento de notícias relativas a situações de escravatura para trabalhos agrícolas em explorações espanholas que envolvem cidadãos portugueses. No Público de hoje é referido mais um episódio, por isso e porque esta é uma das matérias em que importa insistir e denunciar, retomo neste espaço algumas reflexões recorrentes.
O tráfico de seres humanos é, do meu ponto de vista, uma das questões que maior embaraço pode causar em sociedades actuais, a escravatura, algo de improvável no séc. XXI em países da Europa Ocidental.
Parece difícil de entender em comunidades tão abertas a regularidade das referências a situações de dezenas de portugueses, de pessoas, que são sequestradas e colocadas a trabalhar em estruturas agrícolas em Espanha. Como em todas as situações desta natureza, as autoridades estimam que os casos conhecidos sejam em número bastante inferior ao que na verdade se verifica. Sabemos também como no mundo inteiro o tráfico de pessoas se constitui como uma das áreas de mercado mais rentáveis, designadamente, no caso de mulheres para o universo da prostituição.
No entanto, a escravatura para trabalho agrícola parece algo “fora do tempo” e de impossível existência nos nossos países. Mas existe, e é sério o problema que, como não podia deixar de ser, atinge os mais vulneráveis.
Este negócio, o tráfico de pessoas, um dos mais florescentes e rentáveis em termos mundiais, alimenta-se da vulnerabilidade social, da pobreza e da exclusão o que, como sempre, recoloca a imperiosa necessidade de repensar modelos de desenvolvimento económico que promovam, de facto, o combate à pobreza e, caso evidente em Portugal, às escandalosas assimetrias na distribuição da riqueza. As circunstâncias que atravessamos potenciam, naturalmente, o risco e a vulnerabilidade.
As pessoas, muitas pessoas, apenas possuem como bem, a sua própria pessoa e o mercado aproveita tudo, por isso, compra e vende as pessoas dando-lhe a utilidade que as circunstâncias, a idade, e as necessidades de "consumo" exigirem. Até a dignidade é descartável e sem valor. A este quadro acresce, com frequência a ineficácia, fraqueza e morosidade da justiça hipotecando o efeito dissuasor que um cenário diferente poderia ter.
O que parece ainda mais inquietante é o manto de silêncio e negligência que muitas vezes cai sobre este drama tornando transparentes as situações, não as vemos.

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